JUÍZO DE DIREITO DA 12ª VARA CRIMINAL
DA COMARCA DE BELO HORIZONTE-MG

 

 

 

Processo:    024.12.295.958-8

Réus:        WALDEMAR DE MOURA SILVA

             ALEXSON FIGUEIREDO SILVA

Tipificação: Artigos 302, Parágrafo Único, inciso  II (por duas vezes) e 303, Parágrafo Único, (por três vezes), ambos da Lei 9.503/97, c/c art. 70 do CP.

 

 

 

 

       Vistos etc.

 

 

 

WALDEMAR DE MOURA SILVA E ALEXSON FIGUEIREDO SILVA, qualificados nos autos, foram denunciados como incursos nos artigos 302, Parágrafo Único, inciso II e 303, Parágrafo Único, ambos da Lei 9.503/97, c/c art. 70 do CP porque, conforme narra a exordial, em 24.09.2012, na esquina da rua Goitacazes com Rua São Paulo, no centro desta capital, o primeiro denunciado, conduzia o veículo de carga Fiat/Ducato, cor branca, placa de identificação HIC-3510, quando, agindo com imprudência, desenvolvendo velocidade excessiva e incompatível com o local e com as características de seu veículo, acionou o sistema de freios do veículo, o qual apresentava mal funcionamento, em razão da inexistência da correta manutenção, e não atendeu ao comando, não diminuiu a velocidade e atingiu as vítimas, Joelma Gonzaga e Joelma Silva, causando-lhes lesões corporais que foram as causas de suas mortes e, ainda, a vítima Cacilene Pereira Lima, causando-lhe sérias lesões corporais. Posteriormente, o veículo desgovernado atingiu a traseira do caminhão Mercedes-Benz, placa HGJ-7747, conduzido pela vítima Bruno César Marçal Rodrigues causando-lhe lesões corporais neste, bem como no passageiro do caminhão, Márcio da Conceição Henrique. Quanto ao segundo denunciado, contribuiu para a eclosão do acidente, pois no exercício de sua profissão de mecanico, realizou manutenção no veículo, sem a adoção dos cuidados e técnicas necessários, negligentemente e de forma imperita, uma vez que constatou que o sistema de freio de estacionamento encontrava-se inoperante, comunicou ao primeiro denunciado, mas por ele foi determinada a manutenção apenas do freio de serviço, mas substituiu os discos de freio dianteiros e negligentemente deixou de substituir as respectivas pastilhas, comprometendo o funcionamento e eficiência, bem como aplicou técnica absolutamente inapropriada na manutenção dos freios do Ducato, aplicando silicone nas pastilhas de freio dianteiro para aderi-las as pinças de freio, diante da peça apropriada para fixação das pastilhas encontrar-se trincada na roda dianteira direita e ausente na dianteira esquerda.

 

A denúncia foi recebida em 06.06.2013, às fls. 228.

 

Os denunciados foram citados e apresentaram resposta a acusação, nos termos do art. 396 do C.P.P., por intermédio de Defensores Constituídos diversos (Alexson -  fls. 236/237 e 244/249, Waldemar – fls. 289/290 e 295/296).

 

Durante a instrução foram inquiridas nove testemunhas, sendo cinco arroladas pela acusação, duas exclusivas da defesa de Alexson e duas da defesa de Waldemar, sendo as demais dispensadas pelas partes ( fls. 332/336, 346, 367/368, 373/374 e 380/381 ).

 

Ao final da instrução criminal os acusados foram interrogados, conforme termos de fls. 384/385 e 386/387.

 

As partes não requereram diligências e vieram as alegações finais, por memoriais.

 

Primeiramente, o Dr. Promotor de Justiça requereu a condenação do acusado Waldemar de Moura Silva, nas sanções previstas no art. 302, Parágrafo Único, inciso II, por duas vezes e art. 303, parágrafo único, por três vezes, todos da Lei 9.503/97 e a absolvição do acusado Alexson Figueiredo Silva, reconhecendo que este não contribuiu para ocorrência do evento danoso, descrito na inicial acusatória ( fls. 389/396v ).

 

Em seguida, a Defesa do acusado Waldemar, sustentou sua absolvição alegando que o acusado não foi negligente, no que tange ao conserto dos freios do veículo e que estes estavam funcionando, afirmando que o acidente ocorreu devido a uma falha momentânea. Em caso de condenação, pugnou pelo reconhecimento de crime continuado, com a consequente aplicação do art. 70 do Código Penal, pleiteou ainda, a aplicação da pena no mínimo legal, bem como a concessão do benefício da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos ( fls. 398/402 ).

 

Por fim, a Defesa do acusado Alexson, ratificou as alegações finais do Parquet, que sustentou a absolvição ( fls. 404/406 ).

 

Relatados. Examinados. Decido.

 

Processo regularmente instruído, livre de nulidades e apto à decisão do mérito.

 

A materialidade delitiva restou comprovada através do Boletim de Ocorrência, pelos  relatórios de necropsia das vítimas fatais Joelma Rodrigues Gonzaga e Joelma da Silva, pelo laudo pericial de Acidente de Trânsito e através dos laudos, comprovando as lesões corporais sofridas pelas vítimas Márcio, Bruno e Cacilene ( fls. 03/13v, 124/125, 142/143, 150/196, 199/200, 201/202 e 301/302 ).

 

Da mesma forma, a autoria restou inconteste.

 

Primeiro, o acusado Waldemar de Moura Silva, confirmou, em Juízo, que estava na condução do veículo que atropelou as vítimas, em que pese tenha atribuído a causa do acidente a uma falha mecânica no sistema de freios:

 

“...que a denúncia é verdadeira; que estava conduzindo o Fiat Duccato quando houve o acidente; que estava começando a descer a rua quando pisou no freio, mas o pedal desceu; que não conseguiu frear o veículo; que tinha consertado o veículo, e ele estava bom, estava funcionando; que foram trocados os discos de freios; que o pedal de freio também foi regulado, e estava firme; que chegou a comprar as pastilhas novas, mas não foram trocadas porque as que estavam no veículos estavam boas, tinham sido trocadas há pouco tempo; que comprou as pastilhas, mas o mecânico disse que as que estavam no veículo estavam boas; que sempre foi Alexson quem fez a manutenção do veículo; que é habilitado há dez anos;  (…); que tentou “bombar” o freio, pisou várias vezes, mas fazia apenas o barulho de vácuo (…) que sabia que o freio de mão não estava funcionando; que Alexson alertou o depoente de que era necessário trocar o freio de mão, mas o depoente recusou, porque não tinha condições...” ( fls. 384/385).

 

De igual forma, o acusado Alexson Figueiredo Silva, confirmou, em Juízo, que foi o responsável pela manutenção do veículo dias antes do acidente, mas alegou que a manutenção foi realizada corretamente e de acordo com as determinações do proprietário do veículo:

 

“...que a denúncia é verdadeira, em relação ao depoente; que uma semana antes do acidente, o veículo esteve na oficina do depoente; que o veículo foi para conserto da embreagem, mas constataram, enquanto verificavam a embreagem, que os discos de freios estavam ruins, bem como as pastilhas dianteiras; que comunicou ao réu, e ele disse que havia um jogo de pastilhas, novos, dianteiros, dentro do veículo; que o réu disse que não era para ser feita a troca dos discos, mas que trocassem as pastilhas dianteiras, mesmo com os discos ruins; que uma semana depois, o réu Waldemar voltou à oficina, para a troca dos discos de freios; que verificou a traseira e constatou que não havia as sapatas e os reparos do freio de estacionamento, e os cabos estavam amarrados; que fez o orçamento para a troca e conserto do freio de estacionamento; que passou o orçamento para o réu Waldemar, mas ele disse que deveria trocar somente as pastilhas traseiras e os discos de freios traseiro e dianteiro, pois as pastilhas dianteiras tinham sido trocadas uma semana antes; que fez como foi determinado por Waldemar; que comumente é utilizado silicone nas pastilhas de freios para evitar atrito e barulho nas pinças de freios; que os próprios clientes pedem para que sejam colocados silicones; que o silicone é utilizado para evitar o atrito, não se presta para aderir às peças; que as molas que fixam as pinças de freios não havia na loja, por isso deixou como estava; que as molas fazem a mesma função que o silicone; que a existência das molas ou do silicone não interfere no funcionamento do freio do veículo; (…) que alertou Waldemar de que deveria trocar os discos de freio quando o veículo foi a primeira vez para a oficina, mas ele disse que não tinha condições, e somente levou o veículo para a troca no dia 11 ...” ( Alexson Figueiredo Silva - fls. 386/387 ).

 

Portanto, não restam dúvidas quanto à autoria.

 

Quanto à tipicidade, em relação à conduta praticada pelo acusado Alexson Figueiredo Silva, como reconheceu o Ministério Público, não restou comprovado durante a instrução criminal, que este, ao realizar a manutenção do veículo, agiu com imprudência, negligência ou imperícia.

 

A testemunha Rafael, sócio do acusado Alexson, confirmou que este alertou Waldemar que os freios deveriam ser trocados, porém, Waldemar preferiu não efetuar a troca:

 

“... que o denunciado Waldemar muitas vezes não completava o serviço necessário no veículo, deixando parte do serviço para ser feito posteriormente, embora devidamente orientado pelo depoente e por Alexson da necessidade de se fazerem os ajustes mecânicos no carro; que pouquíssimo tempo antes do acidente, o denunciado Waldemar tinha levado o carro na oficina e Alexson disse a ele os serviços que deveriam ser feitos no carro; que Waldemar não quis fazer os serviços que seriam indispensáveis, dizendo que voltaria depois; que foi constatado que os amortecedores estavam estourados e que a sapata do freio de mão nas rodas traseiras era inexistente; que tudo isso foi avisado por Alexson (…) que não existindo as sapatas do freio de mão, ao puxar o freio de mão, tal procedimento ajuda um pouco o carro a parar, mas não para totalmente, somente reduz a velocidade...”

 

Realmente, a testemunha Rafael é sócio do acusado Alexson, mas nota-se que seu depoimento em momento algum se mostra tendencioso a eximir o réu de culpa, pois se restringe a trazer apenas informações acerca do conserto do veículo de Waldemar e em nada diverge do depoimento do acusado Alexson.

 

É induvidoso que se a manutenção do veículo tivesse sido realizada da maneira correta, de modo que todo o sistema de freios funcionasse adequadamente, o acidente não teria ocorrido.

 

Contudo, o mecânico Alexson, ao realizar o conserto da embreagem do veículo do réu Waldemar, percebeu e o avisou que os discos do freio, essenciais à frenagem, precisavam ser trocados, bem como o freio de estacionamento.

 

Entretanto, conforme depoimento do próprio acusado Waldemar, embora Alexson tivesse lhe avisado acerca da deficiência nos freios, preferiu realizar apenas a troca dos discos do freio, negligenciando assim, a troca das pastilhas e do freio de estacionamento.

 

Neste passo, ao acusado Alexson, na qualidade de mecânico, não restou alternativa senão a troca dos discos de freio apenas, conforme solicitado pelo proprietário do veículo, o corréu  Waldemar.

 

Assim, restou comprovado que o acusado Alexson não contribuiu para a ocorrência do acidente.

 

Por outro lado, quanto à conduta do réu Waldemar de Moura Silva, esta se amolda perfeitamente às descritas nos artigos no art. 302, parágrafo único, inciso II (por duas vezes) e art. 303, parágrafo único (por três vezes), ambos da Lei 9.503/97, que prescrevem:

 

Art. “Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:

(...)

II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;” 

 

Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena de um terço à metade, se ocorrer qualquer das hipóteses do parágrafo único do artigo anterior.”

 

As testemunhas Jean, Leandro, Flávio e Bruno, que tiveram seus veículos abalroados pelo veículo do réu, confirmaram que ele trafegou de maneira desgovernada, avançando a parada obrigatória e culminando nas lesões corporais das vítimas Cacilene, Bruno e Márcio e, ainda, nos óbitos das vítimas Joelma Gonzaga e Joelma Silva:

 

“...que confirma o depoimento de fls.43/43 verso; que parou em razão da placa de parada obrigatória e as vítimas começaram a atravessar na faixa de pedestres, quando foram atropeladas; que foi atingido pela van e conseguiu parar no passeio; que após atingir o depoente a van atingiu as mulheres e depois bateu no caminhão; que o caminhão tombou após ser atingido; que não sabe informar a velocidade que a van trafegava...” ( Jean Carlo Silva Freitas  -  fls. 334 );

 

“...que confirma o depoimento de fls. 46/46 verso; que mencionou no depoimento que o veículo estava desgovernado, porque quando o visualizou próximo ao cruzamento, percebeu que ele não teria condições de parar, pois não reduziu a velocidade; que não ouviu o condutor da van buzinado ou chamando a atenção de qualquer forma; que aparentemente o veículo não estava engrenado e com os freios acionados, pela forma que trafegava antes do acidente; que não foram reparados os prejuízos do depoente; que ouviu barulho de frenagem, dos pneus da van, mas o veículo não parou...” ( Leandro de Oliveira do Amaral   -  fls. 335 );

 

“...que confirma suas declarações de fls. 21/22, ora lidas; (…); que chegou a conversar com o motoqueiro que estava atrás do veículo do declarante e este lhe contou que o acidente foi provocado por uma van, que perdeu o freio na parte de cima da Rua Goitacazes, desceu embalado atravessando a Rua São Paulo e parou dentro de uma autoescola, sendo que ainda atropelou uma moça que estava na calçada que ficou embaixo da van; que a van chegou a bater no guidão da moto, mas o motoqueiro não sofreu lesões; que na sequência veio um caminhão que para tentar desviar das pessoas caídas e da van rodou na pista e tombou; que antes de tombar o caminhão chegou a bater em um Palio; que no caminhão havia três pessoas que sofreram lesões, sendo o motorista e dois ajudantes; que na van havia dois rapazes; (…); que as pessoas comentavam que a van perdeu o freio; que a van estava carregada, mas não sabe dizer o que estava transportando; (…); que não reparou se houve marca de frenagem e se os pneus da van estavam carecas.” ( Flávio Rocha dos Santos -  fls. 346 );

 

“...que o informante estava em um veículo de carga da empresa Expresso M 2000 transportadora trafegando na Rua São Paulo quando um outro veículo de carga que descia a rua dos Goitacazes, que é uma via bastante íngreme no local, avançou desgovernadamente uma placa de pare e no cruzamento da rua dos Goitacazes com a rua São Paulo; que ao infringir a norma de trânsito de parada obrigatória, o veículo de carga conduzido pelo réu Waldemar atingiu pedestres que estavam na faixa de pedestres, sendo que duas meninas faleceram em razão do atropelamento; que o veículo conduzido por Waldemar atingiu pelo menos mais um pedestre e também o veículo conduzido pelo informante, além de outros veículos que trafegavam no local; que quando o veículo do informante foi atingido, o informante transitava regularmente na rua São Paulo onde não havia qualquer placa de pare ou semáforo para o depoente; que o veículo do informante foi atingido na lateral traseira direita; que com o choque o veículo do informante tombou, ficando com a lateral do motorista toda no chão; que o informante teve um corte no rosto e sentiu dores no braço, que não chegou a quebrar; que o informante foi conduzido para o Hospital João XXIII, onde ficou internado até o dia seguinte; ...” ( Bruno César Marçal Rodrigues -  fls. 373/374 ).

 

Além disso, o laudo pericial, às fls. 152 e 155, foi taxativo ao atestar que o sistema de freios do veículo do réu encontrava-se deficiente em razão da manutenção inadequada realizada no veículo. Acrescentou ainda, que o uso de pastilhas velhas com discos novos, diminui a superfície de contato entre eles, causando a ineficiência do freio:

 

“...VISTORIA DOS ELEMENTOS DE SEGURANÇA DO VEÍCULO 01

 

Substituição recente dos discos de freio, sem a correspondente substituição das pastilhas no eixo dianteiro.

Pastilhas do eixo dianteiro apresentando superfície com atritamento irregular.

Uso de silicone para fixação das pastilhas de freio no eixo dianteiro em substituição à peça de fixação regular (mola). A referida peça encontrava-se trincada na roda do lado direito e ausente do lado esquerdo.

Freio de estacionamento inoperante. Encontrava-se sem as lonas e sapatas e com os respectivos cabos rompidos, desconectados e amarrados sob o veículo.

O uso de discos novos com pastilhas velhas diminui a eficiência dos freios, devido às irregularidades presentes na superfície da pastilha usada decorrentes do atrito contra os discos velhos. A presença de tais irregularidades diminui a área de contato entre essa pastilha e o disco substituído.

(…)

A vistoria dos sistemas de segurança desse veículo indicou que o sistema de freios encontrava-se deficiente (em decorrência de manutenção inadequada), mas não inoperante...” (Laudo Pericial do Instituto de Criminalística – Seção de Perícias de Trânsito – fls. 152 e 155).

 

Com efeito, restou demonstrado nos autos, que a conduta imprudente do acusado foi determinante para o resultado lesivo, pois não  determinou a correta manutenção do veículo, deixando de trocar peças essenciais e indispensáveis à segurança, quais sejam, as pastilhas de freio do veículo, tornando-se inconteste a responsabilidade pelo evento danoso.

 

Não bastasse, restou comprovado que o acusado trafegava acima da velocidade permitida.

 

Realizada a perícia, após a colisão, os peritos concluíram que a velocidade do veículo era incompatível para o local:

 

“...As evoluções do movimento pós-colisão bem como o montante de avarias apontam que esta unidade motora (Veículo 01) transitava em velocidade incompatível para o local onde o evento ocorreu...” (Laudo Pericial do Instituto de Criminalística – Seção de Perícias de Trânsito – fls. 155).

 

No caso, é óbvio que o veículo atingiria alta velocidade, visto que se tratava de  um declive acentuado e o freio falhou.

 

Entretanto, nesse contexto, era esperado que o acusado tomasse precauções mais eficazes na tentativa de minimizar os danos causados, tais como trafegar com a primeira marcha engatada, eis que se tratava de um declive, ou ainda, acionar a buzina e o pisca alerta para alertar pedestres e os demais condutores.

 

Além disso, sabendo que o veículo possuía péssimas condições de frenagem, optou por trafegar em alta velocidade e, caso tivesse realizado a correta manutenção do veículo e trafegasse em velocidade adequada, poderia tê-lo imobilizado e evitado o acidente, ao invés de ultrapassar a parada obrigatória, colidir com outros quatro veículos e ainda, vitimar fatalmente duas pessoas, além de lesionar outras três.

 

Neste passo, resta nítido que o acusado tinha plena consciência de que o veículo estava sem condições de ser utilizado, pois não possuía freio de estacionamento e necessitava de reformas e, portanto, assumiu o risco de utilizá-lo nestas condições, demonstrando manifesta negligência.

 

Neste sentido:

 

EMENTA: HOMICÍDIO CULPOSO - VEÍCULO EM PÉSSIMO ESTADO DE CONSERVAÇÃO - AUSÊNCIA DE FREIOS, BANCOS E SEGURANÇA - AUTORIA COMPROVADA - CONFISSÃO, PROVAS TESTEMUNHAIS E PERICIAL - NEGLIGÊNCIA - RESULTADO PREVISÍVEL - DESCUMPRIMENTO DE CUIDADO OBJETIVO - REDUÇÃO DA PENA DE SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO - PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - PROVIMENTO PARCIAL. Havendo relação de imputabilidade entre a conduta do réu e o resultado lesivo, qual seja, a morte da vítima, descumprindo este cuidado objetivo necessário manifestado por sua negligência, além do que presente a previsibilidade do resultado, a condenação é medida que se impõe. A aplicação da sanção de suspensão da habilitação deve ser proporcional à pena privativa de liberdade estabelecida na sentença, cabendo a redução daquela, quando fixada além do mínimo legal, quando este foi o patamar da sanção corporal. ( Nº 1.0134.02.031899-1/001(1). Relator: Pedro Vergara. Data de Julgamento : 18.12.2006. Data de Publicação: 02.02.2007)”.

 

Desta feita, permite-se concluir que o  acusado agiu com negligência e imprudência, eis que tinha conhecimento da deficiência nos freios de seu veículo e preferiu se abster de realizar a manutenção adequada.

 

No mesmo passo, restou configurada a agravante prevista no art. 302, Parágrafo Único, inciso II, do CTB, eis que restou comprovado nos autos que as vítimas estavam na faixa de pedestres quando foram atingidas.

 

A vítima Cacilene confirmou que estava iniciando sua travessia, na faixa de pedestres, quando foi atingida pelo veículo do réu:

 

“...que confirma o depoimento de fls. 36 verso; que estava iniciando a travessia sob a faixa de pedestre, tinha dado um passo quando foi atingida; que sua cunhada a e sua amiga estavam um pouco a sua frente, sob a faixa de pedestre; que segundo se recorda, não há no local semáforo para pedestres; ...” (Cacilene Pereira Lima – fls. 333).

 

Destaque-se que as testemunhas Renato, Carlos e Robson, não presenciaram os acontecimentos e em nada contribuíram para a elucidação dos fatos. Estes, restringiram-se apenas a tecerem informações quanto à conduta social e personalidade do acusado Waldemar.

 

Registre-se ainda que não merece acolhimento a alegação da defesa, de que os crimes praticados pelo réu configuram crime continuado, tipificado no art. 71 do código penal, pois a dinâmica dos fatos narrados não preenchem os requisitos para o reconhecimento dessa espécie de crime:

 

“Art. 71 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.”

 

No caso, aplicam-se as regras do concurso formal, como requerido pela acusação, pois uma ação do réu gerou resultados distintos, ou seja, o réu na direção do veículo causou duas mortes e, ainda, lesão corporal em três vítimas, devendo ser aplicada a pena cominada ao art. 302, Parágrafo Único, inciso II do Código de Trânsito, acrescida de 1/6 ( um sexto ) até ½ (metade ).

 

Portanto, comprovadas a autoria, a materialidade e a tipicidade, em parte, como deseja a acusação, e não incidindo, no caso, nenhuma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, a condenação do réu se impõe, nos termos art. 302, parágrafo único, inciso II (por duas vezes) e art. 303, Parágrafo Único (por três vezes), ambos da Lei 9.503/97.

 

Ante o exposto, julgo procedente, em parte, o pedido formulado na denúncia, absolvo o acusado ALEXSON FIGUEIREDO SILVA nos termos do art. 386, IV, do Código de Processo Penal e condeno o réu WALDEMAR DE MOURA SILVA, como incurso no art. 302, Parágrafo Único, inciso II (por duas vezes) e art. 303, Parágrafo Único (por três vezes), ambos da Lei 9.503/97, na forma do art. 70 do Código Penal passando à análise das circunstâncias judiciais, rumo à aplicação da pena, com relação à pena mais grave cabível.

 

1) Quanto ao delito previsto no art. 302, parágrafo único, incisos II da Lei 9503/97 em relação à vítima Joelma Gonzaga:

 

Culpabilidade acentuada, diante das precárias condições visíveis do veículo. Sem antecedentes, conforme certidão de fls. 231. A conduta social e a personalidade são favoráveis, conforme depoimentos testemunhais. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

 

Nestes termos, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de detenção e, diante da aplicação da pena no mínimo legal, não incide a circunstância atenuante da confissão espontânea, nos termos da Súmula 231 do STJ, inexistem circunstâncias agravantes, aplica-se a causa especial de aumento prevista no inciso II do Parágrafo Único, do art. 302 do CTB, majoro sua pena em um terço, ou seja, 08 ( oito ) meses de detenção, passando-a para 02 ( dois ) anos e 08 ( oito ) meses de detenção, que concretizo como definitiva, posto que inexistem causas especiais de diminuição.

 

2) Quanto ao delito previsto no art. 302, parágrafo único, incisos II da Lei 9503/97 em relação à vítima Joelma Silva:

 

Culpabilidade acentuada, diante das precárias condições visíveis do veículo. Sem antecedentes, conforme certidão de fls. 231. A conduta social e a personalidade são favoráveis, conforme depoimentos testemunhais. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

 

Nestes termos, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de detenção e, diante da aplicação da pena no mínimo legal, não incide a circunstância atenuante da confissão espontânea, nos termos da Súmula 231 do STJ, inexistem circunstâncias agravantes, aplica-se a causa especial de aumento prevista no inciso II do Parágrafo Único, do art. 302 do CTB, majoro sua pena em um terço, ou seja, 08 ( oito ) meses de detenção, passando-a para 02 ( dois ) anos e 08 ( oito ) meses de detenção, que concretizo como definitiva, posto que inexistem causas especiais de diminuição. 

 

3) Quanto ao delito previsto no art. 303, parágrafo único, da Lei 9503/97 em relação à vítima Cacilene Pereira Lima:

 

Culpabilidade acentuada, diante das precárias condições visíveis do veículo. Sem antecedentes, conforme certidão de fls. 231. A conduta social e a personalidade são favoráveis, conforme depoimentos testemunhais. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

 

Assim, fixo-lhe a pena base em 06 (seis) meses de detenção e, diante da aplicação da pena no mínimo legal, não incide a circunstância atenuante da confissão espontânea, nos termos da Súmula 231 do STJ, inexistem circunstâncias agravantes, aplica-se a causa especial de aumento prevista no inciso II do Parágrafo Único, do art. 302 do CTB, majoro sua pena em um terço, ou seja, 02 ( dois ) meses de detenção, passando-a para 08 ( oito ) meses de detenção, que concretizo como definitiva, posto que inexistem causas especiais de diminuição.

 

4) Quanto ao delito previsto no art. 303, da Lei 9503/97 em relação à vítima Bruno César Marçal Rodrigues:

 

Culpabilidade acentuada, diante das precárias condições visíveis do veículo. Sem antecedentes, conforme certidão de fls. 231. A conduta social e a personalidade são favoráveis, conforme depoimentos testemunhais. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

 

Assim, fixo-lhe a pena base em 06 (seis) meses de detenção, que concretizo como definitiva, e, diante da aplicação da pena no mínimo legal, não incide a circunstância atenuante da confissão espontânea, nos termos da Súmula 231 do STJ, inexistem circunstâncias agravantes e outras causas especiais de aumento ou diminuição.

 

5) Quanto ao delito previsto no art. 303, da Lei 9503/97 em relação à vítima Márcio da Conceição Henrique:

 

Culpabilidade acentuada, diante das precárias condições visíveis do veículo. Sem antecedentes, conforme certidão de fls. 231. A conduta social e a personalidade são favoráveis, conforme depoimentos testemunhais. Os motivos e consequências do crime emolduram-se dentro dos limites estabelecidos pelo tipo penal.

 

Assim, fixo-lhe a pena base em 06 (seis) meses de detenção, que concretizo como definitiva, e, diante da aplicação da pena no mínimo legal, não incide a circunstância atenuante da confissão espontânea, nos termos da Súmula 231 do STJ, inexistem circunstâncias agravantes e outras causas especiais de aumento ou diminuição.

 

3) CONCURSO FORMAL:

 

Por fim, diante do reconhecimento do concurso formal (art. 70 do C.P.), majoro em 1/2 (metade), a mais grave das penas aplicadas, passando-a para  ( quatro ) anos de detenção, que concretizo como definitiva.

 

Suspendo a habilitação do acusado para dirigir veículo automotor pelo período de 04 (quatro) meses, nos termos dos arts. 292 c/c 293 da Lei 9503/97.

 

Fixo o regime aberto para cumprimento da pena.

 

Defiro a substituição da pena privativa de liberdade, nos termos do art. 44 do Código Penal, por duas restritivas de direitos, ou seja, prestação de serviços à comunidade, por igual período da condenação, e prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo, em instituições a serem designadas pelo Juízo da Execução.

 

Condeno o réu ao pagamento de ½ (metade) das custas processuais.

 

Suspendo os direitos políticos do réu Waldemar de Moura Silva, nos termos do art. 15, III, do CF/88. 

 

Transitada em julgado, expeça-se guia de execução, oficie-se ao T.R.E. e ao DETRAN, para providencias, nos termos do art. 293, § 1.º da Lei 9503/97.

 

P.R.I.

 

Belo Horizonte, 21 de outubro de 2014.

 

 

Kenea Márcia Damato de Moura Gomes

Juíza de Direito