Autos nº: 0024.12.083.068-2
Requerente: Maria Eduarda Alves Sobrinho Mendonça, representada por sua mãe Cleusa Alves Sobrinho Mendonça
Requerida: Instituto de Educação Arca de Noé LTDA
Espécie: Ação de Danos Morais
SENTENÇA
I – RELATÓRIO
Vistos e examinados.
Maria Eduarda Alves Sobrinho de Mendonça, menor representada por sua genitora Cleusa Alves Sobrinho Mendonça, ambas qualificadas nos autos, aforou a presente Ação de Danos Morais em face do Instituto de Educação Arca de Noé LTDA, igualmente qualificado, alegando, em síntese, que foi matriculada na escola ré no segundo semestre de 2010, e durante o período em que lá estudou foi vítima de inúmeros atos de discriminação e preconceitos por seus funcionários.
Alegou a autora, que é portadora de má formação congênita, chamada de síndrome do pé torto, o que lhe causa fraqueza muscular e atraso no desenvolvimento da linguagem e fala.
Afirmou, que o réu exigiu que o comparecimento diário na instituição escolar deveria ser munido de cinco fraudas descartáveis e três “trocas” de roupas, o que sustenta ser absurdo diante do fato de estar matriculada apenas em meio período do dia. Segundo a autora, o réu também exigiu que a sua permanência em suas dependências se fizesse integralmente acompanhada por sua genitora.
Aduziu, que tais fatos causaram-lhe muitos constrangimentos e tristezas durante o período em que frequentou o Instituto réu, como prova a cópia de sua agenda escolar.
Afirmou, que sua genitora sofreu várias pressões veladas para que fosse retirada da instituição ré e matriculada em uma UMEI, o que culminou com a sua mudança de escola.
Com a inicial vieram os documentos de fls. 14-54.
Concessão dos benefícios da justiça gratuita à autora – fl. 55.
Citado, o réu apresentou contestação às fls. 80/85, aduzindo, em síntese que não houve atos discriminatórios e de preconceitos por parte de seus funcionários e, tampouco, a genitora da autora foi pressionada para retirar esta da escola.
Impugnação à contestação (fls. 99/101).
Oportunizada a especificação de provas pelas partes, ambas requereram a oitiva de testemunhas, sendo que a parte autora pugnou, também, pela colheita do depoimento pessoal do representante legal do réu (folha 103) e juntada dos documentos de fls. 105/108, sobre os quais este se manifestou à fl. 110.
Manifestação do Ministério Público (fl. 116).
Despacho saneador à fl. 117.
Audiência de Instrução e Julgamento realizada às fls. 181/182, na qual foi ouvida uma testemunha da autora.
Alegações finais apresentadas pela autora às fls. 184/186, e pela ré às fls. 187/189.
Parecer final do Ministério público às 190/195.
Em seguida vieram os autos conclusos para a sentença.
É o relatório. Passo a decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Maria Eduarda Alves Sobrinho de Mendonça, menor impúbere, representada por sua genitora Cleusa Alves Sobrinho Mendonça, em face do Instituto de Educação Arca de Noé LTDA, através da qual busca a autora uma indenização por danos morais, que esta alega ter sofrido em decorrência de inúmeros atos de discriminação e preconceitos praticados por funcionários da instituição ré, no período em que lá permaneceu matriculada.
O Código Civil Brasileiro, prevê, em seu artigo 927, a possibilidade de reparação do dano em virtude da prática de ato ilícito. Senão, vejamos:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos, especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
O parágrafo único do dispositivo legal supra está justamente inserido de forma a representar o Código de Defesa do Consumidor, em sua previsão legal, ao mencionar que o causador do dano deve reparar a lesão independentemente de culpa, nos casos previstos em lei.
Ao contrário do que exige a lei civil, quando reclama a necessidade da prova da culpa, na relação entre consumidores esta prova é plenamente descartada, sendo suficiente a existência do dano efetivo ao ofendido.
Nesse mesmo sentido, a redação do art. 14 do CDC, a qual estabelece que “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
Por outro lado, foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), em cujo artigo 1º, destinou-se a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.
Em seu art. 28, § 1º, a citada Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) incumbe às instituições privadas o dever de assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar o sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, mediante a adoção de medidas, planos e projetos educacionais especializados, que atendam às características do estudante portador de deficiência, e disponibilização de professores e profissionais de apoio para tanto, vedada a cobrança de valores adicionais de qualquer natureza em suas mensalidades, anuidades e matrículas em decorrência.
No caso em questão, verifico, que não obstante ter havido a oitiva de uma única testemunha em juízo, que asseverou que a autora se desenvolveu quando de sua transferência para a UMEI, sob o argumento de que esta possui melhores condições para atender às suas necessidades, o dano moral perpetrado pela ré é nítido, visto que, muito embora a menor tivesse necessidades especiais ao tempo da ocorrência do dano, a instituição de ensino não poderia ter se negado a uma prestação educacional para ela, especialmente diante da previsão contida no art. 227, da CF/88, que garante à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade e a salvo de qualquer discriminação, o direito à educação. Tal prerrogativa encontra-se igualmente inserida, de forma expressa, no Estatuto da Criança e do Adolescente, em seus artigos 4º e 5º.
Mesmo possuindo a escola ré dificuldades para o atendimento às necessidades da autora, ela não poderia escusar-se de suas responsabilidades utilizando-se reiteradamente como tese argumentativa a ausência de condições para manter a infante pertencendo ao grupo escolar, pois tal conduta acarretou na exclusão desta. Nesse sentido, os diversos recados deixados pela ré na agenda escolar da autora não deixam dúvidas acerca da insistência da primeira em convencer esta, de que tal instituição não estava apta a atender as suas necessidades especiais, o que melhor se adequaria a uma UMEI (Unidade Municipal de Ensino Infantil).
Destarte, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais causados à autora é medida que se impõe.
III – DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido aforado pela menor Maria Eduarda Alves Sobrinho Mendonça em face de Instituto Arca de Noé LTDA, resolvendo-se, assim, o mérito em conformidade com o disposto no art. 487, I do Novo Código de Processo Civil para condenar o réu ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, que deverá ser devidamente atualizada pelos índices da CGJ do TJMG e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar da data da sentença.
Em virtude da sucumbência, condeno o réu a arcar, ainda, com o pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação, em observância ao disposto no art. 85, §2º, do NCPC.
Publicar.
Registrar.
Intimar.
Cientificar o Ministério Público.
Certificar.
Belo Horizonte, 05 de junho de 2.017.
Joaquim Morais Júnior
Juiz de Direito (em cooperação)