Autos n°: 0024.14.105.977-4

Autora: Pedro Augusto de Morais Reis, representado por João Augusto Farias Reis

Réu: Companhia Brasileira de Distribuição (Extra Hipermercado)

 

 

 

Vistos etc.,

 

1. Relatório

Pedro Augusto de Morais Reis, representado por João Augusto Farias Reis ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais em desfavor de Companhia Brasileira de Distribuição (Extra Hipermercado), ambos qualificados na inicial, alegando que em 28 de junho de 2014 se dirigiu ao Extra Hipermercado acompanhado de seus pais, a fim de realizarem compra de alimentos diversos para a família.

Disse que quando já estavam no caixa, acabando de registrar a compra, a mãe do autor se lembrou que estava faltando um produto, pelo que foi buscá-lo acompanhada do autor. Narrou que, ao retornar, o autor, de apenas dois anos de idade, visualizou seu pai a uma pequena distância e, partindo em sua direção, foi atingido na região temporal direita por uma barra de ferro pontiaguda que estava solta de uma prateleira.

Afirmou que o fato gerou tumulto na loja, chamando atenção dos diversos clientes, ocasião em que apareceu a gerente da loja que orientou os pais a levarem o autor ao hospital, ordenando que, antes, efetuassem o pagamento da compra que já se encontrava registrada.

Acrescentou que a gerente da loja disse que não poderia ajudar, sendo que o máximo que poderia fazer era disponibilizar apenas um atendente para levar as compras até o carro, sendo que tal indiferença gerou indignação de diversos clientes que se encontravam na loja que acionaram a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros.

Sustentou que, devido à demora na chegada da Polícia e do Corpo de Bombeiros, os pais do autor o levaram ao Hospital Unimed. Informou que permaneceram no hospital por aproximadamente 10 horas e foi realizada uma bateria de exames físicos, clínicos e radiológicos, não sendo constatado nada de muito grave.

Salientou que a falta de cuidados do réu com os clientes ao deixar uma barra de ferro solta entre os corredores e o desprezo e indiferença de sua gerente, causaram forte abalo psicológico ao autor e seus familiares.

Além disso, obtemperou que seus pais tiveram que desembolsar gastos com deslocamento até o hospital e medicamentos, em torno de R$500,00 (quinhentos reais), requerendo sua indenização e alegando ser desnecessária a prova do dano material, por ser presumível.

Ao final, requereu a procedência dos pedidos para condenar a parte requerida ao pagamento de indenização por danos morais, no valor sugerido de 100 (cem) salários mínimos e ao pagamento de indenização pelos danos materiais, em valor estimado de R$500,00 (quinhentos reais).

Pleiteou pela inversão do ônus da prova e pelos benefícios da justiça gratuita.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 08/30.

Pela decisão de f. 31 foi deferida a gratuidade de justiça.

Devidamente citada (f. 35), a parte ré apresentou a contestação de fls. 36/110, com documentos, suscitando, em sede de preliminar, o não cabimento da inversão do ônus da prova sob o argumento de que não há verossimilhança das alegações da parte autora ou hipossuficiência para a produção de prova, sendo que não caberia à ré demonstrar as pretensões formuladas pelo autor.

No mérito, alegou que há excludente de responsabilidade, por existir culpa in vigilando dos pais, que imprudentemente deixaram a criança transitar sozinha pelo estabelecimento comercial, além de que não há prova de que existisse barra de metal mal colocada em qualquer das prateleiras. Afirmou a existência de culpa exclusiva da vítima e consequente inexistência de ato ilícito praticado pela ré. Ressaltou a ausência de provas dos alegados danos materiais. Refutou o pedido de indenização por danos morais. Teceu considerações sobre eventual quantificação do dano moral. Requereu a improcedência dos pedidos.

Impugnação à contestação às fls. 117/118.

Parecer interlocutório do Ministério Público à f. 120.

Pela decisão de f. 121, foi reconhecida a hipossuficiência probatória do autor, deferindo a inversão do ônus de prova.

Instadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir, as partes requereram a produção de prova testemunhal e o autor requereu, também, o depoimento pessoal do representante da ré.

Agravo retido da ré às fls. 125/131.

Contraminuta às fls. 135/136.

Manifestação do MP à f. 137-v.

À f. 138, mantida a decisão agravada que inverteu o ônus da prova. Na mesma oportunidade, foi deferida a prova testemunhal e designada audiência de conciliação, instrução e julgamento.

A oitiva de depoimento pessoal do réu foi deferida à f. 146-v.

Termo de audiência às fls. 152/154, no qual foi aplicada à ré a pena de confissão, vez que, devidamente intimada para prestar depoimento pessoal, não compareceu à audiência.

Parecer final do Ministério Público às fls. 155/158.

Alegações finais apresentadas pelo autor em audiência.

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É, em síntese, o relato. DECIDO.

2. Fundamentação

Cuida-se, como dito, de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada pelo autor contra a ré em virtude do acidente ocorrido no estabelecimento réu, tendo sido o autor atingido em sua região temporal direita por uma barra de ferro pontiaguda que estaria solta de uma prateleira.

Não havendo preliminares ou nulidades a sanar, visto que a preliminar suscitada pela ré de inaplicabilidade de inversão do ônus da prova já foi decidida, passo ao exame do mérito.

Primeiramente, cumpre salientar que não se olvida da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, in casu, posto que a parte autora e a parte ré se encaixam nas definições da referida legislação de consumidor e fornecedor, respectivamente.

Acerca da responsabilidade do fornecedor, prevê o Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

 

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(…)

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

 

Da ilação do dispositivo supra infere-se que a responsabilidade do fornecedor é objetiva, fundada na teoria do risco, sendo prescindível, portanto, a aferição da culpa. Desta forma, para que se possa falar em obrigação de indenizar, nesse caso, necessária se faz a comprovação dos requisitos da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta, o dano, e o nexo causal entre os dois elementos anteriores.

Na inicial, o autor alega que, no dia 28 de junho de 2014, ao efetuar compras no estabelecimento réu acompanhado de seus pais, sofreu lesão em função da colisão com uma barra de ferro pontiaguda, que estava colocada imprudentemente entre as prateleiras.

Em sede de contestação, a requerida não nega o acidente; baseia sua defesa na alegação de culpa in vigilando dos pais, que deixaram a criança transitar sozinha pelo estabelecimento comercial, o que ocasionou o referido incidente.

Extrai-se do boletim de ocorrência apresentado pelo autor (fls. 26/28), datado de 29 de junho de 2014, a ocorrência do acidente na forma narrada pelo autor.

Igualmente, o depoimento da testemunha do autor, Vinícius Bonjardim dos Santos (fls. 153/154), comprova os fatos narrados na inicial. Vale transcrever:

 

(...) que presenciou os fatos envolvendo o menor no supermercado (...) que pelo que se recorda o depoente viu quando se aglomeraram pessoas próximas ao menor, depois que o mesmo se machucou e o próprio depoente disse para os pais do menor que se precisasse de alguma testemunha dos fatos poderia indicá-lo já que o supermercado não prestou assistência, que viu o menor já machucado que viu a mãe do menor mostrando o local onde o menor havia se machucado, que o local era dentro do supermercado próximo às gôndolas de frios, que o menor bateu com a cabeça numa espécie de ferro que estava na gôndola de frios e parecia estar solto, que depois do acidente o ferro ainda continuou preso na gôndola, (...).”

 

Não bastasse isso, como se deflui da f. 152, devidamente intimada para prestar seu depoimento pessoal, a parte ré não compareceu, pelo que lhe foi aplicada a pena de confissão, o que torna ainda mais indiscutível a responsabilidade da ré pelos fatos relatados nos autos, não havendo falar em culpa in vigilando dos pais do autor.

Os documentos de fls. 19/25, lado outro, demonstram que o autor foi encaminhado ao Hospital Unimed, sendo que do relatório médico do paciente consta que este teve ferimento no couro cabeludo, sendo necessária sutura de pequenos ferimentos.

Ademais, em se tratando de responsabilidade civil objetiva, como in casu, prescinde-se da demonstração de culpa ou dolo pelo agente, sendo necessária a configuração de falha na prestação do serviço, dano acarretado e nexo causal entre este e aquele.

Neste norte de pensamento, sendo a responsabilidade do fornecedor objetiva – como acima frisado –, fundada na teoria do risco, só não será responsabilizado o agente se demonstrar a ocorrência de alguma das hipóteses dos incisos I e II do §3° do art. 14 do CDC, do que não se desincumbiu.

Além disso, a parte ré não demonstrou, cabalmente, a alegada culpa in vigilando dos pais do autor (art. 14, §3°, II), restando caracterizado o dever de indenizar.

Conforme supramencionado, restou evidenciado que a autora sofreu lesão física, mesmo que de natureza leve, o que é suficiente para condenar a requerida na obrigação de indenizá-la por dano moral, posto que a ré não cumpriu com sua obrigação de fornecer o serviço com a segurança que dele o consumidor pode esperar, ofendendo a integridade física da autora.

Verifica-se, assim, que restam demonstrados o evento danoso, o dano e o nexo causal, elementos que caracterizam a responsabilidade objetiva do fornecedor, pelo que o pedido de indenização por danos morais merece procedência.

Quanto ao valor da indenização por danos morais, cumpre analisar as circunstâncias do caso concreto, mormente a natureza das lesões descritas, as condições das partes, além da dupla finalidade da condenação, qual seja, desestimular conduta análoga da parte ré e compensar a vítima pela lesão sofrida, também os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Assim, entendo suficiente a fixação de indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais).

De se ressaltar que o não acolhimento pelo Magistrado do valor pretendido pela autora a título de dano moral não enseja sucumbência recíproca. Este é o teor da súmula nº 326 do STJ, in verbis: “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica em sucumbência recíproca”.

No que tange aos danos materiais, esclarece (a doutrina) que:

 

O dano patrimonial, como preceitua o art. 402 do Código Civil, abrange o que a vítima “efetivamente perdeu” (dano emergente) e o que ela “razoavelmente deixou de lucrar” (lucros cessantes). (...)” (João Carlos Maldonado de Carvalho, in IATROGENIA E ERRO MÉDICO sob o Enfoque da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, p.130, 2005)

 

O autor requereu a condenação da requerida ao pagamento de indenização a título de danos materiais referentes a gastos com deslocamento até o hospital e medicamentos, em torno de R$500,00 (quinhentos reais), os quais alega serem presumíveis, sendo prescindível sua demonstração.

Conforme acima exposto, restou comprovada a responsabilidade da requerida pelos danos causados ao autor.

Entretanto, os danos materiais devem ser efetivamente comprovados.

A propósito, cito:

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DANO MORAL. (...). DANO MATERIAL . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PRIMEIRO RECURSO PROVIDO. SEGUNDO RECURSO IMPROVIDO. – (...) - Incumbe ao autor demonstrar a efetiva ocorrência de danos materiais para fazer jus à indenização (art. 333, I do CPC); - Primeiro recurso provido; - Segundo apelo improvido. (TJMG, rel. Des. Amorim Siqueira, julg. 04/06/2013).

 

Nesse norte de ideias, entendo que não procede o pedido de indenização por gastos com deslocamento até o hospital ou com medicamentos, na medida em que não há demonstração nos autos dos gastos daí decorrentes.

Assim, improcede o pleito do autor no que se refere à indenização por danos materiais.

Sem mais delongas, a parcial procedência dos pedidos é medida que se impõe.

3. Dispositivo

Ante ao exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, para condenar a requerida - Companhia Brasileira de Distribuição (Extra Hipermercado) - a indenizar a parte autora – Pedro Augusto Morais Reis, representado pelo seu genitor – pelos danos morais, no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde a data da citação e correção monetária pelos índices da corregedoria de Justiça, desde a data de publicação desta sentença, nos termos da fundamentação supra.

Fixo honorários advocatícios de sucumbência em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.

Havendo sucumbência recíproca, considero proporcionalmente distribuídos entre as partes litigantes as custas/despesas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para a parte autora e 50% (cinquenta por cento).

Suspendo, contudo, a exigibilidade de referidas verbas com relação ao autor, eis que litiga sob o palio da justiça gratuita.

P. R. I.

 

Belo Horizonte, 25 de abril de 2016.

 

Cláudia Aparecida Coimbra Alves

Juíza de Direito