Processo nº 0024 11 200 738-0

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

 

 

 

Vistos.

 

CONSTRUTORA TENDA S.A. opôs Embargos de Declaração de fls. 347//352 em face da sentença de fls. 319/330 v., que, nos autos da ação ordinária cominatória c/c reparação de danos movida por ANDRÉ JUVENAL DA SILVA em seu desfavor, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando a ré a pagar ao autor indenização, a título de danos morais, R$ 10.000,00 e, a título de danos materiais, o somatório resultante dos valores despendidos com aluguel do imóvel que contratou no valor de R$ 350,00 mensais de setembro de 2010 até 20 de maio de 2015.

 

Em suas razões recursais, a Embargante alega que a decisão embargada é contraditória quanto à condenação ao pagamento de indenização por danos materiais, visto que o imóvel ficou pronto e com expedição de certidão de baixa e “Habite-se” em 19/09/2012 e que só não foi entregue ao autor/embargado porque encontrava-se inadimplente, tratando-se da hipótese de exceção do contrato não cumprido.

 

Sustenta que a sentença embargada é contraditória quanto à condenação ao pagamento dos alugueis despendidos pelo autor de setembro de 2010 a maio de 2015, visto que a própria inadimplência do requerente já afasta a possibilidade de condenação ao pagamento de alugueis a partir de quando o imóvel encontrava-se apto a ser entregue em 19/09/2012, sendo, ademais, indevido qualquer pagamento de alugueis não comprovados, mormente se considerando que os documentos de fls. 77/79 somente comprovam pagamento dos aluguéis de novembro de 2010 a abril de 2011.

 

Pleiteia o provimento dos embargos para que sejam sanados os vícios apontados.

 

Intimado (fl. 485), a parte embargada manifestou-se às fls. 486/490, requerendo a rejeição do recurso.

 

DECIDO.

 

Recebo os Embargos Declaratórios, por serem tempestivos.

 

É cediço que, nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, cabem embargos de declaração quando houver, em qualquer decisão judicial, obscuridade ou contradição, assim como quando for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juízo de ofício ou a requerimento, bem como para sanar erro material.

 

Registre-se que, consoante ensinamentos de Fredie Didier Júnior, considera-se omissa a decisão que não se manifestar sobre um pedido; sobre argumentos relevantes lançados pelas partes (para o acolhimento do pedido, não é necessário o enfrentamento de todos os argumentos deduzidos pela parte, mas para o não-acolhimento, sim, sob pena de ofensa à garantia do contraditório) ou sobre questões de ordem pública, que são apreciáveis de ofício pelo magistrado, tenham ou não tenham sido suscitadas pela parte (in Curso de Direito Processual Civil, Vol. 3, 10ª ed., Ed. Jus Podivm, pág. 193).

 

Ademais, a contradição que dá ensejo aos embargos de declaração é a que se estabelece no âmbito interno do julgado embargado, ou seja, a contradição do julgado consigo mesmo, como quando, por exemplo, o dispositivo não decorre logicamente da fundamentação, e não a eventual contrariedade do acórdão com um parâmetro externo (um preceito normativo, um precedente jurisprudencial, uma prova etc). (AgRg no REsp 987.769/DF, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 06/12/2011, DJe 13/12/2011).

 

Por sua vez, constata-se obscuridade quando houver a falta de clareza na fundamentação do julgado, tornando difícil sua exata interpretação.

 

Da análise da sentença, verifica-se que há, de fato, contradição no julgado quanto à condenação da parte requerida ao pagamento da totalidade dos alugueis pagos desde a data prevista para entrega do imóvel e a data da efetiva entrega das chaves, visto que, de fato, o autor, ora Embargado, somente comprovou o pagamento de aluguéis de setembro de 2010 a abril de 2011 (fls. 77/79).

 

Consoante prevê o art. 402, do Código Civil as perdas e danos devidas ao credor abrangem aquilo que ele efetivamente perdeu, assim como o que razoavelmente deixou de lucrar, in verbis:

 

Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.”

 

Ora, os danos materiais, em princípio, devem ser devidamente comprovados, tanto no que se refere à a sua existência, assim como quanto à sua extensão.

 

Pablo Stolze Gagliano ensina que:

 

(...) no que tange especificamente ao dano patrimonial ou material, convém o analisarmos sob dois aspectos:

a) o dano emergente - correspondente ao efetivo prejuízo experimentado pela vítima, ou seja, 'o que ela perdeu';

b) os lucros cessantes - correspondente àquilo que a vítima deixou razoavelmente de lucrar por força do dano, ou seja, 'o que ela não ganhou'.

(...)

Claro está que o dano emergente e os lucros cessantes devem ser devidamente comprovados na ação indenizatória ajuizada contra o agente causador do dano, sendo de bom alvitre exortar os magistrados a impedirem que vítimas menos escrupulosas, incentivadoras da famigerada 'indústria da indenização', tenham êxito em pleitos absurdos, sem base real, formulados com o nítido propósito, não de buscar ressarcimento, mas de obter lucro abusivo e escorchante." (“in” Novo Curso de Direito Civil, vol. III, Responsabilidade Civil, ed. Saraiva, 2003, p. 45/47)

 

 

Registra-se, outrossim, as lições de Carlos Roberto Gonçalves:

 

"Sem a prova do dano, ninguém pode ser responsabilizado civilmente. O dano pode ser material ou simplesmente moral, ou seja, sem repercussão na órbita financeira do ofendido. O Código Civil consigna um capítulo sobre a liquidação do dano, ou seja, sobre o modo de se apurarem os prejuízos e a indenização cabível. A inexistência de dano é óbice à pretensão de uma reparação, aliás, sem objeto." (“in” Responsabilidade Civil, ed. Saraiva, São Paulo, 8ª ed., 2003, p. 33)

 

 

 

 

Ademais, da análise dos autos percebe-se que o autor não demonstra em momento algum que comprou o bem com o intuito de alugá-lo, não sendo devido o pagamento dos aluguéis no período da mora a título de lucros cessantes, não podendo estes ser entendidos como se fosse presumíveis.

 

Assim sendo, a condenação a título de pagamento de aluguéis deve compreender apenas o período em que foi realizada a comprovação pelo autor, ou seja, de , sob pena de locupletamento ilícito.

 

Já no tocante à alegada omissão do julgado quanto à aplicação da exceção do contrato não cumprido a partir de 19/09/2012, quando foi expedida certidão de baixa e “Habite-se”, sem razão o Embargante, visto que, embora nessa data já fosse possível, de fato, ter sido realizada a entrega das chaves, esta somente não ocorreu porque o autor não conseguiu realizar o financiamento imobiliário e, assim, proceder ao pagamento das parcelas faltantes porque, ao que parece, a ré não lhe entregou os documentos exigidos pelo agente financeiro.

 

Tal fato não restou fartamente comprovado nos autos pela parte requerida e, considerando que só há comprovação de efetiva entrega das chaves em 20/05/2015 (fl. 282), até aí entende-se ter a construtora permanecido em mora.

 

Pelo exposto, ACOLHO EM PARTE os Embargos de Declaração, para, concedendo-lhes efeitos infringentes, alterar a parte dispositiva da sentença que condena a ré ao pagamento dos aluguéis no período compreendido entre setembro de 2010 até 20/05/2015, devendo constar “no período compreendido entre setembro de 2010 a 30 de abril de 2011”.

 

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

 

Belo Horizonte, 01 de junho de 2017.

 

 

 

Moema Miranda Gonçalves

Juíza de Direito

 

 

 

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