VARA ÚNICA DA COMARCA DE ALTO RIO DOCE/MG

 

 

S E N T E N Ç A

 

 

Autos nº. 0004658-84.2011

Autor: Leonardo Rodrigues Mendes

Réus: JE Comunicação e Imagens Ltda e José Eleutério da Silva

 

 

Leonardo Rodrigues Mendes ajuizou ação em face de JE Comunicação e Imagens Ltda e de José Eleutério da Silva, estando todos qualificados na inicial, formulando pedido de indenização por danos morais, alegando que possui formação superior em jornalismo, com o devido registro na categoria profissional, sendo que, em meados do mês de setembro de 2010, foi informado sobre a existência de uma representação criminal em seu desfavor pela prática, em tese, dos delitos de injúria, calúnia e difamação, em virtude de uma matéria jornalística publicada em um jornal da região. Afirmou que tomou conhecimento de que o seu nome e registro profissional haviam sido publicados no jornal "O Circular - Circuito Regional de Minas". Todavia, sustentou que nunca celebrou nenhum contrato de prestação de serviço com o mencionado jornal, tampouco autorizou que o seu nome figurasse como jornalista responsável pelas publicações. Salientou que a publicação indevida do seu nome constou, ainda, em outras edições do veículo de comunicação, sendo que este explora/explorou o nome e registro do autor sem qualquer autorização para tanto. Sendo assim, diante da ausência de autorização para a veiculação do seu nome como jornalista responsável pelas matérias publicadas, bem como em razão destas serem, em muitas vezes, evasivas e absurdas, além de conterem erros grosseiros de ortografia, pugnou pela condenação dos réus ao pagamento de uma indenização pelos danos morais sofridos em virtude do uso indevido de sua imagem profissional. Pleiteou, ainda, que os réus sejam condenados a publicarem, em cinquenta edições do jornal, uma nota informando que o autor nunca foi o jornalista responsável pelas matérias veiculadas. Ao final, pugnou pela concessão da assistência judiciária.

Foram juntados a inicial os documentos de f. 17/376.

Citados, os réus apresentaram a contestação de f. 381/388, alegando, em síntese, que o autor tinha conhecimento de que o seu nome estava sendo veiculado como jornalista responsável pelas matérias publicadas no jornal "O Circular", sendo certo que a sua indicação foi feita pelo proprietário da faculdade em que cursou a sua graduação. Desta forma, considerando a ciência e anuência do autor, afirmaram que não há que se falar no pagamento de um indenização em razão dos danos morais supostamente sofridos, eis que não houve qualquer violação ao seu direito de imagem.

Juntaram os documentos de f. 389/401.

Réplica às f. 402/405.

À f. 417, foi determinando que o primeiro réu comprovasse a sua condição de hipossuficiente, para o fim de concessão da assistência judiciária, tendo a parte ré juntado os documentos de f. 421/424.

Em audiência de instrução, foi colhido o depoimento pessoal do segundo réu e foram ouvidas duas testemunhas do autor e uma dos réus, consoante termos de f. 425/436.

Às f. 465/466, consta o depoimento de uma testemunha do autos que foi ouvida por meio de carta precatória.

Alegações finais às f. 470/476 e 477/491.

Após, vieram-me os autos conclusos para a prolação de sentença.

É o relatório. Decido.

Como inexistem preliminares a serem apreciadas, passo de imediato à análise do mérito da lide.

Trata-se de ação na qual o autor alegou a ocorrência de ofensa ao seu direito de imagem, uma vez que, sendo jornalista, teve o seu nome e registro profissional vinculados a matérias do jornal "O Circular", nome fantasia da primeira ré e de propriedade do segundo réu, sem qualquer autorização para isto, motivo pelo qual pugnou pela condenação dos réus ao ressarcimento pelos danos morais sofridos, bem como que seja publicado que não era o jornalista responsável pelas matérias publicadas.

A parte ré, por sua vez, afirmou que o autor possuía conhecimento de que o seu nome constava como jornalista responsável nas publicações, de modo que inexiste violação ao seu direito de imagem.

O cerne da questão se resume em aferir se o autor possuía conhecimento sobre as publicações utilizando o seu nome como jornalista responsável pelas matérias ou se, de fato, elas eram feitas sem o seu consentimento.

Considerando o conjunto probatório contido nos autos, entendo que razão assiste ao autor, pelos motivos que passo a expor.

Os réus afirmaram que o autor tinha ciência das publicações, utilizando como base um e-mail datado de 22 de setembro de 2010 (f. 401), enquanto que, consoante se depreende do documento de f. 299, desde maio de 2009, consta o nome do autor como jornalista, o que se repetiu nas demais publicações, sendo que a autenticidade dos documentos juntados às f. 33/376 foi confirmada pelo segundo réu em seu depoimento pessoal (f. 427).

O conteúdo do e-mail indicado pelos réus não deixa claro que houve uma anuência do autor quanto à menção do seu nome como jornalista, motivo pelo qual passo a transcrevê-lo para melhor elucidação:

 

Acabei de conversar um pouco com o Ricardo e ele me resumiu a história. Disse também que o meu nome saiu em algumas edições.

Olhei aqui com o Sindicato, na declaração vou precisar de o número de todas as edições e o período. Fazer este levantamento para constar na declaração.

Estou preocupado e temendo que eu tenha problemas com isso porque sou responsável por um veículo que trabalho hoje e não posso ter complicações.

Preciso dos dados também sobre a intimação para entender melhor o porquê o processo está acontecendo.

Falei com o Ricardo sobre o pagamento referente ao período que meu nome foi publicado e ele disse que isso não será problema. Só me avisar tudo certinho.

A declaração você pode me mandar por e-mail mesmo. Fico no aguardo do retorno desse levantamento o mais rápido possível (f. 401).

O entendimento que extraio deste documento é que somente neste momento o autor teve ciência de que o seu nome tinha sido publicado em matérias anteriores a data de 22 de setembro de 2010 e, ainda, que existiria uma declaração a ser feita por ele, talvez reconhecendo a sua condição de jornalista responsável nos períodos pretéritos.

Por este documento não entendo que o autor tinha ciência dos fatos, ao contrário, depreendo que somente após a representação criminal é que houve a ciência sobre o caso.

Corroborando esta linha de raciocínio, destaco o depoimento do segundo réu feito no inquérito da representação, cujo teor foi confirmado no depoimento pessoal (f. 427), in verbis:

 

(...) que, ressalta que Léo Mendes (autor) figura como jornalista do Jornal "O Circular" por mera formalidade legal, que atualmente é dispensada, sendo certo que o responsável por referido jornal é o declarante. (f. 25/26)

 

De acordo com o depoimento retrotranscrito, é possível constatar a inexistência de relação profissional entre o autor e os réus ou, ainda, qualquer contrato de cessão de direitos de imagem ou de nome.

Deste modo, mister concluir que o autor não autorizou a publicação do seu nome e registro profissional com jornalista responsável pelas publicações constantes do jornal "O Circular".

E, sendo assim, é preciso, neste momento, aferir a responsabilidade civil dos réus pelos atos e o seu dever de indenizar o autor em virtude dos danos morais sofridos.

De acordo com a doutrina, para que o dano moral seja indenizável faz-se necessária a presença de três requisitos, quais sejam: a) a existência de ato ou omissão, antijurídico; b) a ocorrência de um dano material ou moral; c) o nexo de causalidade entre o ato ou a omissão e o dano.

A ação, no caso em análise, consistiu no uso indevido do nome do autor em publicações realizadas no jornal “O Circular”, diante da ausência de autorização.

O dano restou configurado, uma vez que, como jornalista, o autor possui o dever de prestar à população informações que sejam verídicas e, em não podendo ter o controle das matérias que foram publicadas em seu nome, o risco destas não corresponderem à realidade pode causar prejuízo a sua imagem profissional e ao seu nome.

Ademais, consoante se depreende dos depoimentos colhidos em audiência, o jornal "O Circular" não possui grande prestígio junto à coletividade:

(...), que o informante chegou, ao ler as edições do jornal, a identificar erros ortográficos e fotos montadas; que o povo de Alto Rio Doce comentava sobre estes erros e montagem de fotos; que o povo chacoteava o jornal. (Sebastião Carlos de Freitas, termo de f. 431)

 

(...) que a informante acompanhava as matérias que eram veiculadas no Jornal O Circular; que havia muitos erros ortográficos e fotos montadas; que os comentários eram para chacotear o jornal. (Maria de Lourdes Paiva Oliveira Moreira, termo de f. 433)

 

O nexo de causalidade encontra-se presente à medida que o dano à imagem profissional e ao nome do autor somente se perpetrou com a conduta dos réus de veicularem indevidamente o seu nome como responsável jornalístico.

Portanto, entendo que a responsabilidade civil dos réus restou evidenciada na hipótese, diante da violação a atributos ligados à personalidade.

Corroborando com o entendimento até aqui exposto:

 

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. USO INDEVIDO E DESAUTORIZADO DE NOME E IMAGEM POR JORNAL. ÔNUS DA PROVA. CONDUTA ILÍCITA, DANO E NEXO DE CAUSALIDADE CARACTERIZADOS. DEVER DE INDENIZAR. EXISTENCIA. MONTANTE. PARAMÊTROS. RAZOABILIDADE, PROPORCIONALIDADE. RECURSO PROVIDO. I - Para a configuração da responsabilidade civil, é imprescindível a demonstração do ato ilícito, do dano efetivo e do nexo de causalidade entre tais elementos. II - Ao autor da ação incumbe fazer prova acerca dos fatos alegados como fundamento do direito invocado, bem como ao réu, a prova de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos de tal direito. III - É ilícita a conduta do réu que faz uso indevido do nome e imagem de pessoa natural, reconhecendo-se a existência de danos morais na espécie, cuja prova se satisfaz com a simples demonstração do aludido uso sem a imprescindível autorização do titular do direito da personalidade. IV - Consoante entendimento uníssono da jurisprudência pátria, a indenização por danos morais não deve implicar em enriquecimento ilícito, tampouco pode ser irrisória, de forma a perder seu caráter de justa composição e prevenção. (TJMG. APELAÇÃO CÍVEL nº. 1.0433.11.021374-4/001. Relator: Leite Praça. Publicado em: 02/07/2013)

Inexistindo parâmetros legais para a fixação do quantum indenizatório, o julgador deve se utilizar de valores equitativos, possibilitando à parte autora um conforto pelos aborrecimentos que experimentou, sem que se configure o enriquecimento sem causa, e à parte ré uma sanção, pela conduta que fez gerar danos morais para a outra parte, como medida educativa.

Considerando tais dados, tenho que a quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), alcançará as metas pretendidas, de repressão e prevenção, a fim de que casos semelhantes não se repitam.

No que tange ao pedido do autor de condenação da ré a obrigação de fazer e não fazer, consistente na determinação de que esta cesse o ato lesivo, bem como que se retrate perante toda a sociedade altoriodocense, entendo que, também, procede.

O artigo 12, caput, do Código Civil, assim estabelece:

 

Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

 

Deste modo, a condenação dos réus de absterem-se de veicular novas publicações constando o nome do autor como jornalista responsável pelo jornal "O Circular", sem a devida autorização, é medida que se impõe.

No que concerne a condenação da parte ré a retratar-se perante toda a comunidade é também medida exigível, haja vista a previsão constitucional do direito à imagem, bem como do direito de resposta, proporcional ao agravo, como abaixo transcrevo:

 

art. 5º.

(…)

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

(…)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

 

Não diverso deste, é o entendimento jurisprudencial:

 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - TUTELA INIBITÓRIA - PROTEÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS DA PERSONALIDADE - PESSOA JURÍDICA - AMEAÇA CONTRA IMAGEM E REPUTAÇÃO - DIREITO DE LIVRE MANIFESTAÇÃO - COLISÃO - PONDERAÇÃO DE INTERESSES. - Estabelece a Carta Magna, entre os direitos e garantias fundamentais, a plena liberdade de comunicação e de manifestação do pensamento, independentemente de censura ou licença (art. 5º, incisos IV e IX), ao mesmo tempo em que assegura o direito de resposta, proporcional ao agravo, e a inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas, prevendo indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação. - Em caso de eventual conflito entre esses dois direitos fundamentais, deve-se harmonizá-los, de modo a se assegurar a liberdade de expressão e de comunicação, sem prévia censura ou licença, mas se garantindo ao possível lesado o direito de reparação, se houver excessos (art. 5º, incisos V e X) V.v: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - TUTELA INIBITÓRIA - PROTEÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS DA PERSONALIDADE - PESSOA JURÍDICA - AMEAÇA CONTRA IMAGEM E REPUTAÇÃO - DIREITO DE LIVRE MANIFESTAÇÃO - COLISÃO - PONDERAÇÃO DE INTERESSES. - A tutela inibitória possui a finalidade de impedir a violação de um direito, prevenindo a prática da ação ilícita e de seus efeitos futuros, bem como evitando a produção de danos. Está regulada no artigo 5º, inciso XXXV, da CR e art. 12, caput, do Código Civil. - No caso de colisão entre direitos fundamentais, que não são absolutos nem ilimitados e encontram seus limites em outros direitos fundamentais, utilizar-se-á de juízo de ponderação dos interesses envolvidos, visando preservar e concretizar ao máximo os direitos e bens constitucionalmente protegidos. Para tanto, a aplicação do princípio da proporcionalidade, que hoje é o axioma do Direito Constitucional, tem papel essencial. - Considerando o conteúdo abusivo das manifestações pretendidas pelo condomínio agravado, no presente caso, os direitos fundamentais da personalidade da sociedade agravante devem prevalecer em detrimento dos direitos de liberdade de expressão do agravado. AGRAVO DE INSTRUMENTO CV Nº 1.0024.11.120021-8/001. Relator: Luiz Artur Hilário. Publicado em: 13/08/2012)

 

Deste modo, entendo que o exercício do direito de resposta se faz necessário, sendo que ele deverá ser exercido por meio de um comunicado, redigido pelo autor ou pelos réus, do mesmo tamanho daquele elaborado, por exemplo, à f. 220, e publicado em 12 (doze) edições do jornal "O Circular", informando que o autor não era o jornalista responsável pelas matérias publicadas no período de maio de 2009 a maio de 2010 (f. 33/299), considerando a emissão mensal do jornal. O custo de tal divulgação deverá ser arcado pelos réus.

Ante o exposto, julgo procedente o pedido autoral, para condenar os réus a pagarem ao autor o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização pelos danos morais por este sofridos, quantia esta que estará sujeita a atualização monetária, de acordo com a tabela da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, acrescida, ainda, de juros de 1% ao mês, devendo ambos os encargos incidirem a partir da data da publicação desta sentença.

Alem disso, determino que a parte ré se abstenha de realizar novas publicações com o nome do autor, sem a sua autorização, bem como que custeie as despesas para que seja efetivado o direito de resposta, nos moldes descritos na fundamentação, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais), limitada a 30 (trinta) dias, sem prejuízo das demais responsabilidades decorrentes.

Condeno os réus ao pagamento das custas processuais, e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, em conformidade com o disposto no artigo 20, § 3º, do Código de Processo Civil, suspendendo, todavia, a sua exigibilidade somente em favor do segundo réu, uma vez que lhe concedo a assistência judiciária, de acordo com o artigo 12, in fine, da Lei nº. 1.060/1950.

Indefiro a assistência judiciária à primeira ré, diante da ausência de comprovação da hipótese constante às f. 421/422.

Com isso, dou por resolvido o mérito do processo, com fulcro no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

 

Alto Rio Doce, 30 de janeiro de 2014.

 

 

Maria Cristina de Souza Trulio

Juíza de Direito