Comarca de Belo Horizonte (MG)

35ª Vara Cível

Processo nº: 0024.13.052.362-4

Ação: Ordináriaa

Autor(a): Newton Cardoso

Réu(a): Google Brasil Internet Ltda

 

SENTENÇA

 

Vistos, etc.

 

NEWTON CARDOSO E NEWTON CARDOSO JÚNIOR, já qualificados nos autos, ajuizaram ação ordinária em face de GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA, também qualificada, alegando, em síntese, que tomou conhecimento da existência um vídeo com conteúdo ofensivo ferindo a integridade dos autores, mantido no sítio do YOUTUBE, que teria sido divulgado por terceira pessoa, sem a sua autorização. Argumenta haver solicitado que a ré tomasse as devidas providências para a exclusão do referido vídeo, contudo, esta se recusou a fazê-lo. Diante disso, pede a condenação da Ré ao pagamento dos danos morais suportados pelo evento e a exclusão, de forma definitiva, do vídeo intitulado “Carlin Moura Rouba Pouquinho” no site de vídeos denominado YOUTUBE. Com a inicial, vieram os documentos de fls. 29/44.

 

Medida liminar deferida, às fls. 45/46.

 

Citada, a ré ofereceu a contestação de fls. 77/112, argumentando pela impossibilidade de ser responsabilizada por atos praticados por terceiros, que não tem controle preventivo de conteúdo inserido pelos usuários do YOUTUBE e alega a inexistência de prova dos danos morais. Juntou os documentos de fls. 113/133.

 

Impugnação à contestação apresentada nas fls. 135/151.

 

Alegações finais, fls. 247/264 e 265/270.

 

Em síntese, é o relatório. Decido.

 

Cuida-se de ação com pedido de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, sob a alegação da autora ter sido alvo de ofensas em página na internet do YOUTUBE, mantida pelo GOOGLE.

 

Cinge-se a lide a determinar se provedor do sítio do YOUTUBE é responsável pela exclusão do conteúdo das informações veiculadas no respectivo site, face à solicitação extrajudicial formulada pela autora e se o desatendimento de tal pedido enseja a reparação por danos morais.

 

Na hipótese específica dos autos, o YOUTUBE, comunidade virtual na qual foram veiculadas as informações tidas por ofensivas, verifica-se que o GOOGLE atua como provedor de conteúdo, pois o site disponibiliza informações, opiniões e comentários de seus usuários. Estes usuários criam perfis pessoais, por meio dos quais postam vídeos que são disponibilizados ao público em geral.

 

Sob esse aspecto, a responsabilidade da ré deve ficar restrita à natureza da atividade por ela desenvolvida no site denominado YOUTUBE, que, corresponde à típica provedora de conteúdo, disponibilizando na rede as informações encaminhadas por seus usuários.

 

Nesse aspecto, o serviço do GOOGLE deve garantir o sigilo, a segurança e a inviolabilidade dos dados cadastrais de seus usuários, bem como o funcionamento e a manutenção das páginas na internet que contenham as contas individuais e as comunidades desses usuários, não se permitindo responsabilizar-lhe pela prévia fiscalização do conteúdo das informações que circulam no YOUTUBE.

 

Entretanto, também não é razoável deixar os autores desamparados frente à prática, cada vez mais corriqueira, de se utilizar comunidades virtuais como artifício para a consecução de atividades ilegais.

 

Dessa forma, ao oferecer um serviço por meio do qual se possibilita que os usuários externem livremente sua opinião, deve o provedor ter o cuidado de propiciar meios para que se possa identificar cada um desses usuários, coibindo o anonimato e atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e determinada.

 

Portanto, sob a ótica da diligência média que se espera do provedor, deve este adotar as providências que, conforme as circunstâncias específicas de cada caso, estão ao seu alcance para a individualização dos usuários do site, sob pena de responsabilização subjetiva por culpa in omittendo.

 

No caso dos autos, restou incontroverso que a autora, ao constatar a prática ofensiva à sua honra (fls. 35), solicitou a ré que excluísse da internet o conteúdo ofensivo, contudo esta não retornou deu resposta ao pedido do autor, fato que deu ensejo à propositura desta ação.

 

Assim, apesar de não ter sido a ré quem postou o vídeo no site YOUTUBE, o desatendimento ao pedido da autora gera a sua responsabilização, pois, sabendo da prática abusiva no uso dos seus serviços, optou por permitir que os atos ofensivos perpetuassem, não restando à autora outra medida que não a propositura desta demanda.

 

Assim, fixada a responsabilidade da ré em atender ao pedido da autora de retirar o conteúdo ofensivo de seu site, resta aferir se tal negativa gerou danos morais à demandante.

 

Nada obstante a responsabilidade da ré pela retirada do conteúdo ofensivo à autora postado e divulgado no site YOUTUBE, pelo contexto dos autos não se permite deduzir que apenas o ato praticado pela ré tenha causado danos à parte autora. Ademais, não restou caracterizado nos autos ofensa à honra objetiva da autora ou ao conceito de que goza no meio social, pressupostos estes imprescindíveis para imposição do dever indenizatório moral à pessoa jurídica. Nesse diapasão, Carlos Alberto Bittar faz importante ressalva:“[...]Excepciona-se da proteção à pessoa dotada de notoriedade e desde que no exercício de sua atividade, podendo ocorrer a revelação de fatos de interesse público, independentemente de sua anuência. Entende-se que, nesse caso, existe redução espontânea dos limites da privacidade (como ocorre com os políticos, atletas, artistas e outros que se mantêm em contato com o público com maior intensidade).[...]”.1

Neste mesmo sentido, decidiu o TJSP em relação similar a esta: “[..] os políticos estão sujeitos de forma especial às critcas públicas, e é fundamental não só ao povo em geral larga margem de fiscalização e censura de suas atividades, mas sobretudo à imprensa, ante a relevante utildade pública da mesma[..]” (Ac. da 2ª Câmara de Direito Privado, 104068-78.2014.8.26.0100, RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - PUBLICAÇÃO DE VÍDEO COM CONTEÚDO QUE CONSIDERA O AUTOR OFENSIVO A SUA HONRA JUNTO AO YOUTUBE - IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA - INCONFORMISMO - INADMISSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE ABUSO DE DIREITO - AUTOR QUE É DEPUTADO FEDERAL E ESTÁ CIENTE DOS DISSABORES DE SER PRESTADOR DE SERVIÇO PÚBLICO ESTANDO SUJEITO AS CRÍTICAS DO ELEITORADO DISSIDENTE ).

 

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido para determinar que a ré proceda à definitiva exclusão do vídeo intitulado “Carlin Moura Rouba Pouquinho” do site YOUTUBE. Consequentemente, encerro a prestação jurisdicional nesta primeira instância, ficando a lide submetida aos efeitos do art. 515, §§1º e 2º e do art. 516 do Código de Processo Civil2 na hipótese de eventual recurso.

 

Julgo extinto o processo com apreciação de mérito e, em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento de 50% (cinqüenta por cento) das custas processuais e condeno cada uma ao pagamento de honorários advocatícios ao advogado da outra, sendo que estes arbitro em R$1.200,00 (um mil e duzentos reais), facultada a compensação.

 

Após o trânsito em julgado, e nada sendo requerido, arquive-se com baixa. P.R.I.

 

Belo Horizonte (MG), 22/07/15.

 

 

Carlos Frederico Braga da Silva

Juiz De Direito

gab.d.doc

1- BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p.108.

2 Art. 515. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.§ 2º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais. [...]Art. 516. Ficam também submetidas ao tribunal as questões anteriores à sentença, ainda não decididas.”