Processo nº 0400.15.003989-1

 

Vistos etc…

 

O Ministério Público apresentou requerimento de liberação de recursos bloqueados na presente ação cautelar, na ordem de R$1.541.025,81, para fins de contratação do Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD/CEDEPLAR), vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais, visando a conclusão dos trabalhos relativos à precificação dos danos sofridos pelos atingidos com o rompimento da barragem de Fundão, conforme levantamento feito no processo de cadastramento, conduzido pela assessoria técnica Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais (fls. 1.580/1.582v.).

Regularmente intimada, a ré Samarco Mineração S/A alegou que há diversos aspectos em sobreposição nos trabalhos propostos pela FGV e LACTEC, tanto em relação à valoração de danos socioeconômicos, quanto em relação à valoração de danos ambientais, arqueológicos e culturais. Aduziu que o plano de trabalho da Cáritas Brasileira e pelo IPEAD/CEDEPLAR extrapola o limite de atuação da assessoria técnica e do objeto acordado no âmbito da ação civil pública (fls. 1.682/1.688).

É o breve relatório. Decido.

No acordo celebrado pelas partes na ação civil pública (processo n. 0400.15.004335-6), as rés se comprometeram a indenizar os atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, mediante a reparação integral dos danos que lhes foram causados, levando em consideração, para fins de reconhecimento e fixação das indenizações, as informações colhidas no processo de cadastramento dos atingidos, realizado pela Cáritas Brasileira.

É certo que o processo de cadastramento realizado pela referida assessoria técnica, que engloba o preenchimento de formulários, cartografia familiar, vistoria do terreno atingido e entrevista individual sobre os danos morais, é uma ferramenta necessária para os atingidos negociarem a indenização de forma esclarecida, com os subsídios necessários para analisar se a proposta de acordo apresentada pelas rés é, de fato, justa.

No entanto, as informações contidas no cadastro aplicado pela assessoria técnica devem ser aliadas à matriz de danos, que nada mais é do que uma precificação, ou seja, uma valoração de todos os prejuízos, a fim de que os atingidos, com o acompanhamento jurídico oferecido pela Cáritas Brasileira, saibam o que perderam e tenham um subsídio mínimo de avaliação da proposta de acordo oferecida pelas rés.

Para tanto, a Caritas Brasileira contratou o Instituo de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD/CEDEPLAR), vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais, cujo plano de trabalho compreende a valoração dos danos, a um custo de R$1.541,025,81, conforme documentação que instruiu o pedido do Ministério Público.

Ressalto que as rés, através da Fundação Renova, estão realizando, paralelamente, os cadastros dos atingidos, bem como a matriz de danos, para fins de apresentação das propostas de acordo, de modo que, em observância ao princípio da igualdade processual, é necessário que os atingidos tenham, além do cadastramento, a sua própria matriz de danos, confeccionada pela assessoria técnica de sua confiança, direta ou indiretamente.

Dessa forma, sem a matriz de danos (precificação dos prejuízos) vinculada à aplicação dos cadastros, os atingidos não teriam subsídio para negociar com as rés, ficando em situação de desigualdade processual. E mais, esta Magistrada, em eventual julgamento na fase de cumprimento individual de sentença, teria como parâmetro apenas a matriz de danos apresentada pela Fundação Renova, o que seria inadmissível.

Por outro lado, as rés, na cláusula 7a do acordo firmado na ação civil pública, considerando a especial dificuldade de produção de prova dos atingidos que sofreram danos na Comarca de Mariana, reconheceram, nas fases de negociação e em eventual cumprimento individual de sentença, a situação de vulnerabilidade processual e probatória dos atingidos e reconheceram aos mesmos o amplo direito de produção probatória e a facilitação das defesas de seus direitos.

Assim, a negativa das rés ao levantamento de valores bloqueados neste processo, pela Cáritas Brasileira, para a conclusão dos trabalhos relativos à precificação dos danos sofridos pelos atingidos com o rompimento da barragem de Fundão, significaria negar-lhes os meios necessários para o exercício do amplo direito à produção probatória e, consequentemente, descumprimento do acordo firmado entre as partes na ação civil pública.

Quanto à alegação da Samarco Mineração S/A, no sentido de que haveria sobreposição entre o escopo apresentado pelo IPEAD/CEDEPLAR neste processo e os trabalhos desenvolvidos por LACTEC e FGV, custeados a partir de acordos com os Ministérios Públicos Federal e Estadual, importa esclarecer que tais trabalhos são absolutamente estranhos ao presente feito e não poderiam embasar a matriz de danos dos atingidos de Mariana.

Ademais, em resposta ao ofício encaminhado pelo Ministério Público, a FGV esclareceu que a valoração econômica prevista no Projeto Básico da FGV tem por objetivo a construção de matrizes que visam, a partir de conceito, categorias e critérios, estabelecer parâmetros que possam orientar a reparação integral dos danos ocorridos com o rompimento da barragem de Fundão, mas não tratará de valoração individualizada dos danos causados aos atingidos, como fará o IPEAD (fls. 1.658/1.658v..). Portanto, tratando-se de trabalhos complementares, não há que se falar em sobreposição de escopos.

Finalmente, com relação à manifestação da ré Samarco Mineração S/A às fls. 1.672/1.673, informo que a petição contendo o cronograma de finalização das vistorias remanescentes do processo de cadastramento, formulado pela Cártias Brasileira, foi juntada pelo Ministério Público na ação civil pública (processo n. 0400.15.004335-6), com abertura de vista às rés nesta data.

Ante o exposto, defiro o requerimento do Ministério Público e determino a liberação do valor de R$1.541.025,81 (um milhão, quinhentos e quarenta e um mil, vinte e cinco centavos e oitenta e um centavos), em favor da Cáritas Brasileira, para ser utilizado com a única finalidade de contratação do Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD/CEDEPLAR), vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais, para a conclusão dos trabalhos relativos à precificação dos danos sofridos pelos atingidos de Mariana com o rompimento da barragem de Fundão.

Expeça-se alvará em favor do representante legal da Cáritas Brasileira, Rodrigo Pires Vieira, CPF 819.762.326-00.

Publique-se. Cumpra-se.

Intime-se o Ministério Público pessoalmente.

Mariana/MG, 11 de junho de 2019.

 

 

Marcela Oliveira Decat de Moura

Juíza de Direito