COMARCA DE BELO HORIZONTE, MG
31ª VARA CÍVEL
Autos n. : 0024.14.286.650-8
Autor: Luiz Carlos Costa de Oliveira
Réu: BV Financeira
Ação: Indenização
SENTENÇA |
Vistos etc...
LUIZ CARLOS COSTA DE OLIVEIRA, qualificado nos autos, ajuizou a presente ação de indenização por danos morais c/c pedido de tutela antecipada, em face da BV FINANCEIRA, alegando, em síntese, que em 06 de agosto de 2012 recebeu um telefonema de cobrança da empresa ré, pelo qual foi informado que era devedor de uma prestação em atraso, no valor de R$583,54 (quinhentos e oitenta e três reais e cinquenta e quatro centavos), referente ao financiamento de um veículo - Corsa Sedan Classic Super 2005/2006, de placa HGH – 2347, chassi 9BGSA19X06B118876, RENAVAM 868258997, tendo o veículo sido adquirido junto à Concessionária American Car Veículos, localizada em Uberlândia/MG. Alega o autor ter entrado em contato com o banco requerido afirmando nunca ter financiado o veículo em questão, não sendo proprietário ou possuidor de referido automóvel, tendo sido orientado pelo atendente a procurar uma delegacia de polícia, registrar um B.O. e, posteriormente, redigir uma carta a próprio punho, com três assinaturas, contendo tais alegações, escanear e enviar à inspetoria do réu, juntamente com uma cópia de seu RG e CPF.
O autor alega ter adotado tal procedimento, porém, recentemente, ao se dirigir ao Cartório do 6o Ofício de Notas de Belo Horizonte, para realizar a transferência de parte de um imóvel que havia recebido de doação, recebeu a notícia de que haviam multas do referido veículo em seu nome. Ou seja, o autor alega que estão computadas em sua CNH: sete pontos, um valor de R$872,58 (oitocentos e setenta e dois reais e cinquenta e oito centavos), bem como um débito junto à Secretaria da Receita da Fazenda Estadual, que corresponde a R$2.456,43 (dois mil quatrocentos e cinquenta e seis reais e quarenta e três centavos), referente a impostos que recaem sobre o veículo. Alega ter entrado em contato com o réu e que a atendente lhe informou que havia sido constatada a fraude e que não lhe poderia esclarecer mais nada.
Requereu, liminarmente, expedição de ofício ao DETRAN para que tal órgão procedesse a exclusão do veículo de seu nome, bem como a condenação do requerido em pagamento de indenização por danos morais. Documentos juntados em fls. 14/33.
O pedido liminar foi indeferido, nos termos da decisão de fls. 39.
Devidamente citada, a ré apresentou contestação em fls. 42/52, tendo alegado a ausência de interesse de agir do autor. No mérito, sustentou, em resumo, que compareceu na filial do banco réu uma pessoa que se identificou como sendo o autor, Sr. Luiz Carlos Costa de Oliveira, portando seus documentos pessoais, sendo cópia do CPF, cópia da cédula de identidade e comprovante de residência, demonstrando sua intenção em contrair um financiamento de veículo. Alegou que após adoção das cautelas de praxe, foi concedido ao autor o aludido financiamento, não havendo, no momento da celebração do contrato, nenhum impedimento. Expôs suas razões de direito e finalizou requerendo a improcedência do pedido da autora.
O autor apresentou impugnação em fls. 59/64, na qual alegou que o réu sequer apresentou o contrato de financiamento, nem os documentos que teriam servido para instrui-lo e tampouco o extrato que comprova que não houve desconto na conta-corrente do autor.
As partes não produziram outras provas. Foi designada audiência de conciliação para o dia 15/02/2016, na qual o réu apresentou proposta de acordo a título de danos morais, no valor de R$4.800,00 (quatro mil e oitocentos reais), a qual não foi aceita pelo requerente.
Encerrada a instrução do feito.
É o relatório. Decido.
Preliminar
A preliminar sustentada pela ré se confunde com o mérito, portanto, será analisada no momento oportuno.
Entretanto, de ofício, verifico que parte da pretensão do autor não poderá ter o mérito apreciado, em razão da ilegitimidade passiva da requerida, para o cumprimento e atendimento de tais pretensões.
Com efeito, extrai-se da exordial que o autor, dentre outras questões, pretende: seja expedido ofício ao Detran/MG, comunicando que o autor não é o proprietário do veículo em questão, de modo a não mais incidir pontuação em seu prontuário, bem como, providenciado o cancelamento da pontuação e multas existentes em nome do requerente.
Ora, apenas o Estado de Minas Gerais poderia responder a estas questões. Não se pode determinar a anulação de pontos, multas ou tributos lançados em nome do requerente, em razão da existência do aludido veículo registrado em seu nome, sem que o Estado de Minas Gerais componha o polo passivo desta ação. Tal interpretação foi exposta na primeira decisão lavrada nestes autos, quando do indeferimento da liminar, mas o autor preferiu prosseguir com a ação.
Assim, em relação à pretensão acima aludida, deverá ser extinta, sem resolução do mérito.
Mérito
Trata-se de ação visando a condenação do réu em pagamento de indenização por danos materiais e morais ao autor, tendo o requerente alegado não ter celebrado negócio jurídico com o réu, de financiamento de um veículo automotor, o qual está gerando cobranças ao requerente, bem como a impossibilidade de transferência de um imóvel recebido em doação para seu nome, por causa das dívidas geradas por este veículo.
Pois bem, alegando o autor um fato negativo, qual seja, inexistência de relação jurídica a ensejar o financiamento de um veículo automotor em uma concessionária em outra cidade que não a de seu domicílio, competiria à ré demonstrar a existência de tal relação jurídica, bem como, da dívida por ela inscrita em desfavor do consumidor.
Ocorre que até a presente data o referido contrato não foi acostado aos autos, ou seja, supostamente houve financiamento de um veículo Corsa Sedan Classic Super, 2005/2006 placa (HGH-2347), em nome do autor, e a parte ré não juntou contrato desta negociação até a presente data.
Seria diligência imprescindível da parte requerida demonstrar que houve regular contratação e isto somente poderia ser feito se carreasse para os autos o respectivo instrumento. Quedando-se inerte, deve ser declarada inexistente a relação jurídica contratual entre as partes e consequentemente qualquer débito contratual gerado em desfavor do autor.
Com relação ao pedido do autor de ressarcimento por danos materiais, consistente no pagamento das multas e tributos incidentes sobre o veículo que nega ter a propriedade e que foram lançados em seu nome, razão não lhe assiste. Isto porque, o fato de inexistir prova da relação jurídica contratual entre as partes, não significa que o autor não seja o verdadeiro proprietário do automóvel em testilha. Explico: o contrato de alienação fiduciária nada mais é do que um contrato de empréstimo financeiro com a entrega pelo devedor de um bem que fica gravado com cláusula da alienação fiduciária. O fato de não haver prova do contrato de alienação fiduciária, não significa que a propriedade plena do veículo não possa pertencer ao requerente.
Vale dizer, somente em uma lide envolvendo o antigo proprietário do bem (que não é o réu) é que se poderia verificar e então decidir se o veículo deveria retornar para o nome do antigo proprietário, com todos os seus encargos, ou permanecer em nome do autor.
No tocante aos danos morais pleiteados, entendo que tais acontecimentos geram direito à indenização por dano moral. É que a simples cobrança efetivada contra o autor, referente a um contrato de alienação fiduciária de que não participou, é suficiente para lhe causar constrangimento suficiente a lhe ofender a moral.
O dano moral não encontra estimativa na lei, devendo ser arbitrado pelo Juiz, com moderação, de modo a não acarretar o enriquecimento sem causa, porém, sem desprezar a sua natureza reparadora. Com base em tais critérios, hei por bem em fixar a indenização por danos morais em R$15.000,00 (quinze mil reais).
Dispositivo
Ante o exposto, quanto ao pedido do autor de ser retirado o veículo em testilha de seu nome, bem como, excluídas de seu nome os tributos, multas e pontuações lançados em razão do automóvel em questão, julgo extinto sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil. Quanto as demais questões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido do autor, para declarar inexistente a relação jurídica contratual entre o autor e a parte requerida. Condeno a ré a pagar ao autor, a título de indenização por danos morais, a importância de R$15.000,00 (quinze mil reais), devidamente corrigida pelos índices fornecidos pela CGJMG, a contar desta data, acrescida de juros moratórios de 1% ao mês, a partir da citação, até o efetivo pagamento.
Diante da sucumbência recíproca, em maior parte pela parte ré, condeno-a a pagar 80% (oitenta por cento) das custas e despesas processuais, bem como os honorários advocatícios da parte contrária, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, na forma do art.85 §2º, CPC. Lado outro, condeno a parte autora a pagar 20% das custas e despesas processuais, bem como, os honorários advocatícios de sucumbência ao patrono da ré, que fixo em R$800,00 (oitocentos reais), na forma do art.85, §8º, CPC.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Belo Horizonte, 21 de junho de 2016
IGOR QUEIROZ
Juiz de Direito