COMARCA DE BELO HORIZONTE

 

SENTENÇA

 

Vistos etc.

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, através da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde, ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de AÉCIO NEVES DA CUNHA e MARIA DA CONCEIÇÃO BARROS DE REZENDE, noticiando ter instaurado Inquérito Civil nº 213/2007, em função do Parecer Técnico do Tribunal de Contas de Minas Gerais de 2008, tendo em vista a análise da Prestação de Contas do Governador do Estado. Destaca que o Tribunal de Contas recomendou, de 2004 a 2008, ao Governo Estadual, que este promovesse uma diminuição gradual dos valores realizados em setores nos quais os princípios da gratuidade e universalidade não fosse atendidos, por exemplo, os repasses para a Companhia de Saneamento de Minas Gerais – COPASA. Relata que o Ministério Público concluiu que o Estado de Minas Gerais, vinha, desde 2003, transferindo recursos, destinados às ações e serviços de saúde para a COPASA, como investimento em saneamento básico. Informa que a COPASA reconheceu, na contestação da ação civil pública de nº 0904382-53.2010.8.13.0024, que no período supracitado, não se deram transferências para destinação ao serviços de saneamento básico. Ademais, narra que na mesma ação, o Estado alegou que foram repassados recursos para aumentar o capital social da COPASA, em 21.12.2004 e 16.01.2006, e nada mais, não tendo sido transferido nenhum valor a título de investimento em saneamento básico, ainda, que os valores aos quais o Ministério Público se refere são da própria atividade operacional da COPASA e investimentos da mesma. Destaca que a COPASA repassa as informações das despesas executadas ao Estado, que faz constar de sua Prestação de Contas como se fossem investimentos públicos. Ressalta que, conforme dito pelo Estado, não houve transferência de recursos públicos para investimentos em saúde pública, havendo, então, no mínimo, uma fraude contábil. Salienta que o Estado deixou de aplicar recursos públicos em ações e serviços da saúde, utilizando os valores investidos em saneamento básico para compor o piso constitucional. Discorre sobre o parecer do Tribunal de Contas e as prestações de contas do Estado. Disserta sobre as ações e serviços da saúde e trata sobre a COPASA e a Comissão de Valores Mobiliários. Sustenta a responsabilidade dos Réus e a prática de atos de improbidade administrativa por eles. E, por fim, dispõe sobre as penalidades pelos referidos atos. Pleiteia, assim, a procedência dos pedidos, para decretar a condenação dos Réus pela prática de atos de improbidade administrativa às sanções previstas no art. 12, da Lei nº 8.429/92. Junta documentos de fls. 40/2271.

Decisão às fls. 2273, determinando a notificação dos Requeridos, para apresentação de manifestação.

Os Réus apresentaram manifestação prévia, às fls. 2279/2299, arguindo, preliminarmente, a competência exclusiva do Procurador-Geral de Justiça para ajuizar a demanda em face de Governador do Estado e a ausência dos elementos objetivo e subjetivo do ato ímprobo e de sua respectiva ilegalidade. Suscitaram, ainda, a impossibilidade jurídica e fática do pedido e ofensa ao princípio da razoabilidade. No mérito, discorreram sobre o regramento constitucional do investimento em saúde. Sustentaram que os atos imputados não decorreram de má-fé ou de intenção de lesar ao erário, face a ausência de proveito aos mesmos. Ressaltaram que os atos impugnados tratam-se de mera interpretação contábil frente ao cenário legislativo. Aduziram que o pedido do Parquet não se mostra razoável, pois implicaria na retirada de substancial valor da conta destinada à saúde. Relataram que apenas traduziram em linguagem contábil o que foi previamente autorizado nas orientações normativas aplicáveis e nas leis orçamentárias. Argumentaram que a insurgência ministerial se dá, exclusivamente, quanto a forma de composição do índice constitucional relativo aos gastos com a saúde, o que demandaria uma ação própria quanto a omissão legislativa da EC 29/00 ou sobre o próprio processo legislativo mineiro que contemple investimentos da COPASA em saneamento básico como forma de composição do aludido índice constitucional. Pugnaram pela rejeição da ação. Citaram jurisprudência e pugnaram pelo acolhimento das preliminares e pela rejeição da petição inicial.

O Ministério Público impugnou a manifestação dos Réus, às fls. 2417/2455, requerendo a procedência do pleito inicial.

Despacho de especificação de provas às fls. 2456 e manifestação dos Réus às fls. 2457/2459.

Decisão de fls. 2460/2469 tonando sem efeito os despachos de fls. 2416 e 2456, determinando o desentranhamento da petição do Ministério Público de fls. 2417/2455 e recebendo a petição inicial.

Agravo de Instrumento interposto, às fls. 2473//2489, cujo efeito suspensivo fora indeferido, conforme decisão de fls. 2501/2505.

Os Réus apresentaram contestação, às fls. 2534/2561, arguindo, preliminarmente, a competência exclusiva do Procurador-Geral de Justiça para ajuizar a demanda em face de Governador do Estado. No mérito, discorreram sobre a edição da Lei Complementar nº 141/2012. Sustentaram a inexistência de ato de improbidade administrativa, por ausência dos elementos objetivo e subjetivo do ato ímprobo. Alegaram a impossibilidade jurídica e fática do pedido e ofensa ao princípio da razoabilidade. Discorreram sobre o regramento constitucional do investimento em saúde e ressaltaram a observância aos comandos estabelecidos nas leis orçamentárias. Pugnaram pela extinção do feito sem julgamento do mérito.

Impugnação à contestação às fls. 2568/2607.

Atendendo ao despacho de especificação de provas, os Réus requereram a produção de prova documental às fls. 2609, o que foi deferido às fls. 2614.

A Ré Maria da Conceição Barros Rezende juntou os documentos de fls. 2619/2633.

Manifestação do Ministério Público, às fls. 2640/2643, requerendo a oitiva da Contadora Geral do Estado e perícia contábil, já especificando os esclarecimentos devidos.

Às fls. 2645/2647 a Ré se manifestou, apresentando seu quesitos.

Acórdão do TJMG, às fls. 2651/2655, acolhendo os embargos e conferindo efeitos infringentes aos mesmos, desconstituindo a decisão de recebimento da inicial e determinando a intimação pessoal do Procurador-Geral de Justiça para emendar a inicial, se quiser.

O Réu Aécio Neves da Cunha manifestou-se às fls. 2656/2666, juntando os documento de fls. 2669/2686, requerendo a extinção do processo, em razão da ilegitimidade das subscritoras da petição inicial.

Despacho às fls. 2687 determinando a intimação pessoal do Procurador Geral de Justiça.

Manifestação do Procurador-Geral de Justiça, às fls. 2689/2697, aduzindo que, conforme a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, compete à ele instaurar inquérito civil e promover ação civil pública quando a autoridade reclamada for o Governador do Estado. Ressaltou que isto não se confunde com a prerrogativa de foro. Alegou que o início de investigação sem observância das atribuições asseguradas por lei ao Procurador-Geral representa prática que não deve ser protegida. Destacou que, no caso concreto, não se vislumbra lesão ao patrimônio público e que a discussão sobre o caráter e composição das despesas realizadas no financiamento da saúde pelo Estado não resultará na configuração de dano ao erário, desvio, apropriação ou dilapidação de bens ou haveres do Estado. Salientou que, inicialmente, não restou caracterizado o dolo indispensável à configuração da improbidade administrativa. Deixou, por fim, de convalidar os atos de investigação levados a efeito e a ação deles originada.

 

Fundamentação

 

O ponto central da questão posta sob a apreciação do Judiciário consiste em decidir se os Réus praticaram ato de improbidade administrativa.

No entanto, para que o Estado-Juiz possa decidir o litígio, julgando o pedido, acolhendo-o ou rejeitando-o, é necessário que sejam observados os pressupostos processuais, que são indispensáveis à própria existência ou validade da ação.

Como é sabido, a doutrina é consideravelmente divergente no tocante de quais sejam estes referidos pressupostos. Considero, então, a doutrina tradicional para a analise dos mesmos.

O pressuposto processual aqui em pauta, é a capacidade de estar em juízo. Sobre este tema, doutrina o Mestre Daniel Amorim Assumpção Neves:

As partes no processo terão necessariamente que praticar atos processuais, que são uma espécie de ato jurídico. Dessa forma, as partes precisam ter capacidade processual (legitimatio ad processum) para a prática de tais atos.

(…)

A doutrina é tranquila no entendimento de que se trata de pressuposto processual de validade do processo. Trata-se inclusive de vício sanável, devendo o juiz conceder no caso concreto um prazo para que a parte adquira a capacidade de estar em juízo, somente sendo caso de extinção do processo – no caso do autor – e seguimento do processo à revelia – no caso do réu – havendo omissão da parte no suprimento do vício.”1:Grifou-se.

 

In casu, a presente Ação Civil Pública fora ajuizada através da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde do Estado de Minas Gerais. Entretanto, dispõe o art. 29, VIII, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e o art. 129, III, da Constituição Federal, in verbis:

 

Art. 29. Além das atribuições previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, compete ao Procurador-Geral de Justiça:

[...]

VIII - exercer as atribuições do art. 129, II e III, da Constituição Federal, quando a autoridade reclamada for o Governador do Estado, o Presidente da Assembleia Legislativa ou os Presidentes de Tribunais, bem como quando contra estes, por ato praticado em razão de suas funções, deva ser ajuizada a competente ação;” Grifou-se.

 

 

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

[…]

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;” Grifou-se.

 

Sendo assim, conforme os dispositivos supracitados, verifica-se que a capacidade de estar em juízo, neste caso concreto, é do Procurador-Geral de Justiça, porquanto o suposto ato de improbidade administrativa ora impugnado fora teoricamente praticado pelo Réu Aécio Neves da Cunha enquanto de seu mandato de governador do Estado de Minas Gerais.

Ademais, o Eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais determinou, na decisão de fls. 2651/2655, “a intimação pessoal do Procurador Geral de Justiça para emendar a inicial, a fim de regularizar a legitimatio ad processum, no prazo de dez dias, sob pena de extinção do processo sem julgamento de mérito”.

Cumprindo este Juízo a referida determinação, mandou intimar o Exmo. Procurador-Geral que se manifestou às fls. 2689/2697, sendo que o mesmo deixou de “convalidar os atos de investigação levados a efeito e a ação deles originada.

Assim, a extinção do processo é a medida que se impõe.

Conclusão

POSTO ISSO, nos termos do art. 267, IV, do CPC, julgo extinto, sem resolução de mérito, o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de AÉCIO NEVES DA CUNHA e MARIA DA CONCEIÇÃO BARROS DE REZENDE.

Deixo de impor à Parte Autora o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, por força do art. 18, da Lei nº 7.347/85.

P.R.I.

Belo Horizonte, 29 de janeiro de 2014.

 

 

Adriano de Mesquita Carneiro

Juiz de Direito

5ª Vara de Fazenda Pública Estadual e Autarquias

C:\Servidor 5ª Estadual\RUPE\Janeiro - 14\Sentenças\0024.10.244.832-1.odt

CERTIDÃO

Certifico e dou fé que o Diário do Judiciário publicou a decisão em ___/___/___

A Escrivã,________________________

 

1 - NEVES, Daniel Amorim Assumpção, Manual de Direito Processual Civil, 3ª ed., Editora Método, SP, 2011, p. 57/58.