PROCESSOS REUNIDOS:

AÇÃO INDENIZATÓRIA

Autos 0024.10.164.581-0

Autores: CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO VALE DOS BURITIS

Ré: ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA.

AÇÃO CAUTELAR INOMINADA

Autos nº 0024.11.302.143-0

Autor: CONDOMÍNIO VALE DOS BURITIS

Réu: ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA.

AÇÃO CAUTELAR INOMINADA

Autos n.0024.11.306.920-7

Autor- RITA DE CASSIA PIUMBINI e outros

RÉU – ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA.

 

S E N T E N Ç A

 

 

1. RELATÓRIO DA AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS

Cuida-se de Ação Indenizatória por Danos Materiais C/C Pedido de Reparação por Danos Morais, proposta por CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO VALE DOS BURITIS contra ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA., ambos devidamente qualificados nos autos, aos fundamentos de que o edifício Vale dos Buritis foi entregue ao condomínio em 1995; que no ano seguinte o edifício passou a apresentar suas primeiras trincas e rachaduras, razão pela qual a Ré foi notificada, em 15.04.1996, para tomar as providências cabíveis; que a Ré alegou tratar-se de uma acomodação natural do terreno e que pequenas intervenções solucionariam os problemas; que as trincas e rachaduras passaram a se agravar; que em 03.03.1998, a Ré foi notificada sobre as reincidentes falhas estruturais e de acabamento, bem como sobre o vazamento e afundamento da entrada principal e calçada do edifício; que as intervenções realizadas pela Ré foram paliativas e apenas ocultaram por algum tempo o problema estrutural do edifício; que EM 18.02.2009, o Autor foi notificado pela Defesa Civil de Belo Horizonte/MG sobre a necessidade urgente de reformas, em razão da existência de trincas e rachaduras nas paredes do prédio, abatimento do piso da entrada, possível vazamento de gás GLP e consequente risco de explosão e incêndio; que em novembro/2009, a Ré promoveu a construção de 10 novos tubulões com blocos de coroamento para reforço da estrutura predial, mas referida obra foi abandonada pela Ré e encontra-se inacabada sob a alegação de falta de verba; que em 30.01.2010, o Autor foi novamente notificado pela Defesa Civil, oportunidade em que os moradores foram aconselhados a abandonarem o prédio; que o Autor também foi autuado pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte/MG e, por consequência, foi multado em R$ 2.083,60, ao fundamento de que descumpriu a exigência de manter em bom estado de conservação as fachadas, paredes aparentes, edificações, marquises e saliências do imóvel; que a Ré foi comunicada sobre a grave situação, mas quedou-se inerte. Pediu a concessão da tutela antecipada para determinar que a Ré reiniciasse as obras que abandonara, no prazo de 24 h, sob pena de multa. Ao final, pediu a procedência dos seguintes pedidos que busco transcrever tais como formulados:

1. Que seja, ao final, julgado procedente o pedido para determinar , em definitivo, que a REQUERIDA proceda à reparação dos danos causados por culpa da mesma, interno e externamente, tais como:

a) novas tubulações de gás e suas instalações;

b) renovação e novas acomodações das caixas, encanamentos de água, rede e caixas de gordura e esgoto;

c) retirada do piso atual (passeio e frete do prédio) e compactação do solo e recolocação dos pisos;

d) reconstrução dos muros laterais com acabamento (externo e internamente);

e) reforma da casa de gás;

f) reparo em todas as trincas das fachadas frontais e laterais, internas e externas, bem como seus necessários acabamentos com reboco, massa corrida e pintura;

g) reparo no salão de festas;

h) reparo no piso da garagem;

i) reparo interno nas unidades.

2. Requer seja condenada a Requerida a ressarcir todo o prejuízo material do Requerente com medidas adotadas em razão da negligência daquela;

3. Requer, ainda, sejam indenizados os condôminos pela privação de utilizarem em sua íntegra o imóvel que adquiriram (salão de festas, gá encanado, portões eletrônicos, alarmes de segurança e vagas de garagem) por culpa da Requerida. Indenização esta, a título de compensação a ser arbitrada;

4. indenização por danos morais a serem arbitrados ao alvedrio deste Douto Juízo, vez que os condôminos foram notificados por órgãos públicos constrangidos por vizinhos, dentre outras.”

Indeferido o pedido de concessão da tutela antecipada, conforme decisão de fls. 257/258.

Citada (fls. 340), a Ré ofertou contestação (fls. 301/312), arguindo, preliminarmente a falta de interesse de agir decorrente de celebração de transação do objeto. Como preliminar de mérito, alega a prescrição da pretensão. No mérito, alega que o defeito estrutural assinalado na inicial não se originou de fato da construção, mas de causas externas que surgiram após a entrega das chaves; que o Autor não juntou nos autos nenhuma prova de que o problema estrutural ocorreu por erro de cálculo ou por falha na execução da obra; que era de conhecimento de todos os condôminos que a técnica adotada na construção do edifício é de alvenaria autoportante e, por consequência, cada parede cumpre função relevante, não apenas para separar ambientes, mas para sustentar o peso global da edificação; que nesse tipo de edificação é proibida a demolição de paredes para alteração do projeto inicial, mas ambos os proprietários das unidades do primeiro andar derrubaram paredes posteriormente à entrega das referidas unidades; que não há provas de prática de ato ilícito; que em 2003, foi realizada obra corretiva e o Autor foi cientificado sobre a necessidade de eliminar a infiltração de água vinda das caixas de gordura do prédio, localizadas na área entre a parede frontal da edificação e o gradil que separa o prédio da área externa, estouradas por conta de excesso de água pluvial vinda da rua; que o Autor foi alertado sobre a necessidade de manutenção periódica das caixas de gordura; que as fotos de fls. 65 e 67 comprovam que o abatimento do piso decorre da ação conjunta do excesso de água pluvial que, vindo da rua, solapam silenciosa e constantemente o alicerce não só da calçada como da estrutura das caixas de gordura que estão na parte frontal do prédio, destruindo-as, e dos dejetos que deveriam ser direcionados para as caixas de gordura, mas são direcionados para o subsolo e para os tubulões, lavando-os; que essas infiltrações estão há anos abatendo o subsolo da calçada e das caixas de gordura, lavando os tubulões e, por consequência, minando-lhes a resistência; que a constatação da necessidade de construir novos tubulões não significa reconhecimento de responsabilidade pela sua construção, vez que comprova tão somente a deterioração dos tubulões e não que fossem insuficientes, tivessem sido subdimensionados ou construídos em menor número; que as obras de construção de novos tubulões foi abandonada porque o Autor não cumpriu com sua obrigação de arcar com a metade dos custos; que os condôminos confessam que deram causa às fiscalizações realizadas pela Defesa Civil e pela Prefeitura Municipal; que não há prova de ato ilícito e, por consequência, não há falar em dever de indenizar; que não há dano moral a ser reparado. Pede a improcedência dos pedidos.

Às fls. 267/269, a Ré apresentou reconvenção alegando que as partes acordaram que as obras de recuperação do edifício seriam realizadas pela Reconvinte, mas o Reconvindo se comprometeu a arcar com o pagamento de metade do valor das despesas; que cumpriu a sua parte no acordo, realizando a essencial e maior parte dos reparos no edifício que hoje encontra-se estruturalmente estável e sem riscos de ruína. Pede a procedência do pedido para condenar o Reconvindo a ressarcir as despesas incorridas nas obras de recuperação do edifício Vale dos Buritis ao final de 2009, devidamente corrigidas.

Impugnação da contestação às fls. 345/354.

Intimado, conforme decisão de fls. 339, o Autor/Reconvindo apresentou contestação à reconvenção (fls. 355/357), alegando que a Reconvinte, através de seu engenheiro Macio Muniz, assumiu a realização das obras, bem como os seus custos; que até o presente momento todos os custos com os reparos no edifício foram suportados pelo condomínio Reconvindo; que a Reconvinte age com má-fé. Pede a improcedência do pedido.

Impugnação da contestação da reconvenção às fls. 359.

Instados a especificar provas, conforme decisão de fls. 360, Autor (fls. 361) e Ré (fls. 362) requereram o julgamento antecipado da lide.

Designada audiência de conciliação, conforme decisão de fls. 363.

Realizada audiência (fls. 364/365), não se obteve a conciliação, oportunidade em que foi designada, de ofício, a produção da prova pericial e nomeado perito.

Às fls. 407/408, foi deferido o pedido de concessão da tutela antecipada para determinar que o Réu iniciasse obras de reestruturação do imóvel, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00.

Às fls. 414/417, o Autor requereu a apreciação do pedido para que a Ré arcasse com as despesas de moradia para os condôminos, tendo em vista o risco de ruína do edifício.

Deferido o pedido de concessão da tutela antecipada para que a Ré arcasse com o pagamento de aluguel mensal a cada condômino, até o julgamento do feito, conforme decisão de fls. 423/425, oportunidade em que foi determinada a habilitação no processo de cada família, o que foi atendido, conforme manifestação de fls. 426/427.

O Autor interpôs embargos de declaração às fls. 451/452, que foram acolhidos, conforme decisão de fls. 453/454, para estabelecer os critérios para o pagamento dos aluguéis arbitrados na decisão de fls. 423/425.

A Ré interpôs Agravo de Instrumento (fls. 534/548).

Laudo pericial juntado às fls. 846/1.044 e esclarecimentos prestados às fls. 1.107/1.176, 1.233/1.234.

Declarada encerrada a prova pericial, conforme decisão de fls. 1.248, a Ré interpôs embargos de declaração (fls. 1.250/1253), os quais foram acolhidos, conforme decisão de fls. 1.274-v, para deferir os quesitos complementares apresentados pela Ré.

Às fls. 1.315/1.326, encontra-se o acórdão do e. TJMG que negou provimento ao agravo interposto pela Ré.

Respostas aos quesitos complementares às fls. 1.334/1.341 e esclarecimentos do Perito às fls. 1.346/1.347 e 1.409/1.413.

Às fls. 1.434/1.435, A Ré requereu a realização de nova perícia, o que foi indeferido, conforme decisão de fls. 1.442.

A Ré interpôs Agravo Retido (fls. 1.444/1.449), devidamente contra-arrazoado (fls. 1.453/1.464).

Realizada audiência (fls. 1.498/1.499), não se obteve a conciliação, oportunidade em que foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas, conforme termos de fls. 1.500/1.509.

Alegações finais (fls. 1.510/1.522 e 1.539/1.583).

 

2. RELATÓRIO DA AÇÃO CAUTELAR INOMINADA, AUTOS N.024.11.302.143.0

Em apenso, foi proposta Ação Cautelar Inominada por CONDOMÍNIO VALE DOS BURITIS em face de ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA., ambos devidamente qualificados nos autos, aos fundamentos de que em junho/2010, propôs ação indenizatória por danos materiais com pedido de reparação por danos morais e pedido de concessão de tutela antecipada para compelir a Ré a promover os reparos na estrutura do edifício Vale dos Buritis; que em 23.10.2011, a Defesa Civil interditou o edifício, removendo todos os moradores de suas respectivas unidades; que todos os bens dos moradores encontram-se nas referidas unidades, sem possibilidade de serem retirados; que pretende a concessão da medida liminar para garantir eventual reparação civil. Pediu a concessão da liminar para declarar indisponibilidade de todos os bens de propriedade da Ré.

Indeferido o pedido de concessão da liminar, conforme decisão de fls. 35/38.

Citada (fls. 40), a Ré ofertou contestação (fls. 41/54), arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa do condomínio. No mérito, alega a ausência dos requisitos indispensáveis para a concessão da liminar; que não há provas relevantes de lesão ao patrimônio do Autor; que não há elementos para a condenação da Ré; que é indispensável que a haja decisão que reconheça a responsabilidade da Ré em indenizar os danos alinhados pelo Autor. Pede a improcedência do pedido.

A defesa foi devidamente impugnada às fls. 64/77.

Instados a especificar provas, conforme decisão de fls. 165, apenas a Ré se manifestou requerendo a produção da prova pericial (fls. 166).

Suspensa a tramitação do processo para julgamento simultâneo, conforme decisão de fls. 186.

3-RELATÓRIO DE AÇÃO CAUTELAR INOMINADA, AUTOS N.024.11.306.920-7

Em apenso, foi proposta Ação Cautelar Inominada por RITA DE CASSIA PIUMBINI, PRISCILA MARIA AMARAL, VANIA FERREIRA DE FIGUEIREDO, EDUARDO BIANCHINI GALLIAC, CHRISTIANA TEIXEIRA MORATO, AUGUSTA MARIA QUEIROS DE CAVALHO MARON, WANER WILLION MARON, E ANDRÉ VIVACQUA, em face de ESTRUTURA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA., todos devidamente qualificados nos autos, aos fundamentos que são moradores do edifício Vale dos Buritis e que em junho/2010, o condomínio propôs ação indenizatória por danos materiais com pedido de reparação por danos morais e pedido de concessão de tutela antecipada para compelir a Ré a promover os reparos na estrutura do edifício Vale dos Buritis; que em 23.10.2011, a Defesa Civil interditou o edifício, removendo todos os moradores de suas respectivas unidades; que todos os bens dos moradores encontram-se nas referidas unidades, sem possibilidade de serem retirados; que pretende a concessão da medida liminar para que a Ré arque com todos os gastos de moradia provisória dos autores até o deslinde final.

A liminar foi deferida, conforme decisão de fls.16/18 e 44 e contra ela interposto agravo de instrumento, que teve seu seguimento negado às fls.204/210.

Citada, a Ré ofertou contestação (fls. 83/106), arguindo, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, porque teria celebrado contrato de administração de obra por empreitada. No mérito, alega que ocorre ausência dos requisitos indispensáveis para a concessão da liminar; que a culpa pelo ocorrido é de terceiros; que não há provas relevantes de lesão ao patrimônio do Autor; que não há elementos para a condenação da Ré; que é indispensável que a haja decisão que reconheça a responsabilidade da Ré de indenizar os danos apontados pelos Autores; que ocorre necessidade de se prestar caução. Pede a improcedência do pedido.

A defesa foi devidamente impugnada às fls.196/202 e suspenso o processo às fls.203, para aguardar a instrução nos autos apensos.

São na essência os relatórios dos 3 processos.

DECIDO.

Os feitos encontram-se em ordem, não existindo vícios ou irregularidades a serem sanadas, pelo que passo a decidi-los por esta única sentença.

A ação principal contém pedidos de indenização e de reparação por dano moral, como literalmente transcritos acima, que logo de início verifica-se ter sido proposta não pelos proprietários das unidades condominiais, mas sim e por opção dos procuradores do autor, pelo Condomínio de Edifício Vale dos Buritis, porque segundo a inicial, dito edifício passou a apresentar vícios de construção que colocavam em risco a sua estrutura.

Essa opção acima declinada levou a alguns problemas na sequência do processo e de prolação desta sentença, como se verifica dos pedidos acima transcritos, eis que também a situação fática inicial alterou-se no curso do processo com o desabamento do edifício, devendo, portanto, esse fato superveniente ser levado em conta, nos termos do art.462 do CPC/73 (STJ 140/386 e 42/352), cabendo ao juiz, diante de eventual incompletude do pedido, socorrer-se da análise da causa de pedir, o que tem sido admitido pela jurisprudência, “in verbis”: Inexiste o julgamento extra petita quando o acórdão recorrido opta por solução que, embora não expressa na petição inicial, estava implícita no pedido deduzido em juízo” (STJ-3ª T. REsp.200.453, rel. Min. Castro Filho e, ainda, STF-RT-633/208).

Fato é que também não encontro nos autos notícias de que os proprietários das unidades condominiais tenham ingressado com as respectivas ações de indenização, em razão da perda em definitivo dos seus respectivos imóveis, talvez por que esperem que dita solução seja dada com este processo, não sem antes dizer que o juiz, na sentença, encontra-se adstrito ou vinculado expressamente ao que foi pedido pela parte, nos termos do art.128 do CPC/73.

Atente-se, ainda, para o fato de que nada obstante este processo tenha que ser julgado sob a regência do CPC/73, a sentença é prolatada sob a influência e espírito do novo Código de Processo Civil/15, cuja preocupação é o da efetiva prestação jurisdicional que, nas palavras constantes da exposição de motivos, sua elaboração se orientou precipuamente “por cinco motivos”:(...) 2-Criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa; 4-Dar todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado.”

Feita essa introdução, passo à análise das preliminares arguidas nas contestações, tanto do processo principal, quanto dos cautelares apensos, vez que são comuns a todos.

Na contestação do processo principal a ré sustenta preliminar, com fundamento no art.326 do CPC, no sentido de que houve fato extintivo do direito do autor, porque com ele celebrou uma transação, nos idos de 2009, para realizar as reformas pedidas na inicial.

Ocorre que, como a própria ré informa, dito fato é anterior à propositura da ação e além disso, não constitui matéria a ser discutida em preliminar, mas sim de procedência ou improcedência do pedido, devendo ser analisada no mérito, para onde remeto a decisão.

A segunda preliminar, consistente em defeito da representação por falha constante da procuração de fls.19, já foi sanada no curso do processo, restando, pois, prejudicada.

Há, ainda, uma outra preliminar, deduzida nas contestações das ações cautelares e que também diz respeito à decisão do processo principal, que é a alegada falta de legitimidade ativa do Condomínio autor para postular em nome dos condôminos proprietários.

Como já mencionado acima, em razão desta ação, os proprietários das unidades condominiais não ingressaram com ações individuais buscando a indenização pela perda em definitivo dos seus respectivos imóveis, vindo o pedido de indenização a ser formulado pelo Condomínio autor, em nome deles, conforme se pode inferir do conjunto dos pedidos constantes dos itens 1, 2 e 3 acima transcritos, o que também se conclui a partir da verificação da causa de pedir, cujo fundamento é a busca de indenização, na forma de compensação em favor dos condôminos, de todas as perdas sofridas por eles.

Ocorre que diante da superveniência do desabamento de todo o edifício, consequentemente há inequívoca impossibilidade de se atender aos pedidos de indenização, tais como literalmente formulados na inicial e transcritos acima. Logo, em razão disso, deve o juiz, analisando esse conjunto de pedidos que ficaram prejudicados com a superveniência fática e com fincas no art.462, e na causa de pedir, compreendê-los no sentido de que a indenização compensatória pela absoluta e definitiva privação do uso das unidades condominiais, de que eram proprietários, deve-se dar na forma de condenação ao integral ressarcimento, na exata correspondência do valor de cada unidade, preservando-se, assim, os fins do processo e evitando-se o continuado sofrimento dos condôminos e a propositura de inúmeras demandas para o mesmo fim, atendendo-se, ainda, aos reclamos da Justiça e da Paz Social, fins últimos do processo, ante a perplexidade decorrente da situação fática verificada, conforme já decidiu o STJ (RSTJ78/268).

A convolação dos pedidos de reparação de todos os danos sofridos pelos condôminos em indenização ou ressarcimento é medida que se impõe, pois não há mais possibilidade ou interesse dos condôminos na realização de reparos no edifício, que já veio a desabar. Foi nesse sentido que decidiu o STJ, conforme item 1.7 do aresto que transcrevo na sequência e que aqui destaco: “1.7. Não sendo, portanto, primordial o interesse dos autores em ver os réus compelidos a realizar os reparos nos imóveis, no caso concreto, mostra-se plenamente possível ter como principal o pedido inicial de indenização, considerando-se os demais - obrigação de fazer com possibilidade de conversão em perdas e danos – sucessivos em relação ao primeiro, guardando com este relação de prejudicialidade (art. 289 do CPC).”

De outro lado, a jurisprudência vem mantendo o entendimento de que o condomínio detém legitimidade para propor ação indenizatória decorrente dos vícios de construção que acometem as áreas comuns e as unidades autônomas do edifício, vícios construtivos esses que levaram ao desabamento do edifício, pelo que, rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa do autor, mesmo porque, pelo despacho de fls.423/425, o nobre colega que me antecedeu determinou que os condôminos proprietários se habilitassem nos autos, o que ocorreu às fls.426/427, habilitação essa que somente pode ser entendida como sendo na de assistência litisconsorcial, consoante o art.47 do CPC. Contra essa decisão - que inclusive condenou a Ré na obrigação de pagar aluguel para os condôminos proprietários que se viram privados em definitivo de suas propriedades - a Ré interpôs recurso de agravo de instrumento, cujo seguimento foi negado pelo TJMG, com trânsito em julgado, não havendo mais falar, portanto, também por esse fundamento, em ilegitimidade ativa do autor.

A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA QUESTÃO FEDERAL. SÚMULA 284/STF. CONDOMÍNIO. DANOS. ÁREAS COMUNS E UNIDADES AUTÔNOMAS. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. ART. 70, III, DO CPC. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO AO FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO. SÚMULAS 283 E 284/STF. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Ausência de demonstração da questão federal atinente aos aos arts. 295, parágrafo único, II, e 267, IV, do Código de Processo Civil, não se tendo particularizado, de forma específica, o modo pelo qual o acórdão recorrido os teria contrariado. Aplicação da Súmula 284/STF. 2. Legitimidade ativa do condomínio, na pessoa do síndico, para ação voltada à reparação de vícios de construção nas partes comuns e em unidades autônomas. Precedentes. 3. Ausência de impugnação, no tocante à denunciação da lide, ao fundamento do acórdão recorrido. Incidência das Súmulas 283 e 284/STF. 4. Decisão agravada mantida. 5. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (STJ, AgRg no AREsp 93530/SP; Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino;. DJe. 02.04.2013)

 

RECURSOS ESPECIAIS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. IMÓVEIS FINANCIADOS COM RECURSOS DO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. REGULARIDADE PROCESSUAL RECONHECIDA. DEFEITOS DE CONSTRUÇÃO NAS UNIDADES RESIDENCIAIS AUTÔNOMAS. LEGITIMIDADE DO CONDOMÍNIO. PEDIDOS SUCESSIVOS. INDENIZAÇÃO DEVIDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR). 1. Do recurso especial interposto por Ennio Fornea e Cia Ltda. e Ennio Fornea Júnior: 1.1. É cediço nesta E. Corte afigurar-se prematuro o recurso especial interposto quando pendente de julgamento, no Tribunal de origem, qualquer recurso ordinário. Porém, no ensejo de reiterar recurso especial interposto prematuramente, não possui o recorrente a faculdade de aditá-lo, se não houve alteração quando do julgamento dos embargos de declaração, porquanto já operada, de outra parte, a preclusão consumativa. 1.2. As regras alusivas às nulidades processuais são muito mais voltadas à convalidação e ao afastamento das nulidades do que à sua decretação, tendo em vista a função basilar do processo, como instrumento de aplicação do direito material. Não se justifica, portanto, a anulação do presente feito, que já se arrasta por catorze anos, uma vez que a procuração assinada pela síndica, somada às atas de assembleia que evidenciam o desejo dos condôminos em ajuizar a presente demanda, afastam o aventado defeito na representação. Ademais, rever os fundamentos da decisão ora hostilizada demandaria reexame de provas, o que é vedado pela Súmula 7. 1.3. O Condomínio, na pessoa do síndico, tem legitimidade ativa para ajuizar ação com escopo de reparar vícios na construção, sejam nas partes comuns, sejam em unidades autônomas, por força do art. 22, § 1º, "a", da Lei nº 4.591, de 16.12.64. Precedentes. 1.4. A tese relativa à prescrição - ancorada em violação aos arts. 26, II, §§ 2º e 3º, do Código de Defesa do Consumidor - não está prequestionada, a despeito de oposição de embargos de declaração, circunstância que atrai a incidência da Súmula nº 211 desta Casa. Ademais, saber qual a natureza dos defeitos existentes nas edificações - se relativos à segurança da obra ou à perfeição da obra - demandaria reexame de provas, o que é vedado pela Súmula 07/STJ. 1.5. O art. 288 do CPC, que trata da possibilidade de pedidos alternativos, segundo remansosa doutrina, aplica-se a obrigações alternativas, as quais têm "por objeto uma pluralidade de bens reciprocamente heterogêneos e acidentalmente reunidos pelo contrato" (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2006, p. 122), o que não é o caso dos autos. 1.6. O arcabouço normativo aplicável à espécie é o relativo a vícios redibitórios. Nesse passo, diante do tempo decorrido desde a propositura da ação, assim também a recusa sistemática do réu em realizar as obras de reparo, nem o Código Civil de 1916 (art. 1.101 a art. 1.106), nem o Código Civil de 2002 (art. 441 a art. 446), tampouco o Código de Defesa do Consumidor (art. 18 a art. 25), conferem ao devedor o direito de escolher sanar os vícios na construção do imóvel ou pagar indenização por perdas e danos, e, inexistindo a possibilidade de se analisar o contrato, para se verificar se neste contém tal previsão (Súmula 05), resta rejeitada a pretensão do recorrente de, a essa altura, realizar as obras. 1.7. Não sendo, portanto, primordial o interesse dos autores em ver os réus compelidos a realizar os reparos nos imóveis, no caso concreto, mostra-se plenamente possível ter como principal o pedido inicial de indenização, considerando-se os demais - obrigação de fazer com possibilidade de conversão em perdas e danos – sucessivos em relação ao primeiro, guardando com este relação de prejudicialidade (art. 289 do CPC). 1.8. Recurso especial não conhecido. 2. Do recurso especial interposto pela Caixa Econômica Federal: 2.1. A Caixa Econômica Federal não é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda redibitória, não respondendo por vícios na construção de imóvel financiado com recursos do Sistema Financeiro da Habitação (ressalva do entendimento do relator). 2.2. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, provido. (STJ, REsp 950522; Rel. Min. Luis Felipe Salomão; Dje. 08.02.2010)

A Ré ainda suscitou nas contestações das ações cautelares, preliminares de falta de interesse de agir e de sua ilegitimidade passiva, esta decorrente do fato de ter celebrado contrato de empreitada para a administração de obra, com o que não se responsabilizaria na forma da lei de incorporação imobiliária.

Rejeito ambas as preliminares, porque é evidente o interesse do autor e dos seus litisconsortes na propositura da ação para verem-se ressarcidos dos danos decorrentes da alegada má execução dos serviços prestados pela Ré, compreendido o interesse como sendo a necessidade/utilidade do provimento jurisdicional pleiteado e a adequação do procedimento escolhido para se atingir tal fim.

Pela mesma forma, não há falar em ilegitimidade passiva da Ré, vez que se busca responsabilizá-la por sua alegada negligência e má execução dos serviços, na forma do art.186 e seguintes do CC e da lei n.8.078/90, sendo que o tipo ou forma de contratação, de empreitada ou incorporação, em nada altera a pertinência da propositura da ação contra a sua pessoa, na busca do ressarcimento.

Sob esses fundamentos, rejeito todas as preliminares acima analisadas e passo ao exame do mérito.

A Ré suscita uma preliminar de mérito, consistente na ocorrência da prescrição, entendendo que ela seria de 3 anos, na forma do art.206, §3º, V ou ainda do art.2028, todos do CC, porque os vícios teriam surgido no ano de 1996 e a ação veio a ser proposta em 28.06.2010.

O STJ já decidiu que o prazo de 5 anos constante do art.618 do CC não é de prescrição, mas sim de garantia e desse modo, o construtor pode ser acionado no prazo de 10 anos de que trata o art.205 do CC (STJ-4ª T. REsp 215.832-PR, rel. Min. Sálvio de Figueiredo). No mesmo sentido editou-se a Súmula 194 do STJ, ao tempo do art.1245 do CC/1916.

No caso, a responsabilização da Ré decorre da alegada negligência e o ressarcimento tem fundamento no art.927 do CC/01, sendo que ao tempo da entrada em vigor do Código Civil de 2003, não havia decorrido mais da metade do prazo prescricional, vez que a própria ré admite que o vício surgiu em 1996. Como a ação foi proposta em 2010, não transcorreu o prazo de 10 anos de que trata o art.205 do CC.

Demais disso, a alegação é de que os vícios são de natureza oculta e estruturais, de difícil constatação e em se tratando de vícios de construção, que surgem gradativamente ao longo dos anos, não há como considerar como termo inicial do prazo prescricional a data em que surgiram as primeiras trincas e rachaduras, devendo o prazo prescricional, no caso, ser contado, nos termos do art.189 do CC, a partir da efetiva negativa da construtora em reparar os vícios, que no caso ocorreu em 19.04.2010, data da contra notificação de fls. 52, na qual a Ré se recusou expressamente a prosseguir com as obras de reestruturação do edifício, mesmo porque, ela própria confirma e alega que celebrou transação com o autor, no ano de 2009, para realizar os reparos estruturais do edifício, o que atrai a aplicação do art.202, VI do CC.

Desta forma, rejeito a preliminar de prescrição.

Quanto à preliminar de ocorrência de fato extintivo do direito do autor, consistente na celebração em uma transação com o autor, no ano de 2009, o que invocaria a aplicação do art.326 do CPC, como já foi dito anteriormente, cuida-se de fato anterior à própria propositura da ação. Depois, resta evidente que a tratativa se deu como forma de se evitar o desabamento do edifício, que inquestionavelmente veio a ocorrer, pelo que não se pode falara em fato extintivo do direito do autor que, busca com a ação o ressarcimento de todos os prejuízos verificados por ele e pelos condôminos com a privação e perda do próprio edifício que veio a desabar. Não houve, pois, celebração de transação com a finalidade de extinguir direitos, mas sim para que a Ré cumprisse a sua obrigação de garantir a segurança e a própria existência da obra.

Anoto, inicialmente, que em razão do fatídico desabamento do Edifício Vale dos Buritis, o pedido relativo às obras de reparação dos vícios estruturais restou prejudicado, não havendo nada mais nesse sentido a prover, restando os pedidos relativos à indenização pelos custos suportados com as obras realizadas até a queda do edifício, a indenização pela perda da unidade autônoma, bem como a reparação pelos danos morais.

Ultrapassadas todas as questões preliminares que podiam impedir a análise do mérito, tem-se que o autor ingressou com a ação para ressarcimento dos prejuízos decorrentes das falhas estruturais de construção do edifício.

Em sua contestação, a Ré alega que não houve erro de cálculo ou erro na execução da obra de edificação e que o abalo na estrutura do edifício ocorreu por dois motivos, quais sejam: infiltrações decorrentes do excesso de água pluvial; e a demolição de paredes pelos proprietários das unidades autônomas do primeiro andar.

A Ré sustenta que era de conhecimento dos condôminos que a técnica adotada na construção do edifício Vale dos Buritis é de alvenaria autoportante e, por isso, era proibida a demolição de paredes para alteração do projeto inicial. Afirma, porém, que os proprietários das unidades do primeiro andar não observaram a referida vedação e promoveram a demolição de paredes de suas respectivas unidades, o que acarretou o abalo na estrutura do edifício e, por consequência, o surgimento das trincas e fraturas.

Sobre a demolição das paredes pelos proprietários das unidades do primeiro andar, porém, o I. Perito foi categórico ao afirmar que a remoção de alvenaria interna, o que é proibido no tipo de construção adotado, não foi a causa das patologias, conforme verificado na vistoria de 19.08.2011, mas contribui para piorar a situação”.

Nesse sentido, ainda que a demolição das paredes tenha contribuído para piorar a situação estrutural do edifício, a prova pericial não deixou dúvidas de que referido ato não foi o responsável pelos vícios apresentados pelo edifício.

A Ré alega, ainda, que as causas do abatimento do piso decorreram da ação conjunta do excesso de águas pluviais que, vindas da rua, atingem constantemente não apenas o alicerce da calçada, como a estrutura das caixas de gordura que estão na parte frontal do prédio, destruindo-as, e os dejetos que deveriam ser direcionados para as caixas de gordura, são direcionados para o subsolo, para os tubulões, lavando-os e minando sua resistência.

Na sua contestação e, conforme se depreende dos quesitos, pedidos de esclarecimentos e quesitos complementares, a Ré insiste em afirmar que os danos estruturais em questão surgiram alguns anos depois da entrega do empreendimento, sustentando, também, que a infiltração no subsolo foi causada pelo rompimento da tubulação COPASA, fatos esses que seriam os responsáveis pelo abalo dos alicerces de sustentação do edifício.

Sobre as causas que levaram ao surgimento das trincas e rachaduras e, posteriormente, à queda do edifício, o I. Perito, em sua conclusão de fls. 1.021/1.025 sustenta que:

a) o local escolhido para construção do Ed. Vale Buritis corresponde a uma encosta com 40 m de altura e declividade de aproximadamente 33%, em xisto e filito. Considerando a topografia, tipo de solo e condições de drenagem, o local não deveria ter sido ocupado. Contrariando esta recomendação, as construções ali projetadas exigiam estudos específicos, soluções complexas de Engenharia e significativos investimentos. (grifo nosso)

b) as condições desfavoráveis do solo local foram confirmadas pelo excelente trabalho Geotécnico realizado pela Empresa Recuperação.

c) As deficiências de drenagem foram confirmadas pela POTAMOS Engenharia e Hidrologia Ltda..

d) (…).

e) O Ed. Vale dos Buritis foi construído sem levar em consideração o grau de dificuldade comprovado pelos estudos citados nos itens anteriores, o que determinou de imediato patologias, justificando a necessidade de reforço. (…)

f) As patologias foram registradas imediatamente após o seu “Habite-se” e só foram realmente enfrentadas, embora parcialmente, com os reforços de fundações (apenas na fachada frontal) realizados no final de 2009, que chegaram a 13,00 m de profundidade. Conforme informações prestadas pelos técnicos envolvidos, o reforço deveria incluir os pilares P19 e P20, entretanto, ficou acertado que seria feito um monitoramento com o objetivo de acompanhar o resultado do reforço parcial (fachada), cujo resultado levara a decisão quanto ao recurso complementar (P19 e P20).

g) A Estrutura Engenharia executou os esforços, mas abandonou a obra antes de sua total conclusão, decisão justificada pelo desentendimento comercial com o Condomínio. Portanto, além da obra não ter sido totalmente concluída, também não foi realizado o indispensável monitoramento antes planejado para analisar a eficiência do reforço realizado e também não foram reparados os danos identificados em toda a edificação, etapa indispensável para evitar as infiltrações pelo aterro.

(...)

A partir das conclusões apostas no laudo pericial, não restam dúvidas de que os problemas estruturais do Ed. Vale dos Buritis surgiram tão logo o empreendimento foi entregue aos proprietários. Resta claro que o local escolhido pela Ré para a construção do edifício não era apropriado para a realização do empreendimento, sendo oportuno ressaltar que a Ré não comprovou que, diante da irregularidade e singeleza do terreno, realizou todos os estudos e direcionou todos os recursos necessários para a correta e segura realização da fundação do edifício, até mesmo porque, conforme atesta o item “h” da conclusão do I. Perito (fls. 1.022), o projeto de fundação, que se mostrava indispensável para a realização da perícia, bem como as sondagens utilizadas, não foram fornecidos pela Ré, ao fundamento de que “desapareceram”. Nesse mesmo item, o I. Perito afirma que “o projeto estrutural (incompleto), não tem assinatura e aparentemente não houve o registro da ART – Anotação de Responsabilidade Técnica junto ao CREA-MG”.

Quanto ao alegado vazamento das redes da COPASA, o I. Perito sustenta no item “n” da sua conclusão (fls. 1.024) que as redes da COPASA foram danificadas pelas constantes movimentações provocadas pelo tipo de solo (externo) e pelas características das patologias do Ed. Vale dos Buritis (interno). O vazamento e obstrução registrados em 2009 (laudo da COPASA) ocorreram quando o prédio já apresentava problemas desde 1996, portanto, não é a causa, sempre foi uma consequência que agravava a situação (grifo nosso)”.

Registre-se, também, que em resposta ao 5º quesito apresentado pela Ré, o I. Perito afirma que “as deficiências de drenagem da via pública, conhecidas desde a época dos projetos, contribuiu para agravar a situação, mas não foi a causa das patologias”.

Por fim, o I. Perito conclui que: “...o prédio foi construído em um local que exigia estudos específicos, complexas soluções de Engenharia e significativos investimentos. Entretanto, o prédio foi construído, ao que duto indica, considerando condições normais, com as consequências aparecendo logo após o “Habite-se”, chegando a exigir reforços. O abandono das obras de reforço sem um monitoramento, verificando a sua eficiência, deixou em dúvida o resultado e a necessidade de complementação. O desaparecimento do projeto de fundação prejudicou ainda mais a verificação de um prédio que exigia complexas soluções de Engenharia ou que nem deveria ter sido construído no local escolhido”.

Com efeito, a Ré pretende eximir-se de sua responsabilidade pelos vícios apresentados pelo Ed. Vale dos Buritis, valendo-se de fatos secundários, como o vazamento das redes da COPASA, que foram ocasionadas pela própria edificação irregular promovida pela Ré.

As provas testemunhais colhidas somente confirmam a conclusão aqui chegada, nada tendo acrescentado de mais valioso e que pudesse ser levado em consideração. Aliás, pode-se ver do depoimento da testemunha de fls.1500/1503, que ele foi contratado pelo CREA à época para realizar um laudo de forma a dar uma satisfação para a opinião pública e nada além disso, laudo esse que por mim foi considerado imprestável, conforme consta do termo de audiência de fls.1498/1499.

As cópias de laudos juntados pela Ré em sede de alegações finais são inservíveis, se não foram juntados por ocasião da perícia que deles cabia conhecer, até mesmo porque sonegou o laudo de fundação para a realização da prova pericial, como descrito acima. A juntada de laudos nesta fase não tem, pois, importância para o julgamento e se havia documento técnico que interessava ao julgamento, deveria a Ré tê-lo juntado por ocasião da perícia, formulando seus quesitos, providências que não adotou, devendo, pois, arcar com o ônus processual de sua opção.

Demais disso, as causas que agravaram a situação estrutural do edifício, tais como a escavação realizada por terceiros, intensidade das chuvas, o rompimento das redes da COPASA e a falta de um sistema de drenagem adequando na via pública (item “p” - conclusão – fls. 1.024), são fatos ou condições mais que previsíveis e que não isentam a responsabilidade da Ré pelos vícios de construção, que decorrem principalmente da escolha de terreno inapropriado para o tipo de empreendimento e do abandono das obras de reestruturação indispensáveis para a solução dos problemas do edifício e para suportar as causas que agravaram a sua situação.

Sobre a responsabilidade civil, assim dispõe o art. 186 e 927 do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

No caso, o Autor pede que cada condômino seja indenizado pelos danos suportados individualmente, com os vícios apresentados pelo edifício, sendo que referido dano, em razão do desabamento do edifício, deve corresponder ao valor da respectiva unidade autônoma, conforme avaliação a ser realizada à época do efetivo pagamento da indenização, em liquidação por arbitramento.

A propósito:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ROMPIMENTO DE TUBULAÇÃO DA COPASA - DESABAMENTO PARCIAL DE RESIDÊNCIA - NEXO DE CAUSALIDADE INCONTROVERSO - DANOS MATERIAIS - DIVERGÊNCIA ACERCA DO MONTANTE RELATIVO AOS PREJUÍZOS CAUSADOS AO IMÓVEL - APRECIAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO - PRÉDIO IRRECUPERÁVEL - FIXAÇÃO EM QUANTIA CERTA - PEDIDO DE SUB-ROGAÇÃO NA PROPRIEDADE DOS BENS MÓVEIS DANIFICADOS - INOVAÇÃO RECURSAL - NÃO CONHECIMENTO - CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DE BEM JÁ CONSERTADO - BIS IN IDEM - INOCORRÊNCIA - DANOS MORAIS - EQUIDADE E RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO - RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. A concessionária de serviço público responde objetivamente pelos seus atos, na medida em que a vítima demonstre a existência do dano e do nexo causal entre a conduta e o prejuízo sofrido. 2. Comprovada, por perícia técnica, a impossibilidade de recuperação do imóvel atingido por desmoronamento de terra causado pelo rompimento de tubulação da COPASA, a concernente indenização por danos materiais deve corresponder ao valor de sua avaliação, feita em juízo. 3. Há inovação de tese em sede recursal quando são apresentados argumentos não declinados na instância a quo, que sequer foram abordados na sentença recorrida, o que ofende o princípio do duplo grau de jurisdição, e causa surpresa ao litigante adverso. 4. Diante da demonstração de que o conserto da motocicleta e sua devolução ao proprietário somente foram promovidos após o ajuizamento da ação, subsiste o interesse da parte na definição do mérito de seu pedido, para que seu direito não perca a devida proteção legal. 5. A privação de diversos bens móveis e objetos pessoais, assim como a necessidade premente de abandono do imóvel residencial, que corria risco de completo desabamento, com os transtornos que deste advêm, consubstanciam a razoabilidade e a equidade da indenização por danos morais, arbitrada pelo Juízo monocrático em R$ 10.000,00.6. Recurso a que se dá parcial provimento. (TJMG, Ap. Cível nº 2331389-46.2007.8.13.0313. P. 07.11.2012)

O Autor formulou pedido de reparação por danos morais em favor de seus litisconsortes, consistentes em “abalos” provocados em suas vidas e de seus familiares, em vexames, insegurança, notificações do Poder Público, privação de festas e celebrações e outras privações de todas sorte, tudo em decorrência dos vícios apresentados pelo imóvel, que ao final veio a desabar.

Conforme entendimento jurisprudencial dominante, os vícios construtivos de um imóvel não geram meros aborrecimentos, causando verdadeiro abalo psicológico com influência direta na vida privada dos promissários compradores, com frustração de planos e sonhos e inegável submissão dos Autores a estresse psicológico, ansiedade e incertezas, o que inegavelmente constitui sofrimento e leva ao dever de reparar o dano moral.

No caso, a situação é flagrantemente agravada em razão do desabamento do Ed. Vale dos Buritis, que obrigou os seus moradores a abandonarem repentinamente suas casas, sendo impedidos inclusive de buscarem seus objetos de uso pessoal, o que afetou sobremaneira as suas vidas, haja vista que do dia para a noite transformaram-se em desafortunados moradores, sendo obrigados a buscar casas de parentes, hotéis e etc., vivendo, agora, em imóveis locados e pagos pela Ré, em razão do deferimento da liminar.

A Ré, na condição de construtora deveria rever seu procedimento para evitar situações como a dos autos, devendo o caráter pedagógico do dano ser valorado. Diante disso, utilizando dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade quando da fixação do dano moral e considerando que o pedido do autor foi formulado em favor dos litisconsortes condôminos proprietários, que têm honra subjetiva e são os que sofrem com os fatos, tenho por bem fixar o dano moral em R$ 120.000,00, a ser rateado proporcionalmente entre os condôminos/proprietários de cada unidade autônoma.

Nesse sentido:

EMENTA: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS C/C PEDIDO SUCESSIVO DE RESOLUÇÃO DO CONTRATO. DEFEITO DE CONSTRUÇÃO. EDIFÍCIO DE APARTAMENTOS RESIDENCIAIS. DECADÊNCIA. VÍCIO OCULTO. PRESCRIÇÃO. FATO DO PRODUTO. CULPA CONCORRENTE. DEVER DE MANUTENÇÃO NÃO OBSERVADO. CONDOMÍNIO. IMPROPRIEDADE DO PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR ABALO MORAL. MORADOR QUE SE VÊ OBRIGADO A DEIXAR SUA RESIDÊNCIA. REPARAÇÃO DEVIDA. FIXAÇÃO DO QUANTUM. CRITÉRIO DE ARBITRAMENTO. - O regramento da decadência do direito de reclamar pelos vícios ocultos encontra-se estipulado no art. 26 do CDC, diferenciando-se do regime prescricional atinente à pretensão reparatória por dano moral decorrente de fato do produto, disposto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. - Não se conhece de pedido recursal cuja parte deixa de cotejar nas razões os fundamentos para reforma da sentença, consoante delimita o art. 514, II, do CPC. - O condomínio edilício não faz jus à indenização por danos morais, seja porque não possui honra subjetiva, seja porque não há falar em mácula de sua imagem, tutelável pelo Direito, perante a sociedade. - Deve ser indenizado moralmente o morador de unidade habitacional que se vê obrigado a abandonar sua residência face ao perigo de desabamento, por culpa (ainda que concorrente) do construtor do edifício.- A culpa concorrente deve ser levada em consideração para a fixação de indenização por danos morais advinda da necessidade do abandono de apartamentos pelos respectivos moradores, face ao perigo de desabamento do edifício, resultante da presença de vícios de construção e outros defeitos surgidos em decorrência da falta de manutenção adequada por parte dos condôminos. - O arbitramento econômico do dano moral deve ser realizado com moderação, em atenção à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes. Ademais, não se pode olvidar, consoante parcela da jurisprudência pátria, acolhedora da tese punitiva acerca da responsabilidade civil, da necessidade de desestimular o ofensor a repetir o ato. (TJMG, Ap. Cível nº 1649973-41.2003.8.13.0024; P. 30.08.2013.

Diante do exposto, considerando o desabamento do edifício no curso do processo, ante a impossibilidade fática e a ausência de interesse dos condôminos no atendimento dos pedidos constantes dos itens 1 e 2 da inicial, na forma literal em que foram formulados e conforme fundamentação supra, julgo procedente o pedido de ressarcimento, para condenar a Ré a indenizar os condôminos proprietários com o pagamento da quantia correspondente às respectivas unidades condominiais, conforme se apurar em liquidação de sentença por arbitramento, tomando-se por base um edifício de igual localização e padrão, incidindo-se juros de mora de 1% a.m., a partir da citação, nos termos do art.405 do CC.

DA RECONVENÇÃO

A Ré propôs reconvenção, na qual pede a condenação do condomínio Reconvindo ao pagamento de 50% das despesas suportadas por ele com a realização das obras de reestruturação, vez que teriam sido custeadas exclusivamente por ela.

Inicialmente, incumbe destacar que as obras pelas quais a Reconvinte pretende ser indenizada sequer foram concluídas, o que, inclusive, contribuiu para o desabamento do Ed. Vale dos Buritis. Demais disto, as estruturas de fundação efetivamente realizadas e de forma incompleta não surtiram nenhum efeito, sendo, pois, totalmente insuficientes e ineficientes, tanto que o edifício veio a desabar, com o que, mesmo que conclua existente a transação nesse sentido, havia inegável justificativa para o inadimplemento, consistente na exceção de contrato não cumprido, nos termos do art.476.

Demais disso, a Reconvinte alegou que o Reconvindo se comprometeu a arcar com o pagamento de 50% dos custos relativos às obras de reestruturação, mas não juntou nos autos nenhum documento capaz de comprovar o celebrado acordo. Ao contrário, ela pretende extrair a celebração da transação a partir da ata de condomínio de fls.32, na qual há expressa referência ou fixação da condição de que o pagamento só ocorreria depois de concluídas as obras por ela abandonadas, abandono esse que segundo a perícia foi inclusive uma das causas do desabamento, com o que impõe-se a improcedência do pedido reconvencional.

DAS CAUTELARES INOMINADAS

O Autor propôs ação cautelar inominada com pedido de liminar para ver declarada a indisponibilidade dos bens da Ré, como forma de garantir o cumprimento de futura condenação.

O pedido de concessão da liminar foi indeferido ao fundamento de que não se encontravam presentes os requisitos para a sua concessão, principalmente o fumus boni iuris, tendo em vista que não havia decisão capaz de imputar à Ré a culpa pelos vícios de construção.

Neste momento processual, contudo, não restam dúvidas que estão presentes todos os requisitos para concessão da liminar, vez que a culpa da Ré foi reconhecida por esta sentença, havendo, também, fundado receio de que a Ré não disponha no futuro de patrimônio suficiente para cumprir a condenação, razão pela qual concedo a liminar para declarar indisponíveis os bens de propriedade da Ré até o efetivo cumprimento da obrigação imposta pela sentença.

Diante dos mesmos fundamentos, confirmo a liminar cautelar deferida nos autos de16/18 e 44, dos autos de n.024.11.306.920-7, uma vez que presentes os requisitos legais, condenando a Ré a arcar com o pagamento dos aluguéis dos imóveis locados pelos autores até o efetivo cumprimento desta sentença que a condenou ao pagamento das indenizações reclamadas.

Ante o exposto, julgo prejudicados os pedidos constantes dos itens 1 e 2 da inicial e procedente o pedido constante do item 3, para:

1. condenar a Ré a indenizar o Autor e seus litisconsortes, pagando a cada um dos condôminos proprietários o valor correspondente ao imóvel que perderam e, portanto, pela privação de forma definitiva, conforme se apurar em liquidação por arbitramento, valor esse a ser atualizado a partir da perícia a ser designada, pela tabela da CGJ e sobre o qual deverão incidir juros de mora de 1% a.m., a contar da citação válida;

2. condenar a Ré a reparar os danos morais que arbitro em R$ 120.000,00, pagando proporcionalmente aos proprietários/moradores de cada unidade autônoma do Ed. Vale dos Buritis, acrescidos de juros moratórios de 1% a.m., desde o evento danos (data da queda do edifício), conforme disposto na Súmula nº 54 STJ., e correção monetária nos termos da Tabela da CGJ, a partir desta data (Súmula nº 362 STJ);

3. confirmar as liminares e julgar procedentes os pedidos cautelares constantes dos autos de n.024.11.302143.0 e 024.11.306.920-7, para declarar a indisponibilidade dos bens da Ré até o efetivo cumprimento da obrigação imposta por esta sentença e para que arque com o pagamento dos aluguéis dos imóveis locados pelos condôminos, devidamente atualizados, conforme constante dos respectivos contratos de locação.

Condeno-lhe, ainda, ao pagamento das custas e honorários advocatícios que fixo em 20% sobre o valor da condenação, considerando para tanto que a Ré sucumbiu na ação principal e nas duas cautelares.

4-Julgo improcedentes os pedidos formulados na reconvenção.

Condeno a Reconvinte ao pagamento das custas decorrentes da reconvenção e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor atribuído à reconvenção.

Julgo extintos os processos, nos termos do art. 487, I do CPC.

P.R.I

Belo Horizonte, 06 de setembro de 2017.

 

PAULO ROGÉRIO DE SOUZA ABRANTES

JUIZ DE DIREITO