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CONCLUSÃO
Promovo os presentes autos conclusos ao MM. Juiz da 4ª de Fazenda Pública Municipal RENATO LUÍS DRESCH.
Belo Horizonte, 07 de novembro de 2013.
ESCRIVÃ JUDICIAL
Numeração única: 3356881-07.2013 - Alvará
Vistos.
Trata-se de pedido de Alvará Judicial ajuizado pela CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, representada por seu Presidente José Américo, por solicitação da Comissão da Verdade Vladimir Herzog, instituída através da Resolução nº 02, de 06 de março de 2013, no qual requer a expedição de Alvará Judicial para autorizar a exumação, para fins de perícia técnica, das ossadas de GERALDO RIBEIRO, sepultado no cemitério da Saudade, lote 230, carneiro 01, Secção C, ao argumento de que ele era motorista do carro que conduzia o ex-Presidente da República Juscelino Kubitschek, em 22.08.1976, que se envolveu em um acidente fatal, que culminou na morte de ambos. Informa que, de acordo com a versão oficial, a causa do acidente fora a colisão entre o veículo do ex-Presidente e um ônibus da Viação Cometa. Alega sua capacidade judiciária, na medida em que o presente caso versa sobre a defesa de interesses e prerrogativas do Parlamento, reputando que trabalhar pela consolidação do regime democrático representa um dos interesses e prerrogativas primários do Poder Legislativo e que pairam muitas dúvidas sobre fatos ocorridos no período da ditadura que devem ser esclarecidos, visando assegurar a verdade histórica e a difundir a importância dos direitos humanos. Informa que após o Brasil ter sido condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, no caso Julia Gomes Lund (Guerrilha do Araguaia) contra República Federativa do Brasil, a adotar providências para a recuperação da verdade histórica, foi criada a Comissão Nacional da Verdade (Lei nº 12.528/11), com o objetivo de examinar e esclarecer as graves violações aos direitos humanos praticadas no período da ditadura militar. Afirma que, como é de conhecimento, na tarde de domingo do dia 22.8.1976 o ex-Presidente Juscelino iniciou viagem de São Paulo rumo ao Rio de Janeiro, mas, no Km 02 da rodovia Presidente Dutra, sofreu acidente fatal. Alega que, em 13.08.2013, na Comissão Vladimir Herzog, foram tomados depoimentos relativos à morte do ex-Presidente Juscelino, em que foram levantados diversos aspectos incongruentes, em especial: a) a parada do ex-Presidente, minutos antes do acidente, no então “Hotel SNI”, de propriedade de um Brigadeiro do Exército, fundador do SNI e assessor de Golbery; b) sentença de absolvição penal do motorista do ônibus da viação Cometa, com vários testemunhos negando a colisão com o veículo acidentado, enquanto a versão oficial de colisão do ônibus no carro foi mantida; c) as fotos dos corpos de Geraldo Ribeiro e do ex-Presidente não foram juntadas à perícia; d) a perícia que analisa a compatibilidade da tinta do ônibus não está assinada; e) hipótese não comprovada de projétil, definido como “prego de caixão”, no crânio de Geraldo Ribeiro; f) troca de peritos; g) depoimento do motorista do ônibus confirmando que não houve colisão com o carro, mas que, na época, foi procurado por duas pessoas que pretendiam lhe dar uma “mala de dinheiro” para confirmar que houve colisão; g) ausência de exames, tipo RX, no corpo de Geraldo Ribeiro, mas que foram realizados no corpo do ex-Presidente; h) no cemitério, o corpo de Juscelino permaneceu no chão, sob um lençol, enquanto o corpo de Geraldo foi colocado em urna fechada. Destaca trecho de depoimento e relata fato noticiado pela imprensa à época, sobre a morte de Juscelino Kubitschek e do político chileno Letelier, supostamente alvos da “Operação Condor”, sendo que a morte deste já foi comprovado se tratar de atentado e o autor intelectual do crime, o General Contreras, foi condenado. Reitera que os fatos apontam incongruência nos fatos e perícias, em especial da exumação do cadáver do motorista, em 1996, em que não houve exame no corpo de Geraldo Ribeiro e cita outros trechos de depoimentos, que entende tornarem as suspeitas muito verossímeis. Elenca os procedimentos e processos para apuração da morte de Juscelino Kubitschek. No mérito, busca autorização judicial para a exumação das ossadas de Geraldo Ribeiro, diante das suspeitas de que fora atingido por projétil e que tal fato causara o acidente que vitimou o ex-Presidente, porque atualmente há maiores condições tecnológicas para se averiguar a existência ou não de vestígio de projétil. Salienta que o efeito jurídico esperado é a obtenção de meios para efetuar a reconstrução da história, para o qual depende de autorização judicial, nos termos do art. 7º do Decreto Municipal nº 12.009/05. Requer a determinação de expedição de alvará judicial para autorizar a exumação das ossadas de Geraldo Ribeiro, visando a realização de perícia técnica para esclarecimento de dúvidas existentes acerca da causa da sua morte. Atribui à causa o valor de R$100,00 e junta documentos.
O Ministério Público se manifestou nos autos, afirmando que se trata de caso de relevo social nacional, evidenciando-se o interesse público primário, a atrair a intervenção ministerial como custos legis. Afirma que, nos termos do art. 1.105 do CPC, há que se citar o Ministério Público, bem como os demais interessados, razão pela qual entende ser de rigor a citação dos familiares de Geraldo Ribeiro. Pugna pela intimação da Câmara Municipal de São Paulo para providenciar a adequação procedimental e requer, ainda, sejam cientificadas sobre o processamento do feito tanto a Comissão Nacional da Verdade, quanto a Comissão da Verdade do Estado de Minas Gerais (fls. 339-347).
Decido
Da legitimidade ativa
A Câmara Municipal não tem personalidade jurídica, contudo tem personalidade judiciária, com capacidade processual para as demandas em que se discutem as prerrogativas funcionais do Poder Legislativo Municipal.
No caso destes autos a exumação está sendo reclamada para concluir investigação em desenvolvimento na Comissão da Verdade Vladimir Herzog.
Acolho a legitimidade ativa da Câmara Municipal de São Paulo.
Da adequação procedimental
Alvará Judicial é tipo de procedimento de jurisdição voluntária, que exige a intervenção quando, por imperativo legal, não é possível realizar o ato. Trata-se de administração pública de interesses privados.
Nos termos do Decreto Municipal nº 12.009, de 30 de março de 2005:
Art. 7º - O jazigo não poderá ser reaberto antes de decorridos os prazos do artigo anterior, salvo exumação por motivo de:
I - pedido da família do de cujus;
II - investigação policial ou determinação judicial;
III - transferência dos despojos por desativação da necrópole.
No caso destes autos, terceira pessoa, a Câmara Municipal de São Paulo, pretende exumar os restos mortais de Geraldo Ribeiro, motorista de Juscelino Kubitschek, ambos mortos em acidente na Via Dutra no Estado de São Paulo para apurar as reais causas da sua morte, porque supostamente teria havido homicídio.
A inicial não indica se há parentes conhecidos de Geraldo Ribeiro. Entretanto, como ponderou o Ministério Público, há necessidade de intervenção dos familiares e sucessores de Geraldo Ribeiro a fim de que se manifestem da pretensão deduzida nestes processo. Havendo resistência, ou falta de anuência a demanda transforma-se em jurisdição contenciosa.
Por isso, a inicial deve ser emendada para a indicação e anuência dos parentes de Geraldo Ribeiro.
Caso não haja parentes conhecidos torna-se necessária a citação de eventuais terceiros. Neste caso, a ação perde o caráter de jurisdição voluntária, porque a questão passa a ser litigiosa.
Diante do exposto determino:
A emenda da petição inicial com a indicação parentes de Geraldo Ribeiro, trazendo a sua anuência;
Caso não haja parentes conhecidos ou a falta de anuência, o procedimento deve ser adequado para jurisdição contenciosa, com a citação dos eventuais interessados;
Esclareça, ainda, a requerente o local em que será realizada a perícia.
Int.
Belo Horizonte, 13 de novembro de 2013.
Renato Luís Dresch
Juiz de Direito