Autos nº 19.006.144-0

Vistos, etc.

1 – Defiro o pedido de justiça gratuita uma vez que a parte autora atua como representante da empresa na qualidade de gestor judicial. Não está na administração da empresa recuperanda e nem atua em caráter privado.

2 – Reitero o despacho que determinou o segredo de justiça ex parte por existência de documentos fiscais e confidenciais nos termos do art. 189,III do Código de Processo Civil (CPC) de 2015.

RELATÓRIO

MMX Sudeste Mineração S/A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL (MMX) por seu gestor judicial ADMINISTRADOR JUDICIAL (AJ) ajuizou incidente processual de desconsideração da personalidade jurídica e responsabilização civil com pedido de urgência para decretar o ARRESTO e a INDISPONIBILIDADE de bens, sem oitiva prévia das partes requeridas, em face de THOR DE OLIVEIRA FUHRKEN BATISTA, (THOR) Meistershaft Holdin LTDa, Aux Luxembourg Sarl, Aux LLC, OTX Fund LLC, 63X Master Fund e EBX Holding Ltda (EBX).

Em incidente envolvendo a mesma empresa Recuperanda e EIKE FURKEN BATISTA DA SILVA (EIKE), Processo n. 0024.17.054.953-9, foi reconhecido pelo juízo a legitimidade do AJ para promover a desconsideração da personalidade jurídica e atingir o patrimônio dos controladores da MMX, Eike Batista (EIKE), Centennial Asset Mining Fund LLC (CENTENNIAL) e Mercato Botafogo RFCP Fundo de Investimento Longo Prazo (MERCATO). Pedido deferido para arresto dos bens nas f. 800/815. Completou-se a relação processual com a citação e apresentação das defesas. Analisando o seu teor nem EIKE e nem as empresas controladoras conseguiram desconstruir as provas. Ao contrário, as provas colhidas naquele incidente são objetivas demonstrando que os ativos da MMX foram propositalmente supervalorizados por seus controladores, ludibriando o mercado. A fraude e os atos ilícitos são evidentes.

Neste novo incidente, propõe a desconsideração da personalidade jurídica, responsabilização civil com pedido liminar de arresto e de indisponibilidade de bens, sem oitiva das partes requeridas, em face de THOR DE OLIVEIRA FUHRKEN BATISTA, (THOR), Meistershaft Holdin LTDa, Aux Luxembourg Sarl, Aux LLC, OTX fund LLC, 63X Master Fund e EBX Holding Ltda. Argumenta que no incidente de desconsideração já em trâmite não conseguiu recuperar os ativos da MMX que foram propositalmente supervalorizados por seus controladores, influenciando o mercado financeiro com falsas expectativas de extração minerária, da ordem de 500%, sem qualquer embasamento técnico-científico, seguindo-se a venda dos ativos entre 2007 e 2008, pela CENTENNIAL, controlada por EIKE, gerando um enriquecimento da ordem de R$634.436.141,00, doc. 10. Com o deferimento do pedido de desconsideração o AJ logrou êxito em coletar documentos no exterior que comprovaram que parte do valor fraudado do controlador da MMX foi recebida por estruturas jurídicas do Grupo Econômico de EIKE e seus familiares, com intuito de blindar o patrimônio das dívidas decorrentes da derrocada financeira do grupo X que ocorreu quando verificada a fraudulenta supervalorização dos ativos.

Anexou informações oficiais de que no ano de 2013, EIKE doou a quantia de R$130.000.000,00 (cento e trinta milhões de reais) a seu filho THOR, que passou a operar esses e outros recursos financeiros através de plataformas jurídicas no exterior, em benefício próprio e de seu pai. THOR movimentava recursos da CENTENNIAL por força da capitalização da offshore MEISTERSHAFT. Ele é atuante no Grupo EBX Holding Ltda., onde integrou a diretoria até o ano de 2018. Com o pedido de tutela de urgência o AJ requer a imediata indisponibilidade e bloqueio dos ativos de THOR e das pessoas jurídicas das quais figura como sócio, até o limite da obrigação, de R$778.373.153,94, calculado com base no quadro geral de credores provisório de setembro de 2018.

Juntou diversos documentos.

O Ministério Público ofertou parecer às fl. 3247/3253 manifestando-se favoravelmente ao pedido.

DECIDO.

O pedido nestes autos vem na esteira dos desdobramentos do incidente que desconsiderou a personalidade jurídica dos controladores da Recuperanda MMX Sudeste Mineração S/A (MMX).

Muitos aspectos processuais como a questão da legitimidade do Administrador Judicial para promover o incidente já foram analisadas e pacificadas em sede de recurso ao e. TJMG. Há interesse e legitimidade para propor o incidente previsto no art. 133 e seguintes do CPC de 2015.

O judicioso parecer do Ministério Público merece ser adotado corroborando a fundamentação para esta decisão.

Principia pela análise do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. O propósito do instituto não é aviltar a autonomia patrimonial e a personalidade distinta da pessoa jurídica em relação aos seus sócios. Mas, na dicção do art. 50 do Código Civil:

Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.

A desconsideração consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma sempre que esta venha a ser utilizada para fins fraudulentos ou diversos daqueles para os quais a pessoa jurídica foi constituída. Se a pessoa jurídica se põe a praticar atos ilícitos, se sua atividade favorece o enriquecimento de seus sócios e sua derrocada administrativa e econômica, dá-se ocasião de o juiz desconsiderar sua personalidade e alcançar o patrimônio das pessoas que se ocultam por detrás de sua existência jurídica. Verificado os pressupostos de sua incidência no processo de execução coletiva ou individual é possível a ordem de constrição ou de expropriação de bens de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros.

Pertencendo a Recuperanda a um grupo de sociedades sob o mesmo controle e com estrutura meramente formal, o GRUPO X, é legítima a desconsideração da personalidade jurídica para que os efeitos do decreto recuperacional alcancem as demais sociedades e pessoas do grupo. Impedir a desconsideração da personalidade jurídica nesta hipótese, implica prestigiar a fraude à lei ou contra os credores.

Basta uma análise do plano de recuperação da MMX que contempla um grande deságio nas dívidas da companhia, em prejuízo de seus trabalhadores e fornecedores. Consta dos autos da recuperação que suas atividades estão paralisadas enquanto que a venda de unidades produtivas é a principal fonte das receitas para fazer face aos compromissos assumidos. Não há vislumbre de que a MMX volte a cumprir seu papel de empresa produtiva e com persecução do seu objetivo social atendendo a sua função constitucional.

Confrontando o direito com as provas colacionadas aos autos, verifica-se que o AJ demonstrou a destinação de vantagem financeira obtida com a supervalorização fraudulenta dos ativos da MMX para THOR, filho do controlador EIKE e empresas offshores criadas para dispersar o dinheiro pelo mundo dificultando o seu rastreamento e a sua recuperação para pagamento das dívidas da MMX. Em relato detalhado, cronológico e fundamentado em provas substanciosas, o AJ descreveu a engenharia de blindagem patrimonial arquitetada pela família BATISTA a partir da sua derrocada financeira e dos desdobramentos das ações criminais que EIKE BATISTA está respondendo. Com amparo em ordem judicial da corte de falência norte-americana o AJ obteve êxito em colacionar documentos comprovando o desvio do dinheiro. Como mencionado no parecer do Ministério Público da grande quantidade de documentos juntados, destaca-se os extratos bancários fornecidos por instituição financeira sediada em Miami/EUA, dando conta que EIKE retirou recursos da conta-corrente da offshore CENTENNIAL, para outras offshores controladas por ele. A resposta da instituição financeira ao COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) acerca da negativa de operação cambial a THOR de remessa de setenta milhões de reais do Brasil para o Itaú Internacional na Suíça, doc. 16, revela o protagonismo de THOR no desvio de valores que garantiriam as obrigações em face dos credores. As informações fornecidas pelo Banco Daycoval S/A ao COAF de que em 12.05.2015, Erick Magno, representante legal das offshores Meistershaft Holding Ltda e Meistershaft Irrevocacle Trust (cujos beneficiários finais são EIKE e seus filhos) depositou em favor do controlador da MMX, US$5.000.000,00 (cinco milhões de dólares americanos); provas de que a negociação de venda do Hotel Glória, fl. 30/31, foi de fachada demonstra a dominância de EIKE sobre os ativos da MEISTERSHAFT que se encontram sob a custódia de seu filho THOR BATISTA.

O conjunto probatório é suficiente para comprovar a remessa de quase um bilhão de reais ao exterior, pelo controlador EIKE e seu filho THOR, através de empresas criadas apenas para ocultar patrimônio e afastá-lo do alcance dos credores. Todas as doações feitas pelo pai ao filho são para preservar os valores fraudados.

A conclusão é que estão presentes os requisitos do art. 50 do CC com desvio da finalidade da pessoa jurídica, confusão patrimonial e prática de ilícitos pelos controladores configurando a necessidade da desconsideração e o arresto dos bens tal como requerido. Adoto as colações jurisprudenciais do judicioso parecer, fl. 3250 a 3252.

Passo a análise do pedido de tutela de urgência sem oitiva da parte contrária. Nos termos do art. 330 do CPC de 2015, defere-se o pedido quando presentes elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano.

A probabilidade do direito está comprovada pela vasta documentação demonstrando a engenharia desenvolvida por EIKE para blindar seu patrimônio através do filho THOR que passou a possuir um vasto patrimônio. Diante da quantidade de valores desviados e da complexa engrenagem montada para ocultar o seu destino e real proprietário de molde a frustrar o pagamento das dívidas da MMX.

A demora na prestação do provimento jurisdicional poderá resultar na ocultação de todo e qualquer patrimônio hábil a satisfazer o crédito dos credores. É impressionante como a criação, construção e movimentação dos valores ocorre rapidamente. A medida acautelatória deve ser concedida em contraditório diferido para possibilitar e garantir o resultado útil do processo. Trata-se de arresto que não implica em perda dos bens, mas bloqueio e indisponibilidade, evitando sua transferência a terceiros. Durante a regular instrução e sob o contraditório podem ser revertidos sem causar grave dano de difícil reparação.

Em suma, todos os requisitos para concessão da tutela de urgência estão presentes de forma fundamentada.

 

DISPOSITIVO.

Ante o exposto, defiro o pedido de TUTELA DE URGÊNCIA, sem oitiva da parte contrária, para desconsiderar a personalidade jurídica da Recuperanda MMX Sudeste Mineração S/A para atingir o patrimônio dos requeridos e determinar o arresto e a indisponibilidade de todos os bens e ativos, inclusive de titularidade das pessoas jurídicas das quais figurem como sócios, no BRASIL E NO EXTERIOR, até o limite de sua obrigação, no valor de R$778.373.153,94 (setecentos e setenta e oito milhões, trezentos e setenta e três mil, cento e cinquenta e três reais e noventa e quatro centavos) em desfavor de THOR DE OLIVEIRA FUHRKEN BATISTA, Meistershaft Holdin Ltda., Aux Luxembourg Sarl, Aux LLC, OTX Fund LLC, 63X Master Fund e EBX Holding Ltda.

Através dos sistemas conveniados BACENJUD e Central de Indisponibilidade de Bens – CNIB, a ordem de bloqueio está sendo realizada.

Oficiar as instituições como requerido na inicial para as informações e anotações pertinentes. As demais solicitações para localização de bens ou comunicações serão determinadas na sequência dos resultados dos sistemas conveniados.

Após, proceder a citação dos litisconsortes no polo passivo, para querendo, manifestar-se no prazo de 15 dias, art. 135 do CPC de 2015.

Publicação restrita em face da concessão de segredo de justiça e contraditório diferido.

Intimar. Cumprir



Belo Horizonte, 18 de março 2019.

 

Cláudia Helena Batista

Juíza de Direito