Proc. nº.: 37-5

Autor : Ministério Público

R.M.P. : Dr. Alysson Cardozo Cembranel

Réu : Daniela Cristina dos Santos

Adv. : Dr. Aluísio Bento

Feito : Pronúncia

 

 

 

 

D e c i s ã o d e P r o n ú n c i a

 

 

Vistos etc.

 

A Representante do Ministério Público em exercício nesta comarca, Dr. Alysson Cardozo Cembranel, ofereceu DENÚNCIA contra Daniela Cristina dos Santos, ambos já devidamente qualificados nos autos, alegando, para tanto, em síntese, que no dia 02 de dezembro de 2015, por volta das 17 horas e 43 minutos, na Rua Maria Magesty Vieira, n. 536, bairro Cidade Satélite, Juatuba-MG, a denunciada teria ceifado a vida de seu filho de seis anos de idade Isaque Gonçalves Aquino dos Santos, mediante asfixia.

 

Segundo narra a denúncia:

 

“[...]no dia fatídico, por volta das 11 horas da manhã, a denunciada se aproximou de seu filho, portador de autismo, imobilizou-lhe e segurando-lhe pela boca e nariz, tentou impedir sua respiração, sem êxito no primeiro momento. Não satisfeita, algumas horas depois, a denunciada novamente segurou Isaque e o asfixiou, vindo ele a falecer” (fl. 1).

 

Foi assim a ré denunciada como incursa nas sanções do art. 121, § 2º, II, do Código Penal e art. 121, § 2º, inciso III c/c art. 61, inciso II, alíneas “e” e “h”, ambos do Código Penal.

 

Feita representação em desfavor da acusada foi decretada a prisão preventiva desta, conforme decisão em apenso.

 

A denúncia foi recebida em 22 de fevereiro de 2016, fl. 96, sendo citada, apresentando defesa prévia, fl. 112 usque 114, onde o ilustre advogado da ré, Dr. Aluísio Bento, onde pugna pela realização de exame de sanidade e arrola testemunhas.

Realizado o incidente de sanidade, foi afirmado pelos peritos que a denunciada é plenamente capaz de entender os fatos e se determinar de acordo com esta compreensão, fl., 116 usque 124.

 

No curso da instrução criminal foram ouvidas 3 testemunhas e interrogada a acusada, fl. 160 usque 164.

 

A seguir apresentaram as partes suas alegações finais, tendo o Ministério Público pleiteado a pronúncia da ré e o defensor desta pede, em sua alentada e judiciosa peça, a impronúncia.

 

É este, em síntese apertada, o relatório, isto é, a história relevante do processo na clássica afirmação do provecto Pontes de Miranda.

 

Não vislumbro até este momento a presença de qualquer vício ou nulidade exigente de sanação, não tendo sido levantada qualquer preliminar, pelo que passo a apreciar a pretensão do Estado em ver o caso em comento submetido a julgamento pelo Egrégio Tribunal do Júri, cabendo examinar se de fato houve um crime, se este crime é doloso contra a vida e se a autora é a acusada.

Conforme assinalado em jurisprudência remansosa, tenho por norma que a decisão de pronúncia deva ser sucinta, evitando, desta forma, influenciar na decisão do Colendo Conselho de sentença constitucionalmente competente para decidir a respeito da acusação de crimes dolosos contra a vida.

 

É possível colacionar neste sentido o seguinte julgado:

 

Extravasa de sua competência o juiz que ao prolatar o despacho de pronúncia, aprecia com profundidade o mérito, perdendo-se em estudo comparativo das provas colhidas, repudiando uma e, com veemência, valorizando outras, exercendo atribuição própria dos jurados“ (RT 521/439).

 

 

A Doutrina também é uníssona neste sentido:

 

O Juiz, porém, está obrigado a dar os motivos de seu convencimento, apreciando a prova existente nos autos, embora não deva valorá-los subjetivamente. Cumpre-lhe limitar-se única e tão-somente, em termos sóbrios e comedidos, a apontar a prova do crime e os indícios da autoria, para não exercer influência no ânimo dos jurados, que serão os competentes para o exame aprofundado da matéria. Isso não o dispensa, porém, de enfrentar e apreciar as teses apresentadas pela defesa, sob pena de nulidade“ (Mirabete – Código de Processo Penal Interpretado, 2ª edição – p. 481).

 

Guardado este conceito em benefício da perfunctória análise do conjunto probatório, passo a fundamentar os motivos que conduzem, neste caso, à admissibilidade do jus accusationis.

A doutrina ao comentar a respeito da decisão de pronúncia, salientam os seguintes elementos:

 

A) prova concreta da existência da infração penal;

 

B) indícios suficientes da autoria;

 

C) adequação da infração à competência constitucional do julgamento pelo Tribunal Popular, vale dizer, cuidar a espécie de crime doloso contra a vida.

 

No que tange ao item sub “a” teve oportunidade de salientar Edgard de Moura Bittencourt que, neste aspecto:

 

Nenhuma distinção estabeleceram as leis entre a sentença do sumário e a do plenário. Para que qualquer delas possa ser regularmente proferida no sentido de revelar em positiva demonstração, como que, ressurgindo da prova em manifestação perfeita, completa e irrecusável“.

 

 

Analisando tal questão no que tange ao caso vertente, vê-se que foi juntado aos autos o exame de corpo de delito, relatório de necropsia de n. 2015-027-002933-024-004436553-29, sendo que na parte conclusiva consta o seguinte:

 

 

Houve morte? Sim.

 

 

Por seu turno, Bento de Faria lecionava quanto ao ítem sub “b” que:

 

Para a autoria basta que o juiz, apreciando o valor dos elementos probatórios existentes nos autos, se convença da ocorrência de indícios. A freqüentes naufrágios se arriscaria a justiça, se a lei fizesse depender da convicção, quer dizer, de prova plena, o ato provisório da pronúncia. O concurso de indícios constitui uma suspeita jurídica que, ainda quando não legitima a segurança da imputação se apresenta com razão legítima para pronunciar o denunciado“.

 

 

Nestes termos e atento, volto a repetir, ao argumento da convicção parcial, de se trazer a colação o interrogatória da acusada:

 

2) Perguntado se são verdadeiros os fatos descritos na denúncia? R: Sim, sendo que assim agiu porque a interroganda diz ter determinado quanto tempo seu filho iria viver; que esclarece que matou seu filho porque quis, não sabendo explicar porque agiu desta forma”, fl. 164”

 

Nestes moldes, permissa venia, frente a prova produzida, deve a questão, ao meu sentir, ser levada à consideração do Egrégio Conselho de Sentença, com competência constitucional para o julgamento do caso.

 

Quanto a qualificadora de uso de asfixia, mais uma vez conveniente se torna trazer a colação a perícia e o interrogatório:

 

 

“As lesões externas observadas no corpo da criança são indicativas de que a mesma tenha sofrido asfixia por sufocação direta, fl. 87.

 

 

 

que deitou-se sobre o corpo do seu filho e tapou a boca e o nariz dele com as mãos”, fl. 164v.”

 

 

 

Além disto, conforme sedimentado pela jurisprudência de nossos tribunais, conforme revela a seguinte ementa:

 

As qualificadoras capituladas na denúncia não devem ser excluídas da pronúncia, quando não as repila, de forma manifesta e declarada, a prova constante do inquérito e da instrução criminal” (RT 532/340).

 

Quanto a tese de anormalidade mental no momento da conduta, não sendo o ilustre advogado e nem este magistrado expert no assunto, de se acatar o laudo pericial. Não há que se falar em invalidade de laudo pericial que se apresenta tecnicamente íntegro, produzido em regular incidente de insanidade mental, tendo respondido a todos os quesitos formulados pelas partes.

 

Revela-se bem difícil distinguir a linha divisória entre a normalidade e a anormalidade psíquica, sendo bastante comum que atos de egoísmo inconfessáveis seja transformado em um ato teatral em episódio de suposta insanidade mental.

 

Ante o exposto e de tudo mais que dos autos consta, julgo admissível o jus accusationis e, por consequência, ao teor do art. 408 do Código de Processo Penal, P R O N U N C I O a ré Daniela Cristina dos Santos para ser julgado pelo Egrégio Tribunal do Júri da Comarca de Mateus Leme, como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inciso III, c/c artigo 61, inciso II, alíneas “e” e “h” do Código Penal.

 

P.R.I.

 

Mateus Leme, 24 de outubro de 2016.

 

 

  1. Eudas Botelho

Juiz de Direito