COMARCA DE PONTE NOVA
1ª VARA CÍVEL
Autos nº 0521.14.011415-3
Ação Indenizatória c/c Repetição de Indébito
Requerente: José Jerônimo Lopes
Requerida: Aymoré Crédito Financiamento e Investimento S.A.
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
Versam os autos sobre ação indenizatória c/c repetição de indébito ajuizada por José Jerônimo Lopes contra Aymoré Crédito Financiamento e Investimento S.A.
O requerente alegou em síntese que: 1- adquiriu um veículo no dia 18/03/2013, cujo valor desse foi de R$ 16.000,00 (dezesseis mil reais), sendo que de entrada pagou o importe de R$ 6.000,00 (seis mil reais), financiando o restante do pagamento do automóvel em 48 (quarenta e oito) parcelas no valor de R$ 420,98 (quatrocentos e vinte reais e noventa e oito centavos); 2- a primeira parcela vencida se deu em 18/04/2013 e a última vincenda seria em 18/04/2017, ressaltando, que até o momento cumpriu com 18 (dezoito) parcelas; 3- o contrato firmado é ilícito, uma vez que esse é dotado de capitalização (cálculo de juros sobre juros); 4- está pagando juros abusivos de 2,61% (dois vírgula sessenta e um por cento) ao mês, valor que totalizado ao final do contrato chegará ao montante de R$ 20.207,04 (vinte mil duzentos e sete reais e quatro centavos); 5- há um cálculo realizado através da tabela GAUSS, estabelecendo que os juros mensais não poderiam ultrapassar 0,80% (zero vírgula oitenta por cento) ao mês, quantia esta que ao final do financiamento, deveria ser apenas de R$ 11.649,83 (onze mil seiscentos e quarenta e nove reais e oitenta e três centavos); 6- portanto, a conduta ilícita do banco é clara, ao impor um contrato adesivo e abusivo; 7- a cobrança de tarifas denominadas “tarifa de cadastro, tarifa de avaliação de bens”, e outras, são ilegais, pois constituem serviços que interessam somente a instituição financeira, não havendo qualquer contraprestação que justifique a cobrança dessas tarifas.
Assim, o requente pleiteia: 1- a inversão do ônus da prova, por se tratar de matéria consumerista; 2- que seja a ação julgada procedente, condenando a requerida o pagamento em dobro das prestações já quitadas no contrato, no importe de R$ 8.895,00 (oito mil oitocentos e noventa e cinco reais), sem prejuízos da inclusão das parcelas vincendas e adimplidas; 3- subsidiariamente, caso a requerida seja condenada ao ressarcimento sobre o valor pago indevidamente, que seja determinado o pagamento no montante de R$ 4.447,50 (quatro mil quatrocentos e quarenta e sete reais e cinquenta centavos); 4- a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 7.000,00 (sete mil reaisO); 5- a condenação do requerida ao pagamento das custas e honorários advocatícios; 6- por fim, os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Atribui-se à causa o valor de R$ 15.895,00 (quinze mil oitocentos e noventa e cinco reais).
Com a exordial vieram os documentos de f. 13/38.
Justiça gratuita deferida ao requerente à f. 39.
A requerida apresentou contestação às f. 42/62. Nessa oportunidade, alegou em síntese: 1- preliminarmente, a falta de interesse de agir, pois não ocorreu nenhum fato imprevisível desde a celebração do contrato, capaz de ensejar a revisão; 2- as partes são livres para contratar, ainda que se trata de contrato de adesão, o requerente poderia não ter assumido a dívida; 3- o contrato é válido, pois obedece a todos os requisitos legais do negócio jurídico; 4- a jurisprudência já pacificou a possibilidade de cobrança de juros remuneratórios em patamar superior a 12% a.a., a licitude da cobrança de permanência, bem como a possibilidade de cobrança de juros capitalizados anual e mensalmente; 5- não há que se falar em ilicitude ou abusividade na cobrança das taxas de juros firmadas pelas partes, além de estarem dentro da taxa média praticada pelo mercado; 6- é lícito a cobrança de TAC; 7- o requerente não comprovou a capitalização dos juros e, mesmo que houvesse sua cobrança é lícita; 8- inexistem qualquer impedimento em fixação de juros remuneratórios; 9- impossibilidade de restituição em dobro; 10- impossibilidade da inversão do ônus da prova, pois ausente a hipossuficiência do requerente; 11- inexistência de danos morais.
Desse modo, a requerida pugna: 1- pelo reconhecimento da preliminar supracitada, extinguindo o feito sem resolução de mérito; 2- que todos os pedidos sejam julgados improcedentes; 3- por fim, a condenação do requerente ao pagamento das custas, bem como honorários advocatícios.
Com a defesa, documentação de f. 63/69.
O requerente não apresentou impugnação à contestação, conforme certidão de decurso de prazo – f . 69-v.
Instrução encerrada à f. 75.
A requerida apresentou alegações finais às f. 78/79, bem como o requerente – f. 81/84.
É o que importa relatar. Decido.
II - FUNDAMENTAÇÃO
II.I – Preliminares
Ao contrário do alegado pelo requerido, não deve prosperar a preliminar de carência de ação. Sustenta que, como não existiu qualquer fato imprevisível após a celebração do contrato, o processo deve ser extinto. No entanto, a Constituição Federal de 1988 garante, em seu artigo 5º XXXV, a inafastabilidade da jurisdição. Por isso, à parte requerente é garantida a possibilidade de ver analisada situação em que se ache prejudicada por eventual abuso de direito da requerida. Portanto, rejeito.
II.II - Mérito
Trata-se de ação revisional de contrato bancário em que o requerente alega a existência de taxas e encargos abusivos.
Primeiramente, cabe ressaltar que para a resolução da lide não é necessário dilação probatória, pois requer apenas a análise dos documentos já juntados aos autos.
Diversas foram as fundamentações usadas tanto pelo requerente quanto pelo requerido. Passo à análise de cada uma delas.
2.1 Pacta Sunt Servanda
O banco requerido, a fim de evitar a análise da lide, invoca o princípio da pacta sunt servanda e alega ausência de condições para a alteração do contrato.
De fato, na celebração de um contrato privado, prevalece a autonomia das partes, o que os permite estabelecerem as cláusulas que melhor se ajustarem ao relacionamento negocial. Porém, embora vigore o princípio da pacta sunt servanda e da autonomia da vontade das partes contratantes, quando evidenciado uma situação de manifesto desequilíbrio entre as partes é possível a revisão contratual. Além disso, conforme prevê artigo 51 do CDC, são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações abusivas e incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, o que mostra ser permitida a discussão das obrigações formuladas pelas partes no âmbito de suas relações privadas, limitando a liberdade contratual.
Todavia, conforme a súmula 381 do STJ, “nos contratos bancários é vedado ao julgador conhecer, de ofício da abusividade das cláusulas”.
Portanto, este juízo se restringirá aos fundamentos e pedidos formulados pelo requerente em sua inicial.
2.2 Aplicação do CDC e Inversão do Ônus da Prova
Quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor e à inversão do ônus da prova, faço as seguintes observações.
Com o julgamento da ADI nº 2591/06, pelo plenário da Suprema Corte, dúvida não mais remanesce no sentido de que as relações de consumo de natureza bancária ou financeira se submetem à égide do Código de Defesa do Consumidor.
Afirma-se que o CDC é aplicável às instituições financeiras, consoante dispõe a Súmula n° 297 do STJ, entretanto, limitando-se às operações que envolvam destinatários finais dos produtos e serviços fornecidos por estas instituições, não se aplicando para operações de financiamento que tenham por objetivo o fomento da atividade econômica.
Nesse aspecto, o requerente pode, sim, ser qualificado como consumidor, pois se trata de contratação de serviço de empréstimo, ficando claro o requerente como destinatário final e o Banco requerido como fornecedor, o que configura relação de consumo.
No âmbito de proteção do CDC, este previu a inversão do ônus probatório em favor do consumidor, como forma de facilitação da defesa de seus direitos, nos termos do art. 6º, VIII. Contudo, na hipótese dos autos, não vejo motivos que visem a facilitação da defesa do requerente, pois o conjunto probatório carreado no processo, principalmente porque foi juntado o contrato firmado entre as partes (fls.19/23), é suficiente para o convencimento deste Juízo no tocante à análise de suas alegações.
Por isso, indefiro o pedido de inversão do ônus da prova.
2.3 Juros Remuneratórios
O requerente alega abusividade na cobrança dos juros remuneratórios, defendendo que a sua cobrança não pode ultrapassar o percentual 12% ao ano.
Mas como bem explicou o requerido, o STF editou a súmula 596, dispondo que: “As disposições do Decreto nº 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”.
Sobre o assunto são os seguintes julgados:
AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL - CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO - INCIDÊNCIA DO CDC - SÚMULA 297 DO STJ - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - CABIMENTO - JUROS REMUNERATÓRIOS - NÃO LIMITAÇÃO A 12% AO ANO - ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - ADMISSÃO APENAS NAS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - SOMATÓRIA COM MULTA E JUROS MORATÓRIOS - POSSIBILIDADE - JUROS DE MORA - LIMITAÇÃO A 1% AO MÊS. [...]
Conforme orientação consolidada pelo STJ e nos termos da Lei 4.595/64 é livre a estipulação de juros remuneratórios nos contratos de mútuo bancário e financiamento, aos quais não incide a limitação prevista na Lei de Usura e no art. 591 c/c o art. 406 do CC de 2002, já que tais dispositivos limitam-se a tratar dos contratos de mútuo civil, sendo cabível a revisão das taxas pactuadas apenas quando caracterizada a relação de consumo e demonstrada a abusividade, mas esta última não se deu na hipótese.
[...] (Apelação Cível 1.0480.10.011244-4/001, Rel. Des.(a) Arnaldo Maciel, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/01/2012, publicação da súmula em 03/02/2012). (grifo nosso).
APELAÇÃO - REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO - FINANCIAMENTO DE VEÍCULO - LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS - INADMISSIBILIDADE - CAPITALIZAÇÃO - PACTUAÇÃO EXPRESSA - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - COBRANÇA CUMULADA COM DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS - ILEGALIDADE - TAC E TEC - EXPRESSAMENTE CONTRATADAS – LEGALIDADE. - Pacificado o entendimento no Colendo Superior Tribunal de Justiça de que as instituições financeiras não se sujeitam ao disposto na Lei de Usura, não indicando a fixação dos juros em patamar superior a 12% ao ano, por si só, abuso que requerenteiza a sua revisão pelo Poder Judiciário.
[...]
(Apelação Cível 1.0245.10.013053-4/001, Rel. Des.(a) José de Carvalho Barbosa, 13ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2013, publicação da súmula em 01/03/2013) (grifo nosso).
O STJ tem se posicionado no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando discrepante da média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, à época da contratação.
No caso dos autos, o valor da taxa de juros mensal no importe de 2,61% e anual no importe de 36,26% (f. 19) NÃO está condizente com a média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil no mês de março de 2013, época da celebração do contrato em questão. Isso porque, como se denota, o endereço eletrônico traz a taxa de juros mensal em 1,70% e anual em 22,35%.
Portanto, considerando a evidente discrepância entre a referida taxa média do Banco Central e a taxa de juros pactuada, manifesta está a abusividade na contratação, o que permite a intervenção do Judiciário a fim de buscar o equilíbrio na relação contratual.
Assim, os juros remuneratórios deverão ser reduzidos ao parâmetro constante no sítio oficial do Banco Central e os valores pagos em excesso deverão ser calculados em fase de liquidação e restituídos ao requerente.
2.4 Capitalização mensal de juros
O requerente alega que foi aplicada capitalização de juros, sendo que no contrato não foi expressamente pactuado. Já o requerido se manifestou de forma contrária.
Sobre a capitalização de juros, é preciso fazer a seguinte consideração.
O Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Repetitivo nº 973.827-RS, reconheceu a legalidade da capitalização mensal de juros, desde que haja previsão expressa e clara nos contratos. Recentemente corroborou este entendimento na súmula 539:
É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anula em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro nacional a partir de 31/3/2000 (MP 1.963-17/00, reeditada como MP 2.170-36/01), desde que expressamente pactuada.
E, de acordo com f. 19/23, não há previsão expressa no contrato em questão.
Todavia, recentemente, o STJ editou a súmula 541 e estabeleceu que “A previsão no contrato bancário de taxa de juros anula superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada”.
Esta súmula nos informa que é possível averiguar a existência de juros compostos quando pactuada taxa efetiva anual superior a doze vezes a taxa mensal.
Portanto, pelo simples fato de a taxa anual (36,26%) ser superior a 12 vezes a taxa mensal (2,61%), nos permite detectar e concluir pela permissão de capitalização mensal de juros, apesar de não ter sido prevista expressamente no contrato.
2.5 Tarifa de Cadastro
Quanto à cobrança de tarifa de cadastro, a Resolução CMN 3.919 de 25/11/2010 prevê a permissão da sua cobrança e o STJ também já a considerou legítima na decisão da Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.251.331/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos.
Logo, as cláusulas que preveem a sua cobrança devem ser mantidas no contrato.
2.6 Tarifa avaliação de bens
No que se refere à tarifa de avaliação de bens, o artigo 5º, VI, da Resolução n. 3.919/2010 prevê a possibilidade de sua cobrança para os contratos de financiamento visando à aquisição de veículos. Entretanto, o TJMG ressalta a necessidade de ser veículo usado. Como mostra o julgado abaixo:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO - TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO - AUSÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO DE COBRANÇA - TARIFA DE REGISTRO - ILEGALIDADE - CONTRATO POSTERIOR À RESOLUÇÃO 3.518/2007 DO CMN - TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM - LEGALIDADE - RESPEITO AOS PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA E DA INFORMAÇÃO - VEÍCULO USADO - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE servJUROS - ILEGALIDADE - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
- Em relação à tarifa de avaliação do bem, é uníssono o entendimento jurisprudencial no sentido da legalidade da cobrança, desde que se trate de financiamento de veículo usado e que tenham sido observados os princípios da transparência e da informação, o que é o caso dos autos.
(TJMG- Apelação Cível 1.0017.13.005753-6/001, Relator(a): Des.(a) Sérgio André da Fonseca Xavier, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/03/2015, publicação da súmula em 16/03/2015)
Como a cédula de crédito bancária em questão trata de financiamento de veículo cujo ano de fabricação é 2004 (f. 19), anos antes da celebração do contrato, tratando-se então de veículo usado. Sendo assim, válida a cobrança da tarifa de avaliação de bens.
2.7 Taxa de abertura de crédito
Ao contrário do alegado pela parte requerente, não existe no contrato qualquer menção à cobrança do referido encargo. Por essa razão, improcedente o pedido da parte.
2.8 - Seguro de proteção financeira
O contrato de f. 19 traz a cobrança de seguro de proteção financeira, no valor de R$ 432,24 (quatrocentos e trinta e dois reais e vinte e quatro centavos). Entendo ser inadmissível a sua cobrança quando não discriminada no contrato a sua abrangência e como se dará a cobertura. A sua cobrança foi inserida de forma genérica e isolada, sem maiores informações sobre o serviço. Apesar de haver as cláusulas de f. 21, entendo que não são suficientes para cumprirem o dever de transparência e informação, pois não demonstram de forma detalhada para o consumidor como e quando será efetivamente prestado o serviço. A decisão abaixo esclarece esse entendimento:
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C.C. REPETIÇÃO DE INDÉBITO Cobrança de tarifas de seguro Inadmissibilidade. Configura-se abusiva a cobrança da tarifa referente a seguro, ainda que expressamente prevista, uma vez que não restou discriminado no contrato qual tipo de seguro se trata a cobrança (seguro do bem ou de proteção financeira cláusulas 18 e 19 do contrato) - Ainda, cuida-se de contratação genérica de seguro, sem especificação de suas cláusulas ou eventuais coberturas decorrentes, incabível o repasse de obrigações ao consumidor, ainda mais quando faltam informações sobre a que serviços supostamente prestados essas taxas se referem. A repetição do indébito deve ser feita de forma simples - Recurso parcialmente conhecido e, na parte conhecida, parcialmente provido." (TJSP, Apelação nº. 0010862-06.2011.8.26.0047, Rel. Des. Pedro Ablas, Data do julgamento: 28/11/2012).
Por isso, a referida clausula deve ser extirpada, havendo a restituição de eventuais valores pagos pela requerente.
2.9 Taxa de registro
Prosseguindo, o contrato estabelece a cobrança do valor de R$ 74,89 (setenta e quatro reais e oitenta e nove centavos) a título de registro do contrato. A cédula de crédito bancário em questão também prevê a cobrança da tarifa de registro de contrato, como alegado pelo requerente ao impugnar a contestação. Contudo, o TJMG decidiu pela ilegalidade da cobrança para os contratos celebrados após 30 de abril de 2008, pelo fato de não ter sido prevista nos anexos das Resoluções do Conselho Monetário números 3.518/2007 e 3.919/2010. E, como o contrato em questão foi celebrado no ano de 2011, a cobrança de tal tarifa deve ser extirpada. Explica o julgado abaixo:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - ALEGAÇÃO DE COBRANÇA DE ENCARGOS ILEGAIS - INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS - TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO - ILEGALIDADE - TARIFA NÃO CONTEMPLADA NAS RESOLUÇÕES DO CONSELHO MONETÁRIO N. 3.518/2007 E 3.919/2010 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ART. 20, § 4º, DO CPC.
- No que se refere à tarifa de "registro de contrato", para os contratos celebrados após 30 de abril de 2008, considero a cobrança ilegal, por não ter sido contemplada nos anexos das Resoluções do Conselho Monetário n. (s) 3.518/2007 e 3.919/2010, aplicando-se, analogicamente, o entendimento esposado pela Min. Maria Isabel Gallotti, no julgamento do REsp 1.251.331/RS.
(TJMG- Apelação Cível 1.0707.12.005708-8/001, Relator(a): Des.(a) Eduardo Mariné da Cunha, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/03/2015, publicação da súmula em 17/03/2015).
2.10 Devolução em Dobro do Indébito
O requerente também pugnou pela devolução em dobro de eventuais valores pagos indevidamente ao Banco requerido. Porém, como argumentado pelo banco, a devolução em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC e no art. 940 do CC é condicionada à comprovação da má-fé do credor, o que não restou comprovado. Portanto, eventuais restituições deverão ser realizadas de forma simples.
2.11 Danos morais
Após a análise de todas as cobranças que a requerente considerava abusivas, resta a análise do pedido de condenação da requerida ao pagamento de danos morais. Ainda que, como se observa pelas considerações acima, algumas das taxas foram consideradas abusivas e indevidamente cobradas, improcede o pedido de danos morais.
Para a incidência desse instituto, devem ser preenchidos os seguintes requisitos: conduta ilícita por parte da requerida, dano extrapatrimonial sofrido pela requerente; nexo causal entre dano e conduta.
No caso dos autos, não enxergo qualquer dano indenizável sofrido pela requerente. A meu ver, o simples fato de algumas clausulas abusivas em um contrato não dá ensejo à indenização por danos morais, sendo configurados apenas contratempos ou dissabores.
Deve haver, para a aplicação do ano moral, a dosimetria correta da situação fática, sobrelevando o fato de os danos sofridos serem superiores aos meros dissabores. Se feita a aplicação de maneira desenfreada, considerando qualquer mero dissabor como fato gerador, caímos num ponto onde o instituto perde sua razão de ser, ou seja, fica banalizado. Além disso, o que deve ser evitado é a chamada “indústria do dano moral”, informalmente conhecida no meio jurídico, caso em que se busca enquadrar toda e qualquer ação cotidiana como ensejadora de dano moral. Por fim, existe ainda o que chamam de judicialização da vida cotidiana. O Direito é de extrema importância para promover a pacificação da sociedade e relação entre seus membros. Porém, deve ser garantida uma margem de autossuficiência às pessoas, um campo onde as relações devem ser estranhas às leis, evitando um Estado de todo paternalista.
III. DISPOSITIVO
Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da inicial, nos seguintes termos:
- Declaro abusivas, e, por conseguinte, extirpo do contrato, a “taxa de registro do contrato” e “seguro proteção financeira”, nos termos fundamentados.
- Declaro abusiva a taxa de juros de 2,61% ao mês e 36,26% ao ano; retificando o contrato e reduzindo a taxa ao parâmetro trazido pelo Banco Central, em seu site eletrônico, que é de 1,70% ao mês e 22,35% ao ano. Desse modo, existindo parcelas vincendas, deverão ser cobradas e pagas utilizando as novas taxas de juros.
- Eventuais valores já pagos pelos títulos acima deverão ser ressarcidos ao requerente, de forma simples. Esses valores deverão ser corrigidos monetariamente, pelos índices da CJG, desde a data do efetivo pagamento de cada um; além de juros de 1% ao mês desde a data da citação.
- Improcedentes os demais pedidos da inicial, mantendo o restante do contrato incólume.
Condeno as partes ao pagamento das custas processuais, no importe de 60% para a requerente e 40% ao requerido. Quanto aos honorários advocatícios, fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do artigo 20, §4º do CPC, divididos na mesma proporção que as custas, sendo admitida a compensação (CPC, 21). Suspendo a exigibilidade de pagamento por parte do requerente, amparado pela AJG.
P.R.I.
Ponte Nova, 21 de janeiro de 2016.
Damião Alexandre Tavares Oliveira
Juiz de Direito