CONCLUSÃO

Aos 25 dias do mês de novembro de 2014, faço estes autos CONCLUSOS ao Exma. Sra. Dra. Juíza da 16ªVara Cível desta Comarca, do que para constar, lavrei este termo.

O Escrivão, ___________________________

 

AUTOS Nº 0024.11.267.250-6

AUTOR: MARCIO HENRIQUE PEREIRA GOMES

RÉU: ITAÚ SEGUROS S/A.

 

 

S E N T E N Ç A

 

 

MARCIO HENRIQUE PEREIRA GOMES ajuizou a presente “Ação de Cobrança de Indenização Securitária“ em desfavor de ITAÚ SEGUROS S/A., qualificados.

Em síntese, sustenta o Autor que durante o período de 09/04/1996 a 23/06/2010 laborava para a empregadora PRES SERVICE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LTDA; que por Convenção Coletiva de Trabalho é assegurada à categoria indenização equivalente a 65 (sessenta e cinco) vezes o piso salarial do vigilante patrimonial no mês, na hipótese de invalidez funcional permanente total consequente de doença (IFPD); que por força desta cláusula constante da Convenção Coletiva do Trabalho, a empregadora pactuou um seguro de vida em grupo com a Ré, cuja apólice beneficia o Autor. Contudo, a Ré lhe negou o benefício, ao fundamento que o segurado apresenta quadro de doença esquizofrenia, sem perda da capacidade de vida independente, não se enquadrando nas condições estabelecidas pela garantia.

 

Requer, a condenação da ré ao pagamento do valor da indenização securitária no valor mínimo fixado pela Convenção Coletiva de Trabalho.

Recebimento da inicial: 05/09/2011.

Citada, a Ré apresentou contestação (fls. 16/25), sustentando que a invalidez do autor não se enquadra na Cobertura Adicional de Invalidez Funcional Permanente Total por Doença, prevista contratualmente. Argumenta que a aposentadoria por invalidez por doença concedida pelo INSS não implica em reconhecimento pela Seguradora de direito ao recebimento da indenização. Eventualmente, aduz que o valor da indenização deve ser limitado a R$ 51.350,00.

Impugnação à contestação (fls. 47/49).

Em sede de especificações de provas, pleiteou a ré pela produção de prova pericial médica e prova documental (f. 51), tendo o Autor requerido a produção de prova pericial (f. 52).

Audiência de conciliação (f. 54), na qual restou infrutífera a composição entre as partes.

Laudo Pericial (fls. 76/84).

Alegações finais (fls. 104/107 e 109/113).

Por decisão (f. 116), foi nomeada curadora especial ao autor.

Parecer Ministerial (fls. 123/127)

Este, o necessário relatório.

DECIDO.

O feito encontra-se em ordem, inexistindo vícios e irregularidades a serem sanados.

Pois bem.

 

Cuida-se de ação de cobrança de indenização securitária por invalidez funcional permanente total consequente de doença.

Indubitavelmente a relação jurídica entabulada entre as partes possui natureza consumerista e, portanto, a lide deverá ser analisada sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor.

Como cediço, a legislação consumerista contempla a autonomia da vontade, mas de forma mitigada, ao consagrar no art. 4o. da Lei 8.078/90 os princípios da transparência e boa-fé e reconhecer a vulnerabilidade objetiva dos consumidores buscando o equilíbrio nas relações contratuais, bem como ao vedar práticas abusivas, conforme previsto no art. 39 do CDC, por contrariar os princípios da boa-fé e do equilíbrio contratual indispensáveis nas relações de consumo.

Analisando o contrato de seguro celebrado entre as partes, verifica-se que este caracteriza-se como um contrato de adesão e, portanto, nos termos do § 4º do art. 54 do CDC, as cláusulas que implicam em limitação de direito do consumidor deveriam estar redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão, todavia esta regra não foi observada no caso dos autos, tendo em vista que no instrumento não consta, de forma clara, o que caracterizaria perda da existência independente e perda do pleno exercício das relações autonômicas.

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                  Com efeito, da análise da apólice do seguro verifica-se que na Seção V, referente ao capítulo que trata da Cobertura de Invalidez Funcional Permanente Total por Doença, consta:

 

Considera-se como risco coberto a ocorrência comprovada – segundo critérios vigentes à época da regulação do sinistro e adotados pela classe médica especializada – de um dos seguintes quadros clínicos incapacitantes provenientes exclusivamente de doença:

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          1. alienação mental total e permanente, com perda das funções cognitivas superiores (cognição), única e exclusivamente em decorrência de doença”.

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                      Para todos os efeitos desta norma é considerada perda da existência independente do segurado a ocorrência de quadro clinico incapacitante que inviabilize de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado, comprovado na forma definida nas condições gerais e ou especiais do seguro”

                  2. Já no § 1º do art. 17 consta:

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                      O Superior Tribunal de Justiça, no que diz respeito à limitação da capacidade laboral do contratante do seguro, já se pronunciou no sentido de que se acatarmos o entendimento defendido pelo requerida, no sentido que a invalidez funcional necessária à cobertura além de permanente javeria de ser total, “assim considerada aquela que o incapacite para o pleno exercício de suas atividades autonômicas”, nunca se reconhecerá o direito de um segurado, vejamos:

                2.  

"AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 35.343 - RS (2011/0107144-4) O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator)


(...)Portanto, não há falar em omissão.

Não é razoável a tese da seguradora, de acordo com a qual os fatos constantes do acórdão estadual (como, por exemplo, a assertiva de que "sempre haverá a possibilidade de exercer algum outro tipo de atividade a qual nunca se dedicou") demonstrariam a inexistência de invalidez permanente e total.

Consoante tal linha de pensamento, a incapacidade nunca será permanente, pois, em grande parte dos casos, o indivíduo consegue desenvolver outro tipo de trabalho que não aquele para o qual se especializou e, além do mais, sempre há a possibilidade de novas descobertas na medicina (com o avanço dos estudos na área), o que não afasta a hipótese, ainda que remota, de reversão do quadro.

(...)

A invalidez deve ser caracterizada pela impossibilidade do exercício de função para a qual a segurado tem aptidão, não se exigindo que ele viva em estado vegetativo. A exigência de que o segurado esteja impossibilitado de exercer as relações autonômicas para que exista a cobertura contratual, afigura-se abusiva, pois, como bem define o precedente desta 28ª Câmara de Direito Privado, ‘a invalidez necessária para determinar a indenização securitária por invalidez total e permanente é a que impede o trabalho, não havendo necessidade de o segurado ter tamanha incapacitação que viva vegetativamente’.” (TJSP - 28ª Câmara de Direito Privado - Ap. Cív. n. 0008878-52.2007.8.26.0297 - j. 20.01.2011 - rel. Des. Cesar Lacerda) .

 

Note-se que no laudo pericial consta (f. 79-v/80):

 

“Do ponto de vista psiquiátrico forense, em decorrência desta afetação sobre o funcionamento psíquico atual, pode-se depreender que o periciado não reúne instrumental cognitivo e de práxis mínimas e necessárias para desenvolver qualquer atividade laboral remunerada na forma convencional. (grifei)

 

Trata-se de condição permanente e irreversível a luz dos conhecimentos médicos atuais”

 

É preciso considerar que a expressão “a ocorrência de quadro clinico incapacitante que inviabilize de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado, não possibilita-lhe uma imediata e clara compreensão acerca da cobertura securitária por ele contratada.

 

Por fim, deve ser mencionado que o seguro foi contratado para satisfazer exigência prevista na Convenção Coletiva de Trabalho da Categoria, que na alínea “B”, da Cláusula décima oitva, para a hipótese de “invalidez funcional permanente total consequente de doença” (IPFD), sem qualquer menção à exigência de “existência independente”.

 

No que se refere ao valor da indenização, a apólice (item 5, f. 44) prevê para o caso de invalidez funcional permanente e total por doença (IFPTD), que o segurado poderá obter 100% de adiantamento da garantia básica, limitada ao mínimo de R$ 51.350,00 e máximo de R$ 91.548,00, todavia sem esclarecer quais os critérios para fixação do valor da indenização dentro daqueles patamares.

 

Já a Convenção Coletiva de Trabalho (f. 29), estipula na alínea “B” da Cláusula Décima Oitava indenização de “até 65 (sessenta e cinco) vezes o piso salarial do vigilante patrimonial no mês, na hipótese de invalidez funcional permanente total consequente de doença (IFPD).

 

Ora, como o seguro foi contratado para atender a exigência constante na Convenção Coletiva de Trabalho, como restou incontroverso nos autos, devem prevalecer os valores previstos na referida Convenção.

 

Com essas considerações, a procedência do pedido se impõe.

 

 

Pelo exposto e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial para condenar a requerida a pagar ao autor indenização securitária no valor de R$ R$ 62.689,25 (sessenta e dois mil, seiscentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) , acrescida de correção monetária desde a data da negativa de pagamento e de juros de 1% ao mês, estes devidos a partir da citação.


Condeno a requerida ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, salientando que a regra prevista no § 1º, do art. 11, da Lei 1.060/50, perdeu a eficácia diante da edição do Código de Processo Civil
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P.R.I.

Belo Horizonte, 25 de novembro de 2014

 

 

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    1. VÂNIA FERNANDES SOALHEIRO

JUÍZA DE DIREITO