SENTENÇA

Vistos, etc.

1. RELATÓRIO

VAGNER PEREIRA ALMEIDA, já qualificado nos autos, ajuizou Ação de Indenização por Danos Morais em face de PAULO VITOR JARDIM CALDEIRA, também já qualificado nos autos, aduzindo, em síntese: a) em 13/04/2006, no Centro de Coronel Murta, o réu efetuou seis disparos de arma de fogo contra o autor, atingindo-o na nádega e no braço, tendo sido atendido pelo hospital de Salinas, não tendo o intento criminoso sido alcançado por circunstâncias alheias à vontade do réu; b) cmoo consequência do fato, o autor apresentou fratura exposta cominutiva grave e com perda de substância óssea do cotovelo, permanecendo com falha anatômica e grande limitação funcional. Requereu a condenação do réu a indenizar-lhe danos materiais, no montante de duzentos e quarenta salários mínimos e morais no montante de oitenta salários mínimos, além dos benefícios da justiça gratuita.

Juntou documentos de ff. 08-34.

Justiça gratuita concedida à f. 35.

Contestação às ff. 40-43, na qual o réu alegou a inépcia da inicial, por faltar pedido ou causa de pedir e, no mérito, negou os fatos, alegando que o réu agiu em legítima defesa, além de não terem sido provadas as lesões sofridas, os danos morais e materiais.

Impugnação às ff. 46-49, com documentos de ff. 55-66.

O réu impugnou a juntada dos documentos (ff. 70-71).

Afastadas todas as preliminares e saneado o processo às ff. 73-74.

Laudo pericial à f. 84.

AIJ às ff. 118-122 e 156-158v.

Alegações finais às ff. 160-167 e 168-171.

É o relatório.



2. Fundamentação

Não havendo preliminares ou nulidades a sanar, considerando que já foram decididas às ff. 73-74, passo ao exame do mérito.

O cerne da presente questão reside na constatação da ocorrência de danos morais e materiais indenizáveis à parte autora, face à tentativa de homicídio sofrida da parte do réu.

A parte demandante alega que em decorrência da referida tentativa de homicídio, foram-lhe causados danos materiais e morais.

Analisando os autos, vislumbro que, aliado às manifestações do autor, restaram comprovados nos autos os requisitos necessários à procedência dos pedidos elencados na exordial, sendo que, para que se configure o dano moral, faz-se necessário a presença da prova do dano, bem como do nexo de causalidade entre o dano e a conduta do responsabilizado, ora réu.

Às ff. 15-17, foi juntado Boletim de Ocorrência narrando que o réu tentou matar o autor, desferindo-lhe 6 disparos de arma de fogo, e “ainda colocou em risco a vida de terceiros que passavam pelo local”. O auto de corpo de delito de ff. 12-13 relata que o autor foi atingido por disparos de arma de fogo e que, provavelmente, após o tratamento, permanecerá com deficiência funcional.

O Laudo pericial de f. 84, realizado em juízo, afirmou que o autor se quedou com limitações ao movimento do antebraço direito.

Apesar de alegar, em sede de contestação, que agiu em legítima defesa, tem-se que, além de não ter provado tal fato, ainda que assim o fosse, utilizou-se de meios desarrazoados, pois disparou seis vezes contra o demandante. Leia-se o que dispõe o art.

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:(...)

II - em legítima defesa;

(...)

Excesso punível

Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

 

As testemunhas ouvidas às ff. 119-122 e 157-158v também não demonstram que ocorreu legítima defesa.

Rui Stoco aponta que o dano moral define-se como qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária, dá maior amplitude à questão, asseverando que este abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e tranquilidade, ao seu amor-próprio estético, à integridade de sua inteligência, às suas afeições, etc. (Tratado de responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 1682).

Concernente à responsabilidade do réu pelos danos indenizáveis à parte autora, o laudo pericial de f. 84, realizado em juízo, afirmou que o autor se quedou com limitações ao movimento do antebraço direito.

Assim, pela conclusão desta ocorrência, verifica-se que os danos foram causados ao autor por conduta ilícita da parte ré.

Dispõe o art. 186 do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

 

Adiante, o Código Civil também menciona em seu artigo 927:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

 

Restou evidente o dever do requerido de reparar os danos causados aos requerentes. À luz do exposto, verifico que os pedidos elencados na exordial merecem guarida, cabendo por fim discutir o quantum indenizatório, conforme entendimento do TJMG:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO - MORTE - LETIGIMIDADE ATIVA DO FILHO DA VÍTIMA - CULPA EXCLUSIVA DA PARTE RÉ E NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADOS - DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO - FIXAÇÃO EM VALOR RAZOÁVEL - REDUÇÃO PERTINENTE. O filho da vítima fatal de acidente de trânsito é parte legítima para pleitear indenização pelos danos que alega ter experimentado em decorrência do evento danoso. Restando comprovados a culpa exclusiva da parte ré pelo acidente de trânsito descrito nos autos e o nexo de causalidade entre tal evento e o falecimento da vítima, mãe da parte autora, restam evidentes a responsabilidade civil da parte ré e a configuração dos danos morais experimentados pela parte autora, situação que revela o direito desta última à percepção da respectiva indenização. A indenização por danos morais deve ser arbitrada segundo os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, com vistas à finalidade do instituto, qual seja, compensar a vítima pelos danos suportados, punir a prática lesiva e desestimular a adoção de novas condutas ilícitas pelo agente, sempre levando em consideração as condições socioeconômicas dos envolvidos. Pertinente a redução da quantia estabelecida em 1? Grau, quando não condizente com os critérios acima apontados.  (TJMG -  Apelação Cível  1.0034.09.053841-3/001, Relator(a): Des.(a) Arnaldo Maciel , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/05/2016, publicação da súmula em 25/05/2016)

 

A valoração do dano moral deve levar em conta a intensidade do sofrimento e do constrangimento advindos do evento, as condições econômicas do ofensor, a situação pessoal do ofendido e a intensidade da culpa do agente.

Como expõe a doutrina majoritária, a vítima de dano moral deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo magistrado, em atenção às circunstâncias de cada caso, de forma que não seja tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva.

Na hipótese dos autos, levando-se em conta todos os fatos relatados e a preocupação que certamente afligiu ao requerente, bem como sua sequela corporal permanente; considerando, lado outro, a situação do réu, bem como o padrão jurisprudencialmente estabelecido em situações semelhantes, arbitro o valor da indenização por dano moral, a ser paga pela parte ré, em favor da parte autora, em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Em relação aos danos materiais, por todos os fundamentos supra, tenho que também são devidos ao autor pelo réu. No entanto, é certo que doutrina e jurisprudência exigem, para concessão dos danos materiais, a prova do efetivo dano.

No caso em tela, o autor somente fez prova das despesas no montante de R$ 113,80 (f. 32), considerando que se trata de remédios adquiridos logo após os fatos. Os demais documentos juntados não demonstram relação com os fatos (notas de postos de combustível e de restaurantes), não podendo ser considerados para efeitos de reparação, sob pena de se estar julgando de forma leviana.

 

3. CONCLUSÃO

Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar a parte ré a pagar à autora o valor de:

A) R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de indenização por danos morais. Este valor deverá ser corrigido pelos índices da CGJ/MG, a partir deste arbitramento, bem como ser acrescido de juros mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso, ou seja, da data em que foram disparados os tiros;

B) R$ 113,80 (cento e treze reais e oitenta centavos) a título de indenização por danos materiais. Este valor deverá ser corrigido pelos índices da CGJ/MG, a partir do desembolso, bem como ser acrescido de juros mora de 1% ao mês, a partir da citação;

Condeno o réu ao pagamento de custas e honorários de sucumbência, estes no montante de 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 85 do CPC. Custas suspensas, face à gratuidade judiciária que ora concedo, nos termos do art. 98 do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, arquive-se com baixa.

Araçuaí/MG, 20 de outubro de 2016.



Ricky Bert Biglionne Guimarães

Juiz de Direito