24ª VARA CÍVEL – COMARCA DE BELO HORIZONTE/MG
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS
Processo nº 0024.12.348.860-3
Autores: ANA CAROLINA GOULART REZENDE BAETA e RODRIGO DA SILVA BAETA.
Rés: PLUNA LINEAS AEREAS URUGUAYAS S.A e DECOLAR.COM LTDA.
SENTENÇA
Vistos, etc...
ANA CAROLINA GOULART REZENDE BAETA e RODRIGO DA SILVA BAETA, devidamente qualificados e por meio de advogado regularmente constituído, ajuizaram a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS em face de PLUNA LINEAS AEREAS URUGUAYAS S.A e DECOLAR.COM LTDA, também qualificadas, objetivando a condenação solidária das rés, para pagarem o importe de R$ 2.894,00 a título de indenização por danos materiais, além de indenização por danos morais, com valor não inferior a 50 vezes o salário mínimo para cada um dos autores. Requereram, ainda, os benefícios da justiça gratuita. (fls. 02/07).
Alegam os autores que “celebraram contrato de prestação de serviços de transporte aéreo com a ré. Embarcariam para Montevideu, no Uruguai, na quinta-feira, dia 06/07/2012 no Aeroporto Internacional Tancredo Neves em Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte”; que “ao chegarem ao saguão do aeroporto, dirigiram-se para o balcão da ré para despachar suas bagagens, quando perceberam cerca de 100 pessoas agitadas, revoltadas com a notícia do cancelamento do Vôo”; que “os funcionários da ré chegaram a mentir, afirmando que o vôo havido sido cancelado porque estavam em greve. Mas pressionados confirmaram que a companhia aérea havido encerrado suas atividades”; que “os autores compraram as passagens aéreas por intermédio da agência de turismo Decolar.com, que continuava a vender, pelo site, pacotes de viagens pela Pluna.”, que “pagaram pelos bilhetes (código de compra gerado pela Decolar 13619313) R$ 2.594,00 (dois mil, quinhentos e noventa e quatro reais)” e que “ao arrepio do que foi contratado, em nada cumpriu a ré. Diante do ocorrido pode-se constatar que não se trata de um mero dissabor, mas sim de um completo desrespeito a qualquer cidadão”.
Com a inicial vieram os documentos de fls. 08/21.
Decisão à f. 23 deferindo o pedido de justiça gratuita.
Cartas de citação às fls. 25 e 35, com AR às fls. 29 e 82.
A segunda ré, Decolar.com Ltda., apresentou contestação às fls. 36/52, arguindo preliminarmente a ilegitimidade passiva da requerida e aduzindo quanto ao mérito que “a Requerida é mera intermediária da relação jurídica entre os Requerentes e a companhia aérea Pluna. E por parte dos Requerentes não houve nenhuma insurgência quanto a diligente mediação realizada pela Requerida. Diligente porque a Requerida aproximou os interesses escolhidos pelos Requerentes quanto aos bilhetes junto à companhia aérea Pluna”; que “a finalidade da Requerida foi alcançada, na medida em que aproximou os interesses dos Requerentes com a companhia aérea Pluna, conforme artigo 722 e seguintes do Código Civil”; que “a companhia aérea decretou falência sem avisar previamente quaisquer agências de turismo, não aceitando reacomodação para outras companhias ou tomando quaisquer outras providências”; que “todos os valores pagos pelas passagens aéreas foram cobrados e recebidos pela companhia aérea Pluna, sem qualquer participação da Requerida nesta fase. A atividade da Requerida encerrou-se logo após a emissão do e-ticket.”; que “não há que se falar em ato ilícito praticado pela Requerida, na medida em que esta não exerceu qualquer ato de gerência que pudesse evitar ou contribuir para a falência da companhia aérea Pluna”; e que “antes da finalização da compra, foram informados e consentiram que quaisquer cobranças seriam realizadas diretamente pela companhia aérea, bem como que seriam aplicadas as políticas estipuladas por ela”.
Com a contestação vieram os documentos de fls. 53/75.
A primeira ré, Pluna Lineas Aereas Uruguayas S.A, deixou transcorrer seu prazo legal de defesa sem apresentar qualquer manifestação, conforme certidão de fls. 76.
Os autores impugnaram a contestação às fls. 77/80, requerendo a aplicação de pena de confissão da primeira ré e alegando que a segunda ré é legítima para figurar no polo passivo da ação e que não há que se falar em excludente de responsabilidade por culpa exclusiva de terceiro.
Em provas, as partes se manifestaram às fls. 83 e 86.
Em audiência (f. 88), não logrou êxito a conciliação, ocasião em que foi requerido o julgamento antecipado antecipado da lide.
Em alegações finais, as partes se manifestaram às fls. 92/94 e 96.
É o relatório. DECIDO.
Trata-se de AÇÃO INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada por ANA CAROLINA GOULART REZENDE BAETA e RODRIGO DA SILVA BAETA em desfavor de PLUNA LINEAS AEREAS URUGUAYAS S.A e DECOLAR.COM, objetivando a condenação solidária das rés, para pagarem o importe de R$ 2.894,00 a título de indenização por danos materiais, além de indenização por danos morais, com valor não inferior a 50 vezes o salário mínimo para cada um dos autores.
A princípio, cumpre-me observar que a primeira ré foi citada (fls. 29) e deixou transcorrer in albis o prazo, sem que apresentasse contestação, consoante certidão às fls. 76. Salienta-se que, embora a pesquisa ao sistema da Receita Federal pelo CNPJ da primeira ré tenha resultado em endereço diverso daquele constante no AR, o site oficial da ANAC informa que o endereço da Ré é aquele apontado na inicial, bem como aquele para qual o AR foi enviado.
E, nesse caso, decorrido o prazo para defesa sem qualquer manifestação da primeira ré, deve ser decretada a revelia, reputando-se verdadeiros, os fatos afirmados pela autora, conforme estabelece o art. 319 do CPC.
Todavia, convém ressaltar que a revelia é o efeito da falta de contestação do réu, em que se presumem como verdadeiros os fatos alegados pelo autor, desde que se trate de direito disponível, como é o caso dos autos. No entanto “o efeito da revelia não induz procedência do pedido e nem afasta o exame de circunstâncias capazes de qualificar os fatos fictamente comprovados” (RSTJ 53/335).
Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela segunda ré, Decolar.com, sob alegação de que “é parte ilegítima para figurar no polo passivo desta demanda, na medida em que sua relação jurídico-negocial com os Requerentes encerrou-se quando da efetivação da compra do serviço oferecido pela companhia aérea”, desafia rejeição, visto que na referida negociação, a segunda ré atuou como prestadora de serviço, pois auxiliou na realização da compra e venda das passagens eletronicamente, intermediando o negócio jurídico. Ademais, o art. 7º, parágrafo único, do CDC autoriza o consumidor a buscar a reparação por danos do produto ou serviço de todos aqueles que deram causa, porquanto os causadores respondem solidariamente. Além disso, a empresa que mantém site para intermediar venda pela internet responde pelos danos suportados pelos usuários que confiaram nas informações prestadas., consoante o entendimento do nosso TJMG, verbis:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. COMPRA E VENDA PELA INTERNET. EMPRESA MANTENEDORA DO SITE ELETRÔNICO DE INTERMEDIAÇÃO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. RESPONSABILIDADE. DANOS MATERIAIS DEVIDOS. DANOS MORAIS. MEROS ABORRECIMENTOS.
- A empresa, que mantém site para intermediar venda pela internet responde pelos danos suportados pelos usuários que confiaram nas informações prestadas.
- O descumprimento contratual, por si só, não enseja danos morais, pois não se evidencia lesão à personalidade, mas meros aborrecimentos inerentes às relações contratuais cotidianas. (TJMG – Ap. Cível 1.0024.10.249729-4/001, Des. Marco Aurelio Ferenzini, j. 05/11/2013 – grifei)
Logo, patente é a legitimidade da segunda ré, Decolar.com Ltda., para figurar no polo passivo da presente ação indenizatória.
Ultrapassada a questão preliminar, passo à análise do mérito.
Pretendem os autores indenização por danos materiais no valor de R$ 2.894,00, em razão do pagamento das passagens aéreas, e indenização por danos morais com valor não inferior a 50 vezes o salário mínimo, tendo em vista as empresas não prestaram os serviços contratados da forma que deveriam, gerando aborrecimentos e frustrações às partes.
De fato, em análise aos documentos juntados aos autos, quais sejam o comprovante de solicitação de compra de fls. 14 e comprovante de pagamento de fls. 17, é inquestionável que os serviços foram prestados de forma defeituosa e inadequada, haja vista que, muito embora os autores tenham adquirido da segunda ré Decolar.com Ltda. duas passagens aéreas (ida e volta) para Montevidéu/Uruguai, somente foram informados do cancelamento das atividades da primeira ré Pluna Lineas Aereas Uruguayas S.A no momento em que se encontravam no aeroporto, na ocasião do embarque.
Ressalta-se que não houve comunicação prévia do encerramento das atividades da primeira ré pela segunda ré, sendo que esta somente enviou comunicado oficial aos autores em 11/07/2012, conforme documento de fls. 18, e informativo sobre o reembolso das passagens em 29/08/2012, consoante documento de fls. 19, ambos em data posterior à da realização da viagem, que seria em 06/07/2012. (fls. 14)
Assim, por se tratar de inegável relação de consumo, visto que as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor, previstos nos art. 2º e 3º do CDC, aplicam-se as normas consumeristas ao presente feito.
Neste contexto, o art. 14 do CDC, reconhece a responsabilidade objetiva do prestador de serviços e prevê o dever de reparar os danos causados aos consumidores, por falhas relativas ao fornecimento desses serviços, independentemente de comprovação de culpa, exigindo apenas a prova do dano e o nexo causal com o serviço defeituoso.
Deste modo não se aplica, à espécie, a excludente de responsabilidade prevista no art. 14, §3º, II, do CDC, como alegado na contestação, visto que a culpa pelo evento danoso foi da segunda ré que poderia ter evitado os prejuízos causados aos autores se tivesse oferecido outra companhia aérea para realizar o transporte ou se tivesse avisado previamente sobre o cancelamento das atividades da primeira ré.
Nesse diapasão, considerando que restou comprovada a falha na prestação de serviço, impõe-se a procedência do pleito indenizatório, não só por dano material, no valor de R$ 2.894,00 pelo ressarcimento do valor despendido com as passagens, demonstrado pelo documento de fls. 14, como também por dano moral, eis que o cancelamento de vôo extrapola os limites do mero aborrecimento, ocasionando transtorno, indignação e angústia aos autores que ficaram frustrados com a não realização da viagem programada.
A esse respeito, já decidiu o nosso Tribunal de Justiça, verbis:
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VÔO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. I - O cancelamento de vôo sem causa justificada e sem comunicação, em tempo hábil, aos consumidores, configura defeito na prestação de serviço, devendo a empresa indenizar os passageiros pelos danos morais suportados, à luz da "teoria da responsabilidade civil objetiva". II - Extrapola os limites do mero aborrecimento o descumprimento do contrato de transporte aéreo de passageiros, em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos ocasionados pela frustração da expectativa em relação ao serviço contratado, configurando dano moral. (TJMG – Ap. Civel 1.0024.13.116168-9/001, Rel. Des. João Cancio, j. 12/08/2014 – grifei).
No caso dos autos, o valor da indenização por dano moral será fixado, levando-se em conta a razoabilidade e proporcionalidade, prudência e equidade, com o intuito de desestimular o causador do dano e compensar a vítima pela ofensa suportada.
Sobre a matéria, trago a colação os ensinamentos do ilustre professor LEONARDO DE ARAÚJO FERRAZ:
“(...) se de um lado o subprincípio da adequação é um elemento de mensuração da compatibilidade do meio com o fim, a proporcionalidade em sentido estrito afere a conformidade ou correspondência entre a medida adotada e o fim almejado, em um processo de sintonia fina, entendido por Barros (2003), como uma exigência equânime dos ônus ou por Rezek Neto (2004) como o ‘princípio da justa medida’” (Princípio da Proporcionalidade, Ed. Dictum, Belo Horizonte, 2009, p. 94).
Assim, com os parâmetros acima mencionados, arbitro a indenização por dano moral em R$ 10.000,00 (dez mil reais), por entender que o referido valor não representa fonte de enriquecimento nem, tampouco, é quantia inexpressiva, a impedir a compensação do sofrimento provocado pela ofensa.
POSTO ISTO, e de tudo o mais que dos autos consta, julgo procedentes os pedidos formulados por ANA CAROLINA GOULART REZENDE BAETA e RODRIGO DA SILVA BAETA na presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada em desfavor de PLUNA LINEAS AEREAS URUGUAYAS S.A e DECOLAR.COM para condenar as rés a pagarem aos autores a título de danos materiais o valor de R$ 2.594,00, a ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir do desembolso (fls.14) e acrescido dos juros de 1% ao mês, a partir da citação, bem como indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada um dos autores, corrigidos monetariamente pelo INPC a contar desta data e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da publicação desta decisão, até a data do efetivo pagamento, na forma da lei.
Condeno, ainda, as rés no pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação.
P.R.I.
Belo Horizonte, 28 de outubro de 2014.
YEDA MONTEIRO ATHIAS
Juíza de Direito