Vistos, etc...

Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer c/c pedido de tutela de urgência proposta por NORALDINO LÚCIO DIAS JÚNIOR em face da VALE S/A, em razão dos fatos e fundamentos sinteticamente expostos a seguir:

Segundo alegado pelo requerente, a presente ação busca “a prestação jurisdicional para fins de impor obrigação de fazer em face do demandado no sentido de ser assegurado o necessário atendimento para resgate, a saúde e vida dos animais vítimas do desastre do rompimento da contenção de rejeitos de minério que ocorreu no início da tarde desta sexta-feira (25/01), na Zona Rural de Brumadinho/MG.”

Argumenta que, apesar do brilhante trabalho desenvolvido pelo Corpo de Bombeiros, assim como pelos demais profissionais e voluntários, nas atividades de resgate de pessoas, “as atividades inerentes ao salvamento dos animais não tem sido realizada devido à falta de apoio da empresa requerida causadora do dano.”

Relata que “além de um número ainda impreciso de vidas humanas, a avalanche de lama levou consigo plantações inteiras e criações que garantiam a subsistência dos pequenos agricultores residentes na localidade. Animais que não foram soterrados estão feridos, perdidos e agonizando, necessitando de imediato salvamento.”

Sustenta que, conforme relatório médico veterinário anexo, a demora no resgate dos animais que se encontram agonizando na lama poderá agravar a situação da saúde pública local por contaminação, em caso de morte dos mesmos, e também criar dificuldades para o bom desenvolvimento das atividades de resgate das vidas humanas.

Afirma que “a não disponibilização por parte da empresa requerida, de uma estrutura que forneça condições de resgatar os animais, comprometerá todo o trabalho realizado pelos inúmeros profissionais e voluntários, isto porque, é necessário que se olhe a problemática sobre diversos ângulos, mas sem dúvida, o de maior risco é que haja algum evento sanitário (doenças) com a morte dos animais a serem resgatados.”

Em razão disso, pugna, em sede de tutela de urgência, que a requerida seja compelida, imediatamente, a proceder “a contratação/fornecimento de equipe capacitada/medicamentos/maquinários adequados para a grave situação/alimentação/veículos/aeronaves e todo e qualquer meio, recurso, instrumento necessário para o resgate, acolhimento e tratamento dos animais que se encontram agonizando em meio a lama tóxica devido ao rompimento da barragem do Feijão.”

Pede, ainda, que, em caso de descumprimento da decisão que deferir os pedidos supra, seja determinado o bloqueio judicial em nome da empresa requerida de valores suficientes para a satisfação da obrigação nos termos requeridos no item 1 e a liberação IMEDIATA de tal recurso.

Subsidiariamente, caso não seja acolhido o pedido de bloqueio, requer seja fixada multa diária (astreinte) no importe de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), sem prejuízo da configuração do crime de desobediência.

A inicial veio instruída com documentos e será oportunamente autuada e distribuída.

Do necessário, é o relatório. DECIDO.

Como é cediço, a tutela provisória de urgência poderá ser concedida quando demonstrado nos autos, cumulativamente, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 c/c 294, ambos do CPC), caso o pedido seja deferido somente ao final da demanda. Ressalta-se que a referida tutela não será concedida caso constatado perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão liminar (art. 300, §3º, do CPC).

In casu, resta inconteste o rompimento das barragens da Vale S/A no Município de Brumadinho e evidente o dano ambiental causado, que culminou com a morte de um número ainda indefinido de pessoas e animais, desastre este avaliado pelo próprio Presidente da Vale S/A como tragédia humana maior, em comparação ao ocorrido em Mariana/MG, há três anos. São fatos, pois, que tomaram contornos públicos, notórios e foram, inclusive, reconhecidos pela requerida.

Além disso, as imagens que estão sendo divulgadas na internet1 e nas redes sociais, captadas após o rompimento das barragens em questão, demonstram, até mesmo para os mais leigos, que a fauna, terrestre e aquática, ao longo da área atingida foi drasticamente impactada pela “enxurrada” de rejeitos de minérios.

Nessa esteira, e após detida análise da documentação apresentada, entendo estar demonstrada a plausibilidade e verossimilhança das alegações do requerente. E, da mesma forma, o periculum in mora, consubstanciado no risco de morte dos animais que se encontram imersos na lama oriunda do rompimento das barragens em tela, o que poderá gerar danos à saúde pública e ao meio ambiente, conforme afirmado pelos médicos veterinários no relatório acostado junto à inicial.

Mister ressaltar que, in casu, é dever da requerida empreender esforços para se evitar maiores danos à fauna, sendo certo que a Constituição Federal, em seu art. 225, §3º, assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, acolhendo, ainda, o princípio da reparação integral do dano ambiental, ao determinar que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

Noutro vértice, considerando-se que esta Magistrada já determinou o bloqueio da quantia de R$5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais) nas contas bancárias da requerida, visando, justamente, a efetivação de medidas emergenciais para salvaguardar a comunidade local e assegurar a reparação dos danos causados ao meio ambiente e, por obvio, os animais, entendo que a realização de um novo bloqueio de valor se mostra, por ora, desnecessário, impondo-se, por outro lado, o arbitramento de multa cominatória para o caso de descumprimento da presente decisão.

Assim, diante da irrefutável necessidade de se efetivar medidas emergenciais para salvaguardar os animais sobreviventes, DEFIRO o pedido de tutela de urgência e DETERMINO, SEM QUALQUER PREJUÍZO NA ATUAÇÃO DOS BOMBEIROS NOS RESGATES DAS VÍTIMAS HUMANAS, que a Requerida Vale S/A proceda, de imediato, a contratação/fornecimento de equipe capacitada, medicamentos, alimentos, maquinários adequados e todo e qualquer meio, recurso, instrumento apto (veículos e aeronaves) ao resgate, acolhimento e tratamento dos animais que se encontram agonizando em meio à lama das barragens rompidas neste Município, sob pena de multa diária de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), nos termos do art. 536, §1º, do NCPC, além de incursão no crime de desobediência, em caso de descumprimento.

Intime-se pessoalmente o presidente da Vale S/A e/ou o seu representante legal para receber intimação e/ou citação.

Findo o plantão, encaminhar à Distribuição.

I.C.

Brumadinho, 27 de janeiro de 2019, às 22:23 horas.

 

 

 

Perla Saliba Brito

Juíza de Direito Plantonista

1https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/01/25/barragem-da-vale-se-rompe-em-brumadinho-mg-fotos.ghtml